Título: Em marcha lenta
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Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2007, Notas e Informações, p. A3
Nada parece irritar mais a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, do que críticas ao atraso na execução do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado com estardalhaço há mais de três meses para marcar o segundo mandato de Lula e do qual ela é coordenadora. Para rebatê-las, a ministra costuma mostrar dados porcentuais sobre o andamento dos projetos do PAC, e promete apresentar nos próximos dias um balanço ainda mais completo. Apenas admite que, como ocorre em todo grande programa de governo, também neste possa haver problemas pontuais. Números do próprio governo, no entanto, justificam as críticas.
Para os que anseiam pela retomada das obras de infra-estrutura, indispensáveis para a aceleração do crescimento prometida pelo governo, são frustrantes os dados divulgados pelo Tesouro Nacional a respeito dos investimentos do governo central. Principal mecanismo para assegurar a concretização da parte que cabe ao governo federal dos elevados investimentos previstos no PAC - e que totalizam R$ 503 bilhões no segundo mandato de Lula -, o Projeto Piloto de Investimentos (PPI) só teve executados, nos três primeiros meses do ano, R$ 504,9 milhões, ou apenas 4,5% da meta de R$ 11,3 bilhões fixada para todo o ano.
O governo Lula discutiu intensamente com o Fundo Monetário Internacional (FMI) a exclusão do PPI do cálculo do superávit primário, que indica a capacidade do setor público de pagar sua dívida. O argumento principal do governo, acolhido pelo FMI, foi o de que o PPI incluiria obras de infra-estrutura com grande potencial para estimular o crescimento e, assim, gerar mais renda para o governo. Além disso, os investimentos previstos no PPI não estão sujeitos a cortes pela área econômica do governo, como estão os demais investimentos.
Não é impossível que, daqui para a frente, superados alguns dos problemas políticos e administrativos que vem enfrentando, o governo consiga acelerar a execução do PPI e aplique, até o fim do ano, o valor previsto. Seria bom para o País que o conseguisse. Mas o retrospecto não é dos melhores. Em 2005, do total de recursos previstos para o PPI, no limite de 0,2% do PIB, nem tudo foi executado. No ano passado, a aplicação nesse tipo de projeto foi limitada a 0,15% do PIB. Para 2007, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou o aumento dos recursos para o PPI de 0,2% do PIB, conforme foi estabelecido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), para 0,5%. Em valor, isso significa um aumento de R$ 4,6 bilhões para R$ 11,3 bilhões.
Para integrar o PPI, uma obra ou projeto precisa passar por um grupo de representantes dos Ministérios da Fazenda e do Planejamento e da Casa Civil. Nos dois anos anteriores, o atraso em alguns projetos se deveu à sua lenta tramitação nesse grupo. Agora, procurou justificar o secretário do Tesouro Nacional, Tarcísio Godoy, há outro problema que retarda o programa: a necessidade de aprovação, pelo Congresso, de uma emenda à LDO em vigor, elevando de 0,2% para 0,5% do PIB o limite para o PPI.
Problemas como esses fazem parte do que o secretário do Tesouro denomina ¿dificuldades intrínsecas¿ para a execução dos investimentos. Pelo balanço por ele apresentado das contas do Tesouro nos três primeiros meses deste ano, o mal se disseminou pelo governo. Ministérios essenciais para fazer andar o PAC (fora do PPI) apresentam, em 2007, desempenho pior do que em 2006. É o caso do Ministério das Cidades, que nos três primeiros meses do ano passado conseguiu investir R$ 126,8 milhões, valor que caiu para R$ 112,4 milhões neste ano. Também caíram, na comparação do primeiro trimestre de 2006 com o de 2007, os investimentos dos Ministérios dos Transportes (de R$ 702 milhões para R$ 570,8 milhões) e da Integração Nacional (de R$ 185,5 milhões para R$ 131,7 milhões).
Se confirmada a afirmação do secretário do Tesouro ao Estado, de que ¿não há contenção de recursos, que são liberados tempestivamente¿, o problema é outro. Ou o governo não tem projetos suficientes, o que confirmaria a inconsistência do PAC apontada pelos críticos, ou não os administra com a eficácia necessária, o que revelaria má gestão.
O governo diz que este será o ¿ano do PAC¿. Mas, criado para acelerar o crescimento, ele avança em marcha lenta.