Título: Congelamento de preços na Argentina está ameaçado
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/04/2007, Economia, p. B5

¿O congelamento de preços, tal como todo produto congelado, tem data de vencimento.¿ A piada circulou em Buenos Aires nas últimas semanas em alusão às rachaduras que o casco da política de congelamento de preços do governo do presidente Néstor Kirchner começa a mostrar. O congelamento - aplicado há um ano e meio para conter a escalada inflacionária - começa a ir a pique, enquanto o governo tenta dissimular a inflação de todas as formas. Em janeiro o governo anunciou que a inflação de 2006 havia sido de 9,8%. No entanto, diversos economistas indicam que a inflação real foi de pelo menos 15%.

No primeiro trimestre deste ano, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec), sob intervenção governamental desde dezembro, a inflação acumulada foi de 2,2%. Na semana passada, a sempre sorridente ministra da Economia, Felisa Miceli, afirmou que a inflação de 2007 será de apenas um dígito. ¿As metas do orçamento nacional implicam uma inflação entre 7% e 11%¿, disse Miceli.

Mas, segundo uma pesquisa realizada com presidentes de cem grandes empresas pela Sociedade de Estudos Trabalhistas, a expectativa de inflação deste ano é de 13,6%. Economistas afirmam que a inflação chegará a 20%.

Os sindicatos, no mês passado, pressionaram governo e empresários para conseguir aumentos salariais em média de 16% para este ano. Essa é uma proporção superior à meta de inflação para o período, que seria de pouco mais de 9%. Mas, o próprio Kirchner, após aceitar os aumentos salariais, explicou essas contradições como ¿tensões do crescimento¿.

Os empresários que concordaram com os reajustes salariais dizem que terão de repassar o aumento para os preços. Diversos setores da economia, como carne, laticínios e verduras, começam a dar sinais de desabastecimento. O governo afirma que não é desabastecimento, mas sim, uma ¿falta de produtos¿ circunstancial.

O Mercado de Liniers concentrava 17% da carne que era comercializada em toda a Argentina até 2005. Atualmente, o mercado é responsável por 9% da comercialização. O resto, afirmam especialistas, está no pasto ou sendo vendido no mercado negro com ágio.

Entre 2002 e 2005 o setor pecuarista aumentou a produção em 28%, acompanhando o aumento do consumo e das exportações. Mas, desde o ano passado, com a limitação drástica das exportações (para redirecionar as vendas ao mercado interno) e o congelamento de preços, o investimento caiu 30%.

O governo ameaça aplicar a Lei de Abastecimento, que permite que o governo coloque atrás das grades empresários que não atendam à demanda dos consumidores com seus produtos. Até o momento, o secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, só autorizou aos empresários aumentos médios de 2% nos preços.

O economista Aldo Abram indicou que ¿controlar a inflação com congelamento é impossível. Isso implica um uso ineficaz de recursos, já que uma secretaria inteira (a de Comércio Interior) está destinada a perseguir empresas e monitorar preços nas gôndolas¿. Outro economista, Pablo Rojo, sustenta que o governo ¿esconde a poeira sob o tapete. Nos últimos meses todos os preços dispararam¿.