Título: Cresce suspeita de blefe do Irã
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Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2007, Internacional, p. A13

O anúncio do Irã de que obteve capacidade para fabricar combustível nuclear em escala industrial pode não passar de um blefe. Há suspeitas de que Teerã tenha decidido exagerar sua capacidade técnica para ter um poder de barganha no caso de chegar a um acordo com a ONU sobre o enriquecimento de urânio, aceitando uma redução de meios tecnológicos que ainda não possui.

A Rússia declarou ontem não ter indicações de que os iranianos obtiveram um avanço tão significativo em seu programa de enriquecimento de urânio, posição seguida por especialistas de outros países que vêem o anúncio do presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, como um golpe de relações públicas em meio à queda-de-braço diplomática com o Ocidente.

¿Não temos conhecimento de nenhum grande avanço tecnológico recente no programa iraniano que possa mudar a natureza do trabalho de enriquecimento conduzido no país¿, indicou um comunicado da chancelaria russa. A Rússia está construindo, em parceria com o Irã, uma central de energia nuclear na cidade iraniana de Bushehr.

Dois inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), que podem fornecer a primeira confirmação independente sobre o anunciado progresso iraniano, chegaram ontem a Natanz para examinar o centro de enriquecimento de urânio que o Irã disse ter ampliado sua capacidade nuclear.

Ahmadinejad declarou na segunda-feira que o Irã já tinha condições de produzir urânio enriquecido em larga escala, ressaltando que seu programa nuclear tem fins pacíficos.

A comunidade internacional teme que Teerã busque desenvolver armas atômicas e o Conselho de Segurança da ONU já aprovou três resoluções exigindo a suspensão do programa de enriquecimento de urânio. O anúncio de Ahmadinejad foi feito dias após a libertação de 15 marinheiros britânicos cuja captura, no Golfo Pérsico, havia atraído críticas de vários países.

Ainda ontem, o diretor do Organismo Iraniano de Energia Atômica, Gholam Reza Aghazadeh, afirmou que seu país tem tudo planejado para instalar em Natanz 50 mil centrífugas - um número citado anteriormente pelo governo iraniano como sua principal meta.

Num relatório divulgado em 11 de fevereiro, o Irã indicou que havia instalado duas cascatas (séries) de 164 centrífugas cada e preparava a instalação de outras duas. No entanto, diplomatas ligados à AIEA disseram que aparentemente o Irã teve problemas técnicos para expandir sua rede de centrífugas e seu programa está num estágio muito menos avançado do que o anunciado. Um diplomata em Viena disse não acreditar que o Irã tenha instalado as 3 mil centrífugas. ¿Se observarmos a velocidade com que eles têm feito as coisas e usar a matemática, não chegamos a 3 mil¿, afirmou.

Especialistas disseram que se o Irã realmente instalou as 3 mil centrífugas teria combustível nuclear suficiente para fabricar uma bomba num período de um a três anos, mas, para isso, as centrífugas deveriam estar trabalhando ininterruptamente, algo que eles questionam já que o projeto está em fase experimental.

POSSÍVEIS PROBLEMAS

Técnicos da agência nuclear da ONU apontaram falhas no programa iraniano que colocam em dúvida a capacidade atual anunciada por Teerã

Defeitos: As centrífugas precisam girar suavemente, sem superaquecimento, por longo período.

No início do ano, o governo admitiu a explosão de 50 centrífugas, causada por queda no fornecimento de energia

Montagem da centrífuga: Balanço crítico durante rotação em alta velocidade. Problema pode ter sido causado por traços de suor no disco da centrífuga, deixados por técnicos iranianos que não usaram luvas de couro

Alimentação: Encontrados altos níveis de contaminação no gás hexafluoreto de urânio usado no processo, o que pode ter danificado as centrífugas.