Título: Proposta de Lupi tira R$ 4 bi do superávit
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Fonte: O Estado de São Paulo, 19/04/2007, Economia, p. B6

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, apresentou nesta semana duas propostas que o colocam em rota de colisão com a área econômica do governo. Ontem, em reunião com os membros da Comissão de Trabalho da Câmara, ele pediu ajuda dos deputados para retirar os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) da conta chamada Desvinculação de Receitas da União (DRU). A intenção é usar o dinheiro para treinar trabalhadores, mas essa medida traz como efeito colateral a redução em cerca de R$ 4 bilhões do superávit primário, a economia de recursos para pagamento da dívida.

A DRU é um mecanismo que permite ao governo modificar o uso de 20% das chamadas verbas vinculadas (aquelas que são arrecadadas com uma destinação específica). Na prática, ela tem servido para segurar o gasto público e fortalecer o superávit primário. 'O dinheiro vai para lá e não volta mais', disse Lupi aos deputados. 'Me ajudem.' A DRU deixa de vigorar no fim deste ano, mas o governo já decidiu que vai pedir a prorrogação ao Congresso, o que exigirá mudança na Constituição. A proposta deve seguir nesta semana.

'A área econômica, é óbvio, vai resistir', disse Lupi, referindo-se à retirada do FAT da DRU. 'Mas tenho certeza que a sensibilidade da área econômica ficará afetada, porque ela sabe que o recurso é importante para qualificar mão-de-obra.' O ministro quer que os programas de treinamento sejam escolhidos conforme a necessidade de cada região.

Anteontem, Lupi havia defendido a redução da carga tributária federal para os setores mais intensivos no uso da mão-de-obra. Enquanto a área econômica quer retirar apenas os tributos sobre a folha e transferi-los para o faturamento, o ministro do Trabalho defende a desoneração para todos os impostos e contribuições federais. É o tipo de proposta que costuma enfrentar resistências no Ministério da Fazenda, principalmente na Receita Federal.

Na visita à comissão, o ministro se disse disposto a discutir a reforma trabalhista, mas não apresentou nenhuma proposta. Ele contou aos deputados que sua avó costumava contar a história do prego e do martelo. Um só bate, outro só leva os golpes, mas um não tem razão de ser sem o outro. Para o ministro, essa é uma metáfora da relação entre trabalhadores e empregadores. 'O governo tem obrigação de olhar para a parte mais fraca. Quem vai defender o prego?' O grande desafio, disse ele, é encontrar formas de incluir os 50 milhões de trabalhadores hoje informais.

Ao discutir a precarização das relações de trabalho, com uso cada vez mais intensivo de trabalhadores terceirizados, o ministro fez um desabafo: 'O governo está partindo para a terceirização. Tem terceirizados no Ministério do Trabalho! Que absurdo!' Em seguida, ele afirmou que União, Estados e municípios não deveriam usar empregados terceirizados, 'para dar o exemplo'. Segundo ele, os funcionários deveriam ser selecionados por concurso público.

EMENDA 3

Lupi informou ainda que o senador Paulo Paim (PT-RS) está trabalhando em uma proposta alternativa à chamada Emenda 3. Essa emenda, que limitava a ação dos fiscais da Receita Federal e do Trabalho na autuação de empresas prestadoras de serviços criadas para supostamente 'disfarçar' o que na realidade é uma relação trabalhista, foi vetada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O governo anunciou que enviaria um projeto alternativo para tratar da questão mas, conforme informou ontem o Estado, o Executivo não vai mais enviar sua proposta. 'Não tinha consenso', disse Lupi.

No entanto, o Ministério do Trabalho segue discutindo a questão com os deputados e senadores. A prática de contratar funcionários como pessoa jurídica, explicou ele, poderá ser admitida em alguns casos. 'É o caso de advogados, de técnicos altamente especializados que ganham salários bem acima da média', exemplificou. 'O que não pode é tirar o poder da fiscalização, porque aí é manter as bases do trabalho escravo', disse. 'Não pode remeter a fiscalização para a Justiça Trabalhista, que é muito demandada. Isso é papel do Ministério do Trabalho', completou.