Título: Ocupação cenográfica
Autor: Kramer, Dora
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/04/2007, Nacional, p. A6
O ministro da Justiça, Tarso Genro, explicou e o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, já entendeu que a presença das Forças Armadas na cidade cumprirá dois objetivos muito bem definidos e restritos: marcar a presença do Estado nas ruas, de forma a inibir a criminalidade e dar ao cidadão uma sensação maior de segurança, e liberar os policiais que hoje ocupam pontos estratégicos em vias expressas e acessos à cidade para as ações de repressão propriamente ditas.
Tudo será feito em consonância e mediante a aceitação dos comandantes das três Forças, com a explicitação, por escrito, do tempo e das funções a serem exercidas pelos militares.
Na reunião de segunda-feira entre Sérgio Cabral e os ministros da Justiça e da Defesa ficou combinado que os secretários nacional e estadual de Segurança Pública montarão um plano de ação junto com o comandante da Polícia Militar do Rio que, em seguida, será enviado ao Ministério da Justiça e submetido à Defesa para que os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica dêem o de acordo.
Só depois disso começa a ação militar no Rio. O tempo e a quantidade de homens a serem enviados ainda serão decididos. O governador pediu a presença das Forças Armadas pelo período de um ano, mas esse prazo ainda será submetido a um exame de conveniência.
A idéia de usar os efetivos de Exército, Marinha e Aeronáutica para dar combate ao crime nem sequer foi cogitada na reunião de segunda-feira porque existem dois obstáculos muito nítidos. Primeiro, os militares não querem se prestar ao papel de polícia e, segundo, uma atuação mais ofensiva teria de ser precedida do reconhecimento de que o governo local perdeu as condições de controle sobre a ordem no Estado e isso o governador não quer.
Ficou, então, definido que os militares não farão investigações nem se envolverão em operações de perseguição a criminosos.
A grande ajuda, a única possível nas condições atuais, será, de acordo com Tarso Genro, o redirecionamento dos policiais para a atividade fim. As Forças Armadas terão, na expressão do ministro, 'uma postura dissuasiva' frente à bandidagem, com a presença das tropas e o uso de helicópteros da Aeronáutica e veículos específicos do Exército.
Segundo o ministro da Justiça, trata-se de um plano de emergência sem a pretensão de resolver os problemas estruturais. Estes, Tarso Genro pretende atacar apresentando, dentro de mais ou menos 45 dias, um 'portfólio de projetos' que incluem desde um plano para financiar habitações para policiais, de modo a que eles possam sair das áreas onde hoje sofrem pressão direta do crime, até convênios com os Estados para formação de 'policiais comunitários'.
O que seria exatamente isso, o ministro prefere não revelar detalhes. 'Estou com meu pessoal trabalhando', diz. Dá apenas as linhas gerais de um 'programa de segurança' cujo objetivo é reduzir os maus indicadores de segurança 'dentro de três ou quatro anos'.
'Por enquanto só posso dizer que o foco não é exclusivo na repressão policial. Há, na verdade, três focos: o etário, o territorial e o social.' Serão primordialmente projetos direcionados à juventude, com execução inicial de 'quatro ou cinco' grandes regiões metropolitanas.
Ele só adianta um desses projetos: o de presídios especiais para jovens de 18 a 24 anos que já estejam cumprindo pena. A administração dos presídios seria dos Estados, mas com manutenção federal feita por meio de convênios.
Adeus às armas
A transferência de Tarso Genro do Ministério das Relações Institucionais para a pasta da Justiça significa, para ele, também uma alteração de conduta. 'Se antes minhas funções eram 80% relacionadas ao governo e 20% a questões de Estado, essa proporção agora foi invertida, saio do embate governamental do cotidiano para ter um papel mais institucional.'
Quer se manter o mais distante possível de 'funções conflituosas'.
Traduzindo: Tarso Genro não fará, pelo menos de público, mais o papel de combatente político-partidário. As questões do PT, por exemplo, só abordará internamente no partido.
Os embates com a oposição deixa para os líderes governistas no Congresso e se abstém da defesa das posições políticas do governo. 'Isso agora é com o Mares Guia', diz, referindo-se ao seu sucessor nas Relações Institucionais.
Não abrirá mão, no entanto, da política. Mas na função de mediador e não de debatedor. Nessa condição, apresentará na reunião do conselho político do governo, dia 23 próximo, uma proposta de reforma política contendo a sugestão do fim da reeleição, junto com fidelidade partidária, voto em lista e financiamento público de campanha.
Isso não o levaria a uma posição de contendor, da qual se diz distanciado?
'Não, vou apenas encaminhar o debate. O governo não dará opinião. Até porque não quer criar contencioso, pois sabe que reforma política só sai se for por consenso com a oposição.'