Título: EUA propõem que emergentes criem teto para importação agrícola
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/04/2007, Economia, p. B11

O governo dos Estados Unidos apresentaram uma proposta agrícola na Organização Mundial do Comércio (OMC) que pode afetar o futuro das exportações agrícolas brasileiras para outros mercados emergentes. A idéia americana vem no momento em que Brasil, Estados Unidos, Europa e Índia afirmaram em carta enviada ontem ao diretor da OMC, Pascal Lamy, que querem a conclusão das negociações até o fim do ano. A carta foi ironizada por diplomatas dos demais países.

A idéia americana é que países em desenvolvimento importadores de alimentos, como Índia, China e Indonésia, estabeleçam cotas para a entrada de produtos sensíveis, como açúcar, arroz, frango e milho. Com isso, os americanos esperam garantir sua parcela de mercado e, ao mesmo tempo, impedir o crescimento das exportações do Brasil para esses locais.

Os países em desenvolvimento estão entre os que mais aumentam seu consumo de bens agrícolas brasileiros. Para o Itamaraty, não haveria nada pior que o estabelecimento de cotas por produto para o volume exportado para esses mercados.

Na OMC, todos sabem que os países em desenvolvimento precisarão proteger setores para a sobrevivência de seus agricultores. Mas, na avaliação do Brasil, o caminho não é a criação de tetos de importação. A Índia, por exemplo, quer garantir a proteção para 20% de seus produtos agrícolas, taxa inaceitável para muitos países.

IRONIAS

Enquanto os americanos faziam mais uma oferta que será pouco popular na OMC, diplomatas e funcionários de alto escalão na entidade ironizavam os resultados da reunião entre os ministros do Brasil, Estados Unidos, Europa e Índia, anteontem, em Nova Délhi.

O encontro terminou com uma declaração dos quatro governos, conhecidos como G-4, de que se empenharão em terminar a Rodada Doha da OMC até o fim do ano. O processo está suspenso desde meados de 2006 por causa da falta de acordo sobre a liberalização agrícola. O G-4 anunciou que terá mais reuniões e um encontro ministerial em maio, em Paris. Um acordo parcial teria de ser fechado em julho para que um entendimento completo fosse obtido nos últimos dias do ano.

¿O que diz de substancial essa declaração¿, questionou o presidente das negociações agrícolas na OMC, Crawford Falconer. ¿Não há novidade em nenhuma das declarações feitas.¿ Há duas semanas, o Estado já havia noticiado que o G-4 quer concluir a rodada no fim do ano, posição conhecida por vários diplomatas em Genebra.

Ontem, em uma carta enviada a Lamy, o G-4 reforçou suas intenções e anunciou com pompa que a negociação entraria em uma ¿nova fase¿. Foi mais um motivo para ironias em Genebra. ¿O G-4 concordou que haverá mais reuniões. Alguém precisa viajar até Nova Délhi para tomar essa decisão?¿, atacou um embaixador centro-americano. Até mesmo diplomatas europeus que estiveram na capital da Índia reconheceram que ¿nada de substancial foi obtido¿ nos últimos dias.

A irritação em Genebra em relação ao G-4 ocorre diante do fato de que nenhum prazo elaborado pelos principais países foi respeitado. Além disso, declarações similares foram feitas em janeiro, em Davos, quando todos se comprometeram a avançar o processo até abril. Fontes disseram ao Estado que, nas reuniões desta semana, uma das novas datas mencionadas para a conclusão de parte do processo foi o fim de julho.

Para diplomatas nas capitais européias, quem saiu vitoriosa da reunião de Nova Deli, onde esteve o chanceler Celso Amorim, foi a Casa Branca. Porque conseguiu evitar um debate mais profundo e estabelecer uma prazo para o fim de julho, quando já estará vencida a autorização do Congresso americano para que o Executivo negocie acordos comerciais.

Na avaliação de especialistas, isso evita que o Congresso americano se senta pressionado pela OMC e permite que a Casa Branca dê a impressão de que pode continuar negociando sem depender de autorização.