Título: 'É retomada, sim, mas cautelosa'
Autor: Rota, Adriana
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/05/2007, Economia, p. B12

O ex-ministro da Agricultura e atual presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roberto Rodrigues, disse ontem, em entrevista exclusiva ao Estado,que é preciso haver um 'otimismo cauteloso' em relação à recuperação do agronegócio. 'É retomada, sim, mas cautelosa, com o pé no chão. O volume de negócios está concentrado no setor canavieiro e, ainda assim, não o bastante, porque os preços do açúcar também estão despencando. Não tem ninguém fazendo loucura.'

Em visita à Agrishow Ribeirão Preto, acompanhando um grupo de alunos do campus de Jaboticabal da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o ex-ministro disse que falta resolver 'alguns problemas centrais' do agronegócio, como o estoque acumulado de dívidas.

Segundo ele, o governo federal tem trabalhado nisso. 'Instrumentos vêm sendo implementados lentamente, mas a questão não está resolvida', afirmou, emendando que a questão cambial também afeta a atividade. Ele diz que outro complicador é a alta de preços dos fertilizantes, que irá onerar os custos de produção no plantio da próxima safra.

Rodrigues diz que a agricultura vive um momento de safra boa e colheita farta. 'É só alegria para a alma dos agricultores, mas o bolso não se alegra. Os custos estão crescendo e os preços, não o bastante. Estão bons em dólar, mas não remuneram os custos de produção.'

Com relação aos problemas de logística, Rodrigues aposta num avanço trazido pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal. Ele está confiante na criação de um PAC específico para o agronegócio. O assunto será debatido com o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, na próxima segunda-feira, na Fiesp.

JUROS

Indagado sobre uma taxa de juros adequada para a realidade brasileira, o ex-ministro afirma que seria 'razoável' adotar a que todo o mundo pratica: entre 3% a 5%. Rodrigues atribui às políticas de subsídios agrícolas esse diferencial competitivo dos demais países.

Rodrigues diz que o agricultor ficou com fama de 'chorão', porque as políticas de subsídios criadas no passado, para contrabalançar a transferência de renda do campo para a cidade, beneficiaram uma minoria, e que a sociedade, a academia e a mídia reproduziram essa imagem para todo o conjunto de agricultores. 'O governo deu uma resposta positiva nos anos 60 e 70, mas parcialmente. Os não atendidos continuaram chorando. A sociedade ficou insegura com relação a esse fato. Afinal, o governo fez ou não? Fez, mas de modo insuficiente.'

De acordo com o ex-ministro, a imagem começou a mudar recentemente, mas o agronegócio ainda não é visto pela maioria como um setor progressista e competitivo, apesar de gerar um terço dos empregos do País e um terço do PIB (Produto Interno Bruto) nacional.

Rodrigues diz, ainda, que falta ligação entre a representação política e a econômica, embora essa questão também esteja evoluindo. 'Temos parlamentares fortemente ligados à agricultura. Questões como seguro rural e biotecnologia só evoluíram na minha gestão porque houve apoio do parlamento.'

Em relação à sobrevivência da agricultura familiar, o ex-ministro explicou que, diante da globalização da economia, que favorece o aumento da produtividade, eleva a oferta e reduz os preços das commodities, os agricultores que não conseguem obter bons rendimentos acabam por ser excluídos da atividade, sejam grandes ou pequenos. Como as margens de lucro são cada vez menores, Rodrigues considera importante que pequenos e médios produtores se unam em cooperativas para aumentar o ganho de escala e fazer frente a um cenário de maior competitividade.

'Existe uma perversidade: toda vez que o uso da tecnologia aumenta, os preços caem e há exclusão. Isso não tem nada a ver com o tamanho do produtor. Na globalização, é muito mais visível porque contamina cenários de diversos países. Os ricos, por causa da visão da sociedade, criam mecanismos para não serem excluídos. É o que falta aqui', disse.

Na opinião de Rodrigues, 'é preciso ter políticas diferentes para produtos diferentes e status diferentes'. 'Os preços agrícolas estão caindo no mundo inteiro', alertou.