Título: Medina pede afastamento do STJ
Autor: Fonseca, Roberto e Filgueiras, Sônia
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/05/2007, Metrópole, p. C1

Acusado de integrar um esquema de venda de sentenças, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Medina pediu ontem abertura de sindicância para apurar denúncias contra ele e seu afastamento durante a investigação. Ele já estava de licença médica até o dia 18. Integrantes do tribunal disseram que o afastamento é uma tática para se antecipar à apuração interna, que deveria ser aberta pelo STJ esta semana, e evitar a perda do foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF). O STJ definirá hoje se aceita o pedido do ministro.

Apesar de Medina ter tempo de serviço suficiente para se aposentar com o salário bruto atual de R$ 23,2 mil - é juiz desde 1968 -, um colega de tribunal afirmou que essa opção o deixaria sem foro privilegiado e com risco de ter sua prisão pedida novamente pela Justiça. O procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, chegou a pedir a prisão, negada pelo relator do caso no Supremo, Cezar Peluso.

Por ser ministro do STJ, Medina será julgado no Supremo. Caso deixasse permanentemente a função, o caso poderia ser transferido para o próprio STJ, pois também há desembargadores acusados, ou para a primeira instância da Justiça Federal.

O pedido da sindicância e do afastamento foi entregue ao presidente do STJ, Raphael Monteiro de Barros Filho, pelo advogado de Medina, Antônio Carlos de Castro. No documento, o ministro alega que não tem o que temer, e diz que não pôde entregar o requerimento pessoalmente por estar acamado. Castro negou que a ação seja uma tática para manter foro privilegiado.

¿Foi uma decisão pessoal. Em nenhum momento a aposentadoria foi cogitada, por respeito ao Supremo. Após o oferecimento da denúncia, a aposentadoria não estava na regra do jogo. Pareceria uma tentativa de fuga do julgamento¿, afirmou o advogado. ¿Mas, como a cada dia surgem fatos novos, que não estão na denúncia e, fora do contexto da investigação, não teriam relevância, o ministro decidiu pelo afastamento, para não constranger o tribunal.¿

Antes da iniciativa de Medina, o STJ aguardava o envio das acusações recebidas pelo Supremo - que analisa a denúncia feita pelo Ministério Público com base na Operação Hurricane, realizada pela Polícia Federal no dia 13 - para abrir inquérito administrativo. No STJ, a punição máxima prevista é a aposentadoria compulsória.

Monteiro de Barros convocou para 17h30 de hoje a sessão secreta na qual 31 ministros definirão o futuro de Medina. Entre as possibilidades estão a abertura de inquérito administrativo (fase em que se analisariam os indícios contra o ministro) ou do processo administrativo em si, já com o afastamento de Medina. Integrantes do tribunal avaliam que os dois procedimentos podem ser adotados, já que o Supremo ainda não enviou as acusações contra o ministro.

Medina é um dos 28 denunciados com base na Hurricane, que investiga a negociação de decisões judiciais em benefício de donos de caça-níqueis. O irmão do ministro, o advogado Virgílio Medina, foi preso no dia 13, acusado de ter pedido R$ 600 mil em troca de uma liminar de Paulo liberando máquinas apreendidas.

Além das acusações envolvendo caça-níqueis, escutas em telefones do ministro feitas pela PF levantaram outras suspeitas sobre a sua conduta. Em uma delas, Medina determina a uma assessora que mude seu voto no julgamento de habeas-corpus da mulher do contrabandista Law Kim Chong, Miriam. Medina havia se posicionado duas vezes contra a concessão do benefício. O habeas-corpus foi dado pela 6ª Turma do STJ e confirmado pelo colegiado de ministros.

Medina também antecipou a um colega seu voto em processo do qual era relator. Em dezembro, o advogado Paulo Eduardo Mello, presidente do Conselho Deliberativo do Minas Tênis Clube, ligou para Medina para saber do processo em que um diretor da entidade era acusado de usar documento policial falso. O ministro adianta seu entendimento favorável ao acusado. No final, disse a Mello: ¿Você manda!¿

PERFIL

Paulo Geraldo de Oliveira Medina Nascido em 13/07/1942, em Rochedo de Minas (MG) Bacharel em Direito (Universidade Federal de Juiz de Fora - 1965)

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL

Vereador (Rochedo de Minas 1961-1965) Advogado (1966-1968) Juiz da Comarca de Ervália - MG (1968) Juiz da Comarca de Belo Horizonte (1978) Juiz do Tribunal de Alçada (1985) Desembargador do Tribunal de Justiça (1991) Membro do Conselho Superior de Magistratura (1992) Membro da Corte Superior (1995) Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (1995-1997) Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Corregedor-geral de Justiça de Minas Ministro do Superior Tribunal de Justiça (desde 26/06/2001)

AS SUSPEITAS

O irmão de Paulo Medina, o advogado Virgílio Medina, foi flagrado em escuta da Operação Hurricane negociando propina de R$ 600 mil para o ministro conceder liminar favorável a empresários ligados à exploração de caça-níqueis. O ministro mandou liberar 900 máquinas apreendidas em Niterói

Investigação da PF mostra que o ministro recebeu empréstimo de R$ 440 mil do irmão. Segundo a PF, Virgílio não tinha saldo suficiente para fazer o empréstimo

O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, denunciou Paulo Medina pela prática dos crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e prevaricação. Também requereu ao Supremo Tribunal Federal a prisão dele, mas o pedido foi negado

Diálogos gravados pela PF mostram que Medina ligou para seu gabinete e orientou uma funcionária a alterar o voto contra a libertação de Miriam Law, mulher de Law King Chong, apontado como maior contrabandista do País

Antecipou seu voto ao amigo de um réu no processo do qual era relator, em dezembro. Grampo da PF revela que o ministro conversou por telefone com Paulo Eduardo de Mello, presidente do conselho do Minas Tênis Clube, e prometeu favorecer Fernando Ferreira, diretor do clube, detido por apresentação de documento falso.