Título: Mais um retrato do ensino
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Fonte: O Estado de São Paulo, 29/04/2007, Notas e Informações, p. A3

Um dia após o presidente Lula ter anunciado que os planos de seu governo para o setor educacional colocarão o Brasil ¿em pé de igualdade com qualquer país do mundo desenvolvido¿, o Ministério da Educação (MEC) divulgou seu mais novo indicador. Trata-se do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que foi concebido como um ¿indutor de qualidade¿. Os municípios que forem subindo no ranking desse índice, definindo metas e adotando as ações e recomendações propostas pelos especialistas do MEC, receberão apoio técnico e recursos extras por parte da União. O governo dispõe de R$ 1 bilhão para destinar aos mil municípios com rede escolar de pior qualidade no País.

Os números apresentados pelo Ideb são assustadores e mostram a distância existente entre a retórica autolaudatória do chefe do governo e a sombria realidade do sistema educacional brasileiro. Segundo o indicador, dos 5,5 mil municípios brasileiros, em apenas 10 os alunos da rede municipal de 1ª à 4ª série do ensino fundamental conseguiram atingir ou superar a nota 6, numa escala de 0 a 10.

A nota 6 equivale ao padrão médio de aprendizagem dos países desenvolvidos avaliados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 73% dos municípios brasileiros, os estudantes dessas quatro séries ficaram com nota média inferior a 5, o que revela o quanto o nível de escolaridade média dos nossos estudantes está distante do nível médio dos alunos dos países desenvolvidos. A meta do MEC é que os alunos das escolas públicas e privadas consigam obter a média geral 6 somente em 2021, o que dá a medida da falta de qualidade do sistema educacional.

O novo indicador do MEC é calculado basicamente a partir da Prova Brasil, um teste de português e de matemática aplicado em escolas públicas de 4ª e 8ª séries. Ele também incorpora as notas obtidas pelos estudantes no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que foi criado em 1988 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e, desde 1990, é aplicado a cada dois anos a alunos de escolas públicas e privadas, permitindo às autoridades educacionais identificar problemas pedagógicos, definir prioridades de investimentos e distribuir recursos humanos e técnicos para o setor. Em 2005, participaram dessa avaliação mais de 190 mil alunos matriculados em quase 6 mil escolas das 27 unidades da Federação.

Segundo os primeiros números do Ideb, que o MEC acaba de divulgar, em nenhum Estado os estudantes de todas as séries do ensino básico da rede pública conseguiram atingir a nota 5. Essa nota equivale ao desempenho médio que os alunos obtiveram no Saeb, em 1997. Isso significa uma queda no rendimento escolar dos alunos da rede pública, nos últimos dez anos. Em outras palavras, ao longo desse período o País conseguiu universalizar o acesso às escolas da rede pública. Foi um avanço em termos quantitativos, não há dúvida. O desastre está no plano qualitativo. Mais de metade - 55% - das crianças da 4ª série, apesar de aprenderem a decifrar letras, infelizmente continua sem entender o que lê, não sabe escrever textos simples e tem dificuldades para realizar as quatro operações aritméticas - isso quando não deixa a escola sem completar o curso.

Nas três séries do ensino médio, em 16 unidades da Federação, a nota média dos alunos ficou abaixo de 3. Em Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, os Estados cujos estudantes tiveram o melhor desempenho, a nota média foi de apenas 3,5. Entre as turmas do ensino fundamental, somente Santa Catarina conseguiu superar a nota 4, alcançando a média de 4,1. Entre os alunos de 1ª à 4ª série do ensino fundamental, o melhor rendimento foi registrado em São Paulo, com a nota média de 4,5.

Graças ao complexo sistema de avaliação escolar que foi implantado a partir da década de 90, o País finalmente dispõe de um diagnóstico realista do sistema educacional. Concebido para estimular os municípios a enfrentar o desafio da revolução qualitativa, no campo do ensino básico, o Ideb é uma peça importante desse sistema. Evidentemente, nada mudará da noite para o dia. Mas o horizonte da mudança está traçado e é isso o que importa.