Título: Múltis latinas avançam nos EUA
Autor: Krauss, Clifford
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/05/2007, Negócios, p. B16

Primeiro veio uma onda de imigrantes do México e de outros lugares da América Latina. Depois vieram as tortillas e as novelas de língua espanhola, feitas nos Estados Unidos para uma crescente audiência hispânica no país.

Hoje, uma panificadora mexicana chamada Grupo Bimbo distribui bolinhos, pão Wonder Bread e massa de pizza pronta em grande parte dos EUA.

Executivos mexicanos vendendo pizza italiana em lugares como Kansas City, Missouri; uma siderúrgica brasileira comprando usinas em dificuldades no Meio-Oeste; um fabricante de cimento peruano se instalando no Arizona: tudo isso é parte de uma crescente e inesperada onda de investimentos nos EUA por parte de um audacioso grupo de companhias latino-americanas bem-sucedidas, que de repente se tornaram multinacionais.

As novas 'multilatinas', empresas agressivas e engenhosas, são um subproduto da liberalização de mercado que varreu as economias latino-americanas nos anos 90. Mas sua presença crescente nos EUA e no restante do mundo - em banho-maria havia anos - começa a chamar a atenção.

Essas multinacionais latino-americanas alcançam lugares distantes como Wilton, pequena cidade rural do Estado de Iowa que parece ter saído de um quadro de Norman Rockwell, onde a lanchonete decorada com néon oferece uma bebida adocicada chamada Pink Lady e os amigos se reúnem para jantares caseiros na Loja Maçônica. A onda já foi muito além das cidades com forte presença latina, como Miami e Los Angeles. As companhias latino-americanas produzem, vendem e fornecem comunicações via satélite, softwares gráficos, doces, telhas e até armas de fogo.

A companhia brasileira Embraer, que fabrica jatos para passageiros, faz manutenção de aviões em Nashville. A peruana ARPL Tecnologia Industrial começou recentemente a construir uma fábrica de cimento de US$ 140 milhões no Arizona.

Para os executivos latino-americanos, a entrada nos EUA é uma extensão natural de sua busca por mercados.

'Quando a América Latina diminuiu suas próprias barreiras ao comércio e ao investimento, suas empresas começaram a ver o mundo de um jeito bem diferente', disse Robert Pastor, vice-presidente de assuntos internacionais da Universidade Americana, em Washington, e ex-conselheiro para América Latina do presidente Jimmy Carter. 'Agora a América Latina não é apenas um destino, mas também uma origem de capital e investimento.' Em Wilton, a siderúrgica brasileira Gerdau Ameristeel transformou-se num dos dois maiores empregadores da cidade, importando um novo estilo de administração e capital para modernizar e expandir uma velha usina e apaziguar um inflexível sindicato americano.

Desde sua chegada aos EUA, em 1999, a Gerdau adquiriu rapidamente 17 usinas em 11 Estados, tornando-se a quarta maior produtora de aço do país.

De modo similar, nos últimos anos, a companhia mexicana Cemex surgiu como a maior fornecedora de cimento e concreto pré-misturado nos EUA, com quase 10 mil empregados em todo o país.

A companhia petrolífera brasileira Petrobrás tornou-se um dos atores mais importantes na exploração em águas profundas no Golfo do México, usando técnicas desenvolvidas em suas próprias águas oceânicas.

'É uma tendência em claro crescimento. Prevemos sua multiplicação ano após ano', disse Jerry Haar, professor de economia da Universidade Internacional da Flórida especializado nas multilatinas. 'Essas companhias precisam se expandir para novos mercados porque atingiram a saturação de mercado em casa, assim como a Wal-Mart fez aqui.' Não há estimativas oficiais de quantos americanos trabalham para companhias latinas nos EUA, mas especialistas falam em 100 mil entre as 5 milhões de pessoas empregadas em firmas estrangeiras no país.