Título: Carlos Wilson avisa que não será bode expiatório nem homem-bomba em CPI
Autor: Domingos, João e Lopes, Eugênia
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2007, Nacional, p. A4

Dona de 16 dos 24 votos na CPI do Apagão Aéreo, a base do governo decidiu limitar a investigação às causas do choque entre o Boeing da Gol e um jato Legacy, em setembro, e às origens da crise no tráfego aéreo. Os governistas aceitam investigar a Infraero - inclusive no governo Fernando Henrique (1995-2002) -, mas só quando houver relação com o caos aéreo.

Suspeitas de superfaturamento na estatal que cuida da infra-estrutura dos aeroportos, se levantadas pela oposição, só deverão ser investigadas caso tenham conexão com a crise aérea. O presidente da CPI, deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), chegou a dar exemplos do que deve e do que não deve ser apurado. ¿Se houve superfaturamento numa obra e ela tiver relação com a crise, devemos ir adiante. Se for um banheiro superfaturado, isso não é da conta da CPI¿, raciocinou.

O deputado Carlos Wilson (PT-PE), que dirigiu a Infraero entre 2003 e 2006, acredita que logo será chamado a depor e disse ontem ao Estado que rejeita tanto o papel de bode expiatório quanto o de ¿homem-bomba¿, capaz de fazer revelações que atingiriam o Planalto. ¿Não serei um novo Roberto Jefferson¿, afirmou, referindo-se ao pivô do escândalo do mensalão.

A eleição de Marcelo Castro ontem, na instalação da CPI, expressou o domínio governista. Placar: 16 votos a 8. O petista Marco Maia (RS), fiel ao Planalto, foi escolhido relator - para marcar posição, os oposicionistas apresentaram a candidatura de Vanderlei Macris (PSDB-SP), que teve 8 votos.

Preocupados em provar que a CPI não será chapa-branca, tanto Marcelo Castro quanto Marco Maia afirmaram que serão isentos e imparciais. Como sabem que as oposições pedirão investigaçoes sobre Ministério da Defesa, Agência Nacional de Aviação Civil, Cindacta e companhias aéreas, Maia já se adiantou. Disse que descobrir se eles têm algo a ver com a crise aérea é fundamental.

Em outro ponto, o relator Maia adotou estratégia que coincide com a do PT. Ele admite convocar ex-dirigentes da Infraero para depor, ¿inclusive dos governos passados¿ - uma forma que os governistas encontraram para diluir responsabilidades do atual governo.

O deputado Carlos Wilson é sempre lembrado para a lista de depoentes. ¿Ninguém está acima da lei¿, avaliou o presidente da CPI, Marcelo Castro, sobre a possibilidade.

O próprio Wilson já expressou sua vontade de falar à CPI, até em encontro com o ministro das Relações Institucionais, Walfrido Mares Guia. Na conversa, o deputado repetiu de forma franca o que já vinha afirmando a interlocutores no Congresso: não pretende atingir o governo, mas faz questão de ser ouvido na investigação. E dividiu com o ministro a preocupação de se tornar uma espécie de ¿bode expiatório¿ do PT. O raciocínio da oposição é que o partido pode querer ¿entregá-lo¿ para abreviar a apuração, enfocando sua gestão na Infraero.

A trajetória de Wilson poderia estimular a estratégia. Ele começou a carreira política nos anos 70, na Arena, que apoiava o regime militar. Passou depois por PMDB, PSDB e PTB. Só se aproximou do PT em 2000, quando disputou a prefeitura de Recife pelo PTB e, no segundo turno, apoiou o petista João Paulo. Derrotado na eleição de 2002 ao Senado, Wilson mudou-se para o PT e ganhou do governo Lula o comando da Infraero.

¿Não vou aceitar isso de ser entregue. Não sou mercadoria barata¿, reage o deputado. Alguns petistas também não vêem ganhos nessa opção, uma vez que exporia apenas o próprio governo Lula.

De qualquer forma, o PT tem vigiado Wilson e a oposição o corteja. O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) já teve uma longa conversa com o deputado e saiu convencido de que o mais importante é criar condições para que Wilson revele tudo o que sabe sobre a crise aérea. ¿Vamos propor uma espécie de delação premiada, em que ele não será o principal alvo da apuração¿, disse Maia a um amigo.

Durante esse encontro, Wilson relatou uma audiência que tivera com o presidente Lula, na qual fez questão de lembrar que foi o próprio presidente quem indicou o diretor de Operações na sua gestão. Trata-se do brigadeiro José Carlos Pereira, atual presidente da Infraero, que ao trocar de cargo nomeou para seu lugar Rogério Amado Barzellay, apadrinhado do PMDB que veio do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit).

Wilson também lembrou a Lula que o PT indicou ocupantes de outros postos-chave.

O deputado agora diz que não será usado para atacar o governo. ¿Não sou homem-bomba, não serei um novo Roberto Jefferson¿, avisou. Mas ele também não quer ser o único investigado. ¿Não é justo que caia tudo em cima de mim¿, afirma Wilson, que tem 57 anos e atualmente enfrenta um delicado tratamento de saúde.

¿Se a CPI não interessa a alguém, a mim interessa¿, costuma dizer o deputado a parlamentares amigos. ¿Estarei pronto para colaborar. Não vou me defender, mas mostrar o trabalho sério que fiz na Infraero.¿

O senador José Agripino (DEM-RN) acha que seria um tiro no pé a oposição centrar a CPI em Wilson e na Infraero. ¿A sociedade não nos perdoará se passarmos a imagem de quem quer tirar dividendo político.¿

FRASES

Carlos Wilson Deputado (PT-PE)

¿Não sou homem-bomba. Não serei um novo Roberto Jefferson¿

¿Estarei pronto para colaborar. Não vou me defender, mas mostrar o trabalho sério que fiz na Infraero. Não vou aceitar isso de ser entregue¿

Rodrigo Maia Deputado (DEM-RJ)

¿Vamos propor uma espécie de delação premiada, em que Wilson não será o principal alvo¿.