Título: Enxurrada de dólares invade País e desafia BC
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/05/2007, Economia, p. B1

O risco Brasil praticamente desapareceu em alguns tipos de operações que exploram a diferença entres os juros nacionais e os internacionais. Diante dessa situação, é muito difícil para o Banco Central (BC) se contrapor à enxurrada de dólares que está entrando no Brasil e pressionando para baixo a taxa de câmbio.

'Quanto mais baixo o risco, maior tem que ser a intervenção do governo para evitar que o câmbio se valorize; como ninguém mais tem medo de levar calote, a oferta para esse tipo de aposta (nos juros brasileiros) é muito grande', diz Armínio Fraga, ex-presidente do BC, hoje à frente da Gávea Investimentos.

Fraga nota que o prêmio de risco para aplicações de um ano no Brasil, medido pelos swaps de default, está em apenas 0,20 ponto porcentual. 'Não há registro histórico de um risco tão baixo', ele observa.

Na quinta e sexta-feira, o BC comprou cerca de US$ 4,7 bilhões em leilões à vista e em operações de swaps cambiais reversos. O ritmo médio de compras que levou a China a acumular mais de US$ 1 trilhão de reservas é de aproximadamente US$ 1 bilhão por dia.

Do início do ano até quarta-feira, dia 2 de maio, as reservas internacionais brasileiras subiram US$ 36,5 bilhões, basicamente pelas compras no mercado à vista. Isso é mais que o aumento de reservas durante todo o ano de 2006, de US$ 32 bilhões. Apesar das maciças compras de dólar em 2007, o real valorizou-se no ano de R$ 2,14 para R$ 2,035 por dólar.

'É um ataque especulativo doce', diz Beny Parnes, diretor-executivo do banco BBM e ex-diretor da área externa do BC. Há consenso de que a pressão de alta do real não deriva só do juro, mas, sobretudo, dos fundamentos econômicos: uma combinação excepcionalmente benigna da grande valorização das matérias-primas e insumos que o Brasil exporta com um ambiente internacional de imensa liquidez. 'O BC está tentando suavizar a trajetória do câmbio, mas, na atual conjuntura, isso é uma tarefa muito, muito difícil', resume Parnes.

SELIC

Alguns economistas, como Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, e Ilan Goldfajn, sócio da Ciano Investimentos e ex-diretor de Política Econômica do BC, acham que o BC pode acelerar o ritmo de queda da Selic, a taxa básica de juros, diante do suporte antiinflacionário derivado da força do real. Uma queda mais rápida da Selic, por outro lado, poderia fechar mais rapidamente o diferencial de juros que joga lenha na fogueira da valorização cambial.

Não há, porém, a convicção generalizada de que o ritmo mais intenso de queda dos juros conterá a valorização cambial. Para Octavio de Barros, diretor do Bradesco, 'o que está atraindo investidores é justamente o fato de os juros estarem em queda, abrindo perspectivas inéditas para os negócios empresariais em todos os setores'.

Na visão dele, a economia brasileira está migrando do viés rentista (já que os juros caem ininterruptamente desde setembro de 2005) para um foco cada vez maior nos negócios e empreendimentos. Assim, uma economia cada vez mais saudável pode aumentar ainda mais a atração de capitais e a valorização do real.

A recomendação de quase todos os economistas ouvidos pelo Estado - que passa longe da agenda atual do governo - é cortar tarifas de importação e reduzir os gastos públicos.