Título: Marina substitui Meirelles no papel de vilã do baixo crescimento
Autor: Scinocca, Ana Paula
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/2007, Nacional, p. A6
Com menos de seis meses após a nova posse, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já tem como marca deste segundo mandato o fato de a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, ter virado uma espécie de Henrique Meirelles. Explica-se: as reclamações contra os juros e a equipe do presidente do Banco Central, apontados no primeiro mandato como supostos entraves ao 'espetáculo do crescimento', foram substituídas pela queixa contra a ministra Marina, a equipe do Meio Ambiente e as licenças ambientais. No balanço da semana que passou, coube a eles o papel de vilões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Especialistas e políticos ouvidos pelo Estado - inclusive os da base aliada - temem que o governo na verdade enfrente problemas de gestão, mas prefira vender a idéia de que não se importa em fazer obras rifando o respeito ao ambiente.
O ex-ministro do Meio Ambiente e hoje deputado José Sarney Filho (PV-AM) vê um ponto em comum entre a associação das licenças ambientais com a lentidão em obras do PAC, de um lado, e a velha reclamação contra as altas taxas de juros, de outro. Na avaliação dele, fica patente a vontade do governo de 'ganhar o jogo no grito'.
Para o sócio-diretor da RC Consultores, o economista Paulo Rabello de Castro, apontar um culpado pelo que não acontece é saída enganosa. 'Antes de ser a questão do meio ambiente, o PAC enfrenta a questão da gestão pública. Eleger um bode expiatório é fácil', raciocina.
O economista da RC acredita que 'o gestor do crescimento é o Planalto, mas se trata de um gestor sem meta'. Seu papel como incentivador de um plano de desenvolvimento é insubstituível e exige arrumação interna do Executivo. Rabello de Castro usa a imagem de uma orquestra para ilustrar sua idéia. 'Tudo é segmentado e o maestro é quem tem como tocar as áreas, impor a existência de um governo, uma orquestra, e não só os músicos isolados'. Na avaliação do consultor, hoje no governo Lula cada ministério cuida isoladamente de seus problemas, ninguém afina o conjunto.
SEM ATROPELOS
Segundo balanço do próprio governo, chega a 14 o número de obras previstas pelo PAC que estão atrasadas por problemas com licenças ambientais. Metade delas foi carimbada pelo Planalto com o selo vermelho - ou seja, recebeu status de 'preocupante' - no balanço do andamento atual do programa.
O fato deixou irritado o presidente Lula e aprofundou a diferença entre Marina e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que atua como coordenadora do PAC. Marina tem evitado expressar divergências em público. Mas pode ser tomado como sinal de seu desconforto a insistência com que repete duas máximas: crescimento e proteção ambiental não devem ser vistos como incompatíveis e não haverá afrouxamento nos processos de licenciamento ambiental para os novos empreendimentos.
O peso da responsabilidade pelo entrave nas obras do PAC é visivelmente percebido pelos integrantes do Ministério do Meio Ambiente. Braço direito de Marina Silva, o secretário-executivo do ministério, João Paulo Capobianco, chegou a fazer um desabafo público. Na quarta-feira, em audiência na Câmara, ele alertou em tom enfático: 'Não se pode jogar para a área ambiental todo o problema.'
O economista Eduardo Giannetti concorda com Capobianco, de que é 'ilusão' apontar um único culpado para a lentidão com que os projetos do PAC e a própria economia têm se desenvolvido. 'Não são só os juros, não é só o meio ambiente, não é só o ambiente regulatório nem só o ambiente de negócios', observa. Gianetti lembra que a questão ambiental, no século 21, é de primeiríssima ordem, o que justifica a necessidade de ela não ser 'nem atropelada nem transgredida'.
Por outro lado, ressalta Giannetti, não pode haver paralisia no processo decisório, assim como procrastinação ou indefinição. 'Se for inviável, tem logo que dizer isso. O que não pode prevalecer é o impasse, e o processo ficar emperrado.'