Título: O que faz um presidente empreendedor
Autor: Carneiro, Dionísio Dias
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/05/2007, Economia, p. B2

O Brasil vai crescer mais e surpreender o mundo. Não se sabe quando. Mas não será com a conversa mole que está sendo oferecida ao grande público. Precisa-se de um presidente 'empreendedor' para substituir o emperrado Estado empresário. O PAC não é um programa, mas uma listagem de projetos. Se 'ser parte do PAC' fosse uma senha para sinalizar prioridade, pelo menos teríamos um instrumento de acompanhamento gerencial de promessas. Ainda não é. Como esforço para ir além do palavrório dissonante dos ministros, é uma boa notícia. Má notícia é o rosário de desculpas para os resultados, pobres, mesmo considerando que o governo Lula começou em janeiro de 2007 e não de 2003. Ficou claro que Lula precisa de mais que uma torcida organizada para derrotar os inimigos internos da eficácia administrativa. Tem dissipado energia com os Chávez & Morales, com os sem-terra que querem mais verba e com os politiqueiros interessados apenas em agradar aos seus currais eleitorais. Extramuros, o ambiente não poderia ser mais favorável. A oposição, dividida, aguarda os erros do governo para transformá-los em votos. A economia internacional se anima com a suavidade da reversão cíclica americana, uma correção organizada dos excessos que beneficia o Brasil. Os preços das commodities refletem esse cenário benigno e os capitais aceitam maior risco em busca de maior retorno. O resultado líquido é que o Brasil, assim como outros países de integração crescente à economia mundial e com ficha suspeita, fica mais atraente. Com procura crescente por seus produtos e preços baixos de insumos que resultam dos ganhos de produtividade industrial e da especialização internacional, os preços relativos tornam-se favoráveis. O resultado das apostas em mais do mesmo é o baixo custo de capital. Nesse contexto, o câmbio se valoriza, melhora os salários reais e estimula o consumo interno. Mas as mudanças provocam conflitos que o sistema político não consegue processar, perdendo-se em uma agenda perversa. A deterioração das instituições é tolerada pelo governo e expulsa da pauta os conflitos trazidos pela modernização econômica. Só o presidente pode desestimular espertezas baratas e frases vazias, que substituem a coragem para mudar. Um exemplo de agenda de 'presidente empreendedor' foi a que elegeu Nicolas Sarkozy. Este argumentou com clareza e coragem aos estudantes, em setembro, a necessidade de imitar instituições que funcionam, em vez de atolar o debate com o resgate de utopias do século 20 que foram demolidas pelos fatos. Os jovens elegeram quem propôs mudanças, defendeu o que pensa, e não quem cortejava a platéia. Aqui prevalece o discurso do homem cordial, que disfarça conflitos e oculta escolhas difíceis. Se a primeira avaliação do PAC fosse uma prestação de contas que uma empresa aberta faz aos seus acionistas por força de lei, os executivos seriam demitidos. A conveniência das regras de comunicação oficial protege os 'gerentes' públicos dos confrontos e alivia seus temores. Daqui a três meses, faltarão 'apenas' mais outros três para a licitação das rodovias, cinco anos depois da eleição de Lula. Há tempo para buscar argumentos para a demora de 'apenas seis meses' dos investimentos para aumentar a oferta de energia, para mostrar que as decisões sobre desoneração dos investimentos aguardam as avaliações de perdas de receita e que as PPPs estão saindo. Enquanto isso, o governo promete anular os efeitos dos preços relativos externos, mesmo que isso incentive investimentos em projetos inviáveis contra a competitividade do País. Nas duas eleições presidenciais, faltou quem propusesse o crescimento com base em investimentos privados. Em 2002, Lula convenceu os eleitores de que exclusão, pobreza e estagnação eram fruto de uma conspiração neoliberal. Em 2006, graças às dúvidas dos tucanos quanto às privatizações e ao papel do setor privado na condução dos investimentos, convenceu os eleitores de que merecia outra chance. Algum dia, algum presidente será eleito por defender a ousadia da modernização, contra o pensamento estatista que domina o País. Não se sabe quando o Brasil se livrará dos fantasmas que resultam em mais impostos. Pode levar tempo. Enquanto isso nossos líderes se condenam a repetir a explicação desastrada do ex-primeiro-ministro inglês John Major: 'Quando imprensado, de costas contra a parede, é hora de se virar e lutar.'