Título: CNJ autoriza incorporação de benefício que estoura teto em SP
Autor: Macedo, Fausto e Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/05/2007, Nacional, p. A4

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) curvou-se ao lobby de São Paulo e reconheceu como legal uma vantagem paga aos magistrados sob a rubrica ¿sexta-parte¿ - no contracheque, isso representa incorporação do equivalente a 1/6 dos vencimentos, após 20 anos de serviço. A concessão abriu caminho para holerites com cifras que furam o teto do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 24,5 mil - limite imposto a todo o funcionalismo pela Constituição. Dezenas de desembargadores paulistas foram contemplados. Para quem ganha próximo do teto, a sexta-parte representa valor em torno de R$ 4.000.

A decisão do CNJ, que tem caráter liminar, foi tomada em abril por maioria de votos dos conselheiros que integram o órgão encarregado pela Constituição de fiscalizar os atos do Judiciário. O relator do caso, conselheiro Eduardo Kurtz Lorenzoni, procurador da República no Rio Grande do Sul, defendeu o fim da vantagem especial, mas foi voto vencido.

O mérito da questão ainda será julgado, mas não há um prazo para que isso ocorra. Em junho termina o mandato dos atuais conselheiros do CNJ. Dificilmente eles irão retomar o assunto, devendo deixar a decisão final para seus sucessores.

Precavidos, diante da ameaça de perderem o benefício, os desembargadores já estão passando procuração a advogados para que preparem mandado de segurança a ser impetrado perante o STF. Eles não admitem abrir mão da sexta-parte, que consideram direito adquirido. Argumentam que esse dinheiro é igualmente distribuído a todos os servidores paulistas, indistintamente, desde antes da Constituição. A sexta-parte, no entanto, não é autorizada pela Lei Orgânica da Magistratura, em vigor desde 1979.

Os magistrados apegam-se ao princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos. Nessa linha, também não querem perder uma outra vantagem, a dos quinqüênios acumulados - ou adicional por tempo de serviço.

Cada quinqüênio representa 5% a mais no salário. Há casos de desembargadores que contam até nove quinqüênios - o que faz superar com folga o teto constitucional.

Com relação a esse adicional, a que todo funcionalismo pode ter direito, o CNJ impôs um limite de sete quinqüenios, seguindo o que manda a Lei Orgânica da Magistratura. Mesmo com a exclusão de dois quinqüenios, desembargadores mais antigos ganham acima dos R$ 24,5 mil.

OUTROS ESTADOS

Juízes de outros Estados reclamam que não tiveram o mesmo tratamento dado a São Paulo. A maior parte dos Tribunais de Justiça teve que cortar excedentes pagos a título de verba de representação - gratificações absorvidas sob os mais variados pretextos e concedidas com base em resoluções administrativas, carentes de suporte legal na avaliação do CNJ.

No Rio Grande do Norte, por exemplo, foram identificados 30 juízes - 13 da ativa e 17 aposentados - recebendo remuneração superior ao teto, sob a forma de verbas indenizatórias e parcelas de irredutibilidade.

As exceções que o CNJ reputou irregulares e mandou cortar incluíam salário-família, anuênios e gratificações a presidente de câmara, presidente, vice-presidente e corregedor de tribunal. Também eram pagas a quem ocupou o cargo de ouvidor, de diretor da escola da magistratura, diretor da revista do tribunal e integrante de conselho da magistratura. A parcela de irredutibilidade correspondia ao chamado provento de classe imediatamente superior e a adicional por tempo de serviço, salário-família e gratificação de nível universitário.

O CNJ só autorizou pagamento - de forma temporária e dentro do teto - de gratificações relativas às funções de presidente, vice e corregedor de tribunal, além de diretor de escola.

MORALIZADOR

¿O teto é moralizador, não tem nenhum juiz que seja contra o teto¿, afirmou o presidente da Associação Paulista de Magistratos, Sebastião Amorim. Desembargador aposentado, ele ganha cerca de R$ 26 mil, incluída a sexta-parte. Incorporava 11 quinqüênios ao seu contracheque; agora são 7 os quinqüênios recebidos, por causa da exigência do CNJ. ¿Sou um recordista no funcionalismo, trabalhei 55 anos no serviço público, 35 como juiz. Tiraram de mim até a gratificação que tinha como presidente do 2º Tribunal de Alçada e como vice. Era uma verba pequena, 2% como presidente e 2% como vice, tudo somado não chegava a R$ 700.¿

Amorim vai recorrer ao STF, onde pretende reaver o que considera seu direito. Ele lembrou que o CNJ havia determinado um subteto (R$ 22, 1 mil) para os Estados, mas esse limite ruiu em fevereiro, quando o STF, por 10 votos a 1, concedeu liminar a uma ação da Associação dos Magistrados Brasileiros. A principal entidade da toga sustentou, com sucesso, que a magistratura é nacional e única, modelo que não comporta diferenças entre juízes estaduais, federais, militares ou trabalhistas, inclusive na remuneração.

O presidente da Apamagis ressaltou: ¿É correto que aquele que ultrapassar o teto deva ter seu contracheque congelado até que futuros aumentos ou reposições absorvam o valor pago a mais. O Tribunal de Justiça de São Paulo não concede privilégios e mandou excluir qualquer valor que escapasse do teto. Mas a sexta-parte está sendo depositada por força da decisão do CNJ.¿

O ministro do Superior Tribunal de Justiça e corregedor nacional da Justiça, Antônio de Pádua Ribeiro, é contra a interpretação favorável aos magistrados paulistas. ¿Essas parcelas (sexta-parte) foram reconhecidas em liminar como parcelas antigas. Estão recebendo como valor nominalmente identificado, não são parcelas manifestamente ilegais.¿