Título: Com decisão do STF, Estados não fornecem remédio caro
Autor: Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/05/2007, Vida&, p. A11
A queda-de-braço entre pacientes e secretarias estaduais de saúde para obtenção de medicamentos de alto custo entrou numa nova fase em março, com uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na medida, o STF determinou que o Estado de Alagoas só estava obrigado a oferecer aos seus pacientes as drogas que constam na lista de medicamentos excepcionais preparada pelo Ministério da Saúde.
Com base nessa decisão, outras secretarias passaram a adotar a mesma orientação e ingressar na Justiça para interromper o fornecimento de drogas que não constam na lista - mas que já vinham sendo ofertadas a pacientes, com base em liminares judiciais.
O Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) recomendou a todos os seus integrantes agir dessa forma, afirmou o vice-presidente do conselho, o secretário da pasta do Amazonas, Wilson Alecrim. O vice-presidente não sabe, no entanto, quantas secretarias já adotaram a medida.
Mas somente em seu Estado, três recursos foram interpostos - um deles, com desfecho favorável para a secretaria. ¿Tratava-se de um remédio de uso contínuo para câncer, cuja caixa com 28 comprimidos custava R$ 18 mil¿, diz.
¿Virou um efeito dominó, muitos pacientes que tinham garantido o acesso a drogas importantes para sobrevivência, agora têm o direito negado¿, afirma o presidente da Associação Brasileira de Mucoviscidose, Sérgio Sampaio. Há um mês, Sampaio e integrantes de outras 23 associações criaram o Movimento pela Vida Brasil Mostra a sua Cara, para tentar convencer o Judiciário dos perigos da decisão do STF.
¿Essa decisão poderá provocar um homicídio coletivo autorizado, pois a lista do Ministério da Saúde não sofre uma atualização significativa desde 2002¿, denuncia Sampaio.
O procurador da República Carlos Henrique Martins Lima considera inapropriada a interpretação genérica da decisão do STF: ¿Estados estão usando uma decisão restrita a Alagoas como se fosse um marco jurídico, uma nova orientação política¿, avalia. Martins Lima conta que um processo semelhante está para ser analisado no STF. A esperança, afirma, é que tal confusão seja agora esclarecida.
A lista de medicamentos excepcionais preparada pelo ministério inclui remédios de alto custo para tratamento de doenças que vão de insuficiência renal, câncer e mal de Alzheimer a drogas para evitar a rejeição de transplantes. Em outubro, depois de quatro anos sem nenhuma alteração, a lista de medicamentos foi atualizada. Mas foi uma mudança considerada apenas pontual pelos grupos de pacientes.
¿Entraram cinco drogas, mas quatro foram retiradas¿, conta Sampaio. Ao mesmo tempo, foi padronizado o limite do uso dos remédios - o que, em sua avaliação, não deveria ocorrer.
BURACO NEGRO
Para secretários estaduais, a decisão do STF os livra de uma constante ameaça. Alecrim afirma que medicamentos excepcionais representam ¿um buraco negro para finanças estaduais¿, pois os secretários nunca sabem quando outro grupo de pacientes ingressará com ações para adquirir remédios que, muitas vezes, não têm nem mesmo eficácia comprovada.
Os números de São Paulo retratam a complexidade do problema. No Estado, são 350 mil pacientes no programa. Em 2003, havia 100 mil paulistas inscritos. ¿O problema não está em cumprir a lista, mas os mandados judiciais, que muitas vezes contemplam pedidos absurdos, do ponto de vista médico¿, afirma Alecrim. Em abril, o Ministério da Saúde liberou R$ 98,5 milhões para contribuir com a compra de tais drogas.
Para o procurador Martins Lima, tal problema poderia ser resolvido caso a lista de medicamentos excepcionais tivesse uma atualização mais ágil e houvesse critérios mais claros para que drogas novas fossem incluídas ou recusadas no programa. ¿O argumento sempre escutado é que a Justiça determina entrega de xampus ou remédios sem registro na Anvisa. Isso é exceção. No dia-a-dia, vemos um grande número de pedidos na Justiça para fornecimento de remédios já registrados na Anvisa, mas que estão há anos em análise pelo Ministério da Saúde¿, completa.
Em dezembro, o governo criou a Comissão de Incorporação de Tecnologias, cujo objetivo é justamente analisar pedidos para inclusão de medicamentos na lista de alto custo. Pelas contas dos laboratórios, pelo menos 70 remédios, de 31 indústrias, aguardavam avaliação. Dia 31 de março terminou o prazo para que os pedidos fossem novamente feitos à comissão. Mas não se sabe, ainda, quais os critérios para avaliação e em que prazo o resultado será divulgado.