Título: Um Ministério travado
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/05/2007, Notas e Informações, p. A3
A produção agrícola vai bem, impulsionada pelos preços internacionais e pelos ganhos de produtividade, enquanto o Ministério da Agricultura continua emperrado. A ineficácia governamental pode prejudicar seriamente o esforço dos produtores. O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, foi um dos últimos nomeados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e até a semana passada só um de seus auxiliares, o novo secretário de Defesa Agropecuária, Inácio Kroetz, havia assumido o posto. Na segunda-feira foi indicado o ex-deputado peemedebista Silas Brasileiro, presidente do Conselho Nacional do Café, para a Secretaria-Executiva, segundo posto mais importante do Ministério.
No entanto, o ministro afirma, com otimismo, que quase todo o segundo escalão está definido, só faltando escolher o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O nome seria analisado com o presidente Lula, disse Stephanes, sem mencionar, no entanto, a disputa encarniçada entre petistas e peemedebistas pela chefia do órgão responsável por levantamentos de safra, estudos técnicos e pela execução das políticas oficiais de estoques e abastecimento. Esse ¿quase¿, portanto, não é uma notícia muito animadora, mais de quatro meses depois de iniciado oficialmente o segundo mandato e mais de seis depois da vitória no segundo turno da eleição presidencial.
Emperrado no jogo do loteamento de cargos e incapaz de trabalhar com base em prioridades, o governo continua favorecido pela sorte e especialmente pelas condições internacionais. O Brasil deve colher 130,7 milhões de toneladas de grãos e oleaginosas na temporada 2006-2007, segundo o oitavo levantamento de safra divulgado ontem pela Conab. Se os fatos confirmarem a estimativa, a produção será 8,2% maior que a do ano anterior e 6,1% superior à última safra recorde, a do período 2002-2003.
Esse crescimento se deve principalmente à evolução dos preços internacionais e ao esforço de recuperação econômica dos produtores, depois de três anos difíceis. A intervenção do governo, durante esse período, só ocorreu quando a crise já havia afetado milhares de agricultores de regiões diversas. A renegociação das dívidas, feita com atraso e sem muito critério, custou mais do que teria custado, se a ação do governo fosse mais pronta, e muitos beneficiários estão hoje sem condições de obter novos créditos.
Ocupado principalmente com arranjos políticos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva continuou, nos últimos meses, menosprezando ou ignorando as necessidades urgentes da agricultura. Levou meses para escolher o novo ministro. A decisão foi subordinada, afinal, à política de repartição de cargos entre os partidos da coalizão governamental. Escolhido o nome, a composição do segundo escalão ficou na dependência dos interesses de grupos do PMDB e do PT.
Para o Ministério funcionar não bastará, no entanto, completar-se o segundo escalão. O governo simplesmente não tem uma política agrícola. Os ministros anteriores, Roberto Rodrigues e Luís Carlos Guedes, tentaram definir prioridades e dar um rumo ao trabalho da Pasta, mas seu sucesso foi limitado. Não podiam fazer muito, quando o próprio governo era incapaz de eleger prioridades e concentrar recursos e esforços nas tarefas essenciais.
Na área tecnológica, as ambições de modernização foram limitadas pelos entraves criados à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). O próprio governo criou condições para a transformação desse comitê numa assembléia dominada pela balbúrdia ideológica. Em segundo lugar, o presidente Lula ainda não resolveu se quer incentivar ou desestimular o agronegócio. O Ministério da Agricultura fez a primeira opção, mas o caminho oposto tem sido seguido pelos Ministérios do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente.
Finalmente, falta ao governo a percepção das tarefas indispensáveis. Sem dinheiro e pessoal para a defesa sanitária, o risco de novos surtos de febre aftosa e de outras doenças permanece. O novo ministro já falou sobre o assunto com o presidente. Não há sinal, até agora, de resultado.