Título: Crise de abastecimento põe em risco a popularidade de Chávez
Autor: Costas, Ruth
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/05/2007, Internacional, p. A16

Uma crise de escassez de alimentos põe em risco a popularidade do presidente Hugo Chávez. Prova disso foi o furor causado em todo país ontem pela divulgação de um estudo da consultoria Datanálisis, que traduziu em números o que tem feito o dia-a-dia dos venezuelanos mais complicado nos últimos meses: pelo menos 80% dos venezuelanos têm dificuldade de obter alimentos da cesta básica. De acordo com pesquisas recentes não há fornecimento contínuo de pelo menos 9 itens essenciais: carne, açúcar, leite, feijão preto, ovos, manteiga, óleo de cozinha, frango e queijo. Logo que os açougues recebem mercadorias se formam filas na porta para conseguir alguns quilos de carne.

¿O abastecimento de alimentos é uma prioridade para o governo porque afeta justamente a população mais pobre, que apóia o presidente Hugo Chávez¿, disse ao Estado o historiador Alberto Garrido, autor de diversos livros sobre o chavismo. Na base da pirâmide social, os venezuelanos gastam 45% de seu orçamento com alimentos. São eles os que mais sofreram com a alta de 30% nos preços desses produtos nos últimos 12 meses, provocada pela escassez. ¿Chávez já ameaçou estatizar as redes de comercialização e distribuição de alimentos no passado e, como esse é um tema que pode afetar a popularidade do governo, não descarto a hipótese de que ele tome uma medida radical se a situação continuar a se agravar¿, opina Garrido.

O presidente do Instituto de Defesa da Educação do Consumidor e Usuário (Indecu), Samuel Ruh Ríos, tentou ontem à tarde apaziguar o clima de descontentamento causado pelas filas e consumidores descontentes com a qualidade dos produtos disponíveis. ¿Desabastecimento é uma palavra muito dura¿, disse. ¿As pessoas devem ter calma porque se continuarem comprando tanto (por medo que falte), o problema ficará certamente maior¿, completou. Na véspera, o Exército iniciou a fiscalização de granjas suspeitas de estocar frango com fins especulativos.

O governo acusa comerciantes e distribuidores de armazenarem produtos para impulsionar os preços no mercado ¿paralelo¿ (já que oficialmente eles são tabelados), mas a maior parte dos economistas contesta a explicação. ¿O governo desestabilizou o mercado de alimentos desestimulando a produção interna com tabelamento de preços e ameaças de estatização. Agora que a demanda está crescendo, com a economia inchada pelos recursos do petróleo, não há como atender o mercado doméstico¿, disse ao Estado Roberto Bottome, diretor do diário econômico Veneconomia.

Um exemplo da interferência estatal nesse setor é a rede de supermercados Mercal, criada em abril de 2003, que hoje supre 50% do mercado venezuelano. Vendendo a preços subsidiados, ela ajudou a quebrar parte dos pequenos comerciantes nos bairros pobres e agora em muitas de suas unidades há filas e falta de alguns produtos.