Título: Na'República Lago', 23 parentes do governador têm cargo público
Autor: Santa Cruz, Angélica
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/05/2007, Nacional, p. A6

Quatro meses depois de tomar posse, o governador do Maranhão, Jackson Kepler Lago (PDT), montou a maior rede de nepotismo em administrações estaduais do País. O listão de parentes e contraparentes nomeados por Lago para cargos públicos já chega a 23 pessoas - entre elas dois irmãos, quatro sobrinhos, três primos e um genro. Nomeada secretária particular do governador, a primeira-dama Maria Clay Moreira Lago abriga no governo dois irmãos, seis sobrinhos e dois primos. E, primo do governador e chefe da Casa Civil, Aderson Lago pendurou nos cofres maranhenses pelo menos dois sobrinhos.

A República dos Lago é a linhagem de nepotismo de maior extensão de que se tem notícia no Brasil. Conta com mais que o dobro dos parentes empregados nos dois Estados concorrentes. No Paraná, o governador Roberto Requião (PMDB) emprega seis familiares. No Pará, a petista Ana Júlia Carepa (PT) nomeou sete.

Na semana passada, Lago precisou se explicar por meio de notas oficiais e entrevistas coletivas depois que dois de seus sobrinhos foram presos pela Polícia Federal sob acusação de negociar propina de R$ 240 mil com uma funcionária da construtora Gautama para liberar recursos de obras públicas no Maranhão. De acordo com os policiais, Francisco de Paula Junior e Alexandre do Maia Lago - filho de Nonato Lago, conselheiro do Tribunal de Contas do Maranhão e irmão do governador - teriam intermediado o pagamento a pedido do tio. Jackson Lago não foi preso porque a Constituição maranhense afirma que os governadores do Estado só podem ser detidos em flagrante.

Na quinta-feira, Lago negou ter conhecimento de qualquer ¿procedimento ilícito¿. Na sexta, embarcou para a Argentina para participar de um encontro de governadores - e sua comitiva oficial incluía e a primeira-dama e nada menos que quatro cunhadas.

Depois da viagem, coube a alguns dos assessores de Lago a tarefa de explicar que o chefe nem é tão ligado assim aos dois sobrinhos presos na sede da Polícia Federal. ¿Olha, trabalho com o governador há dez anos e não me lembro de vê-lo fazendo referência a eles. E eles nem têm cargo no governo estadual...¿, sustentou José Raimundo Pinheiro Neto, chefe da Assessoria de Comunicação Social do governo maranhense.

SURPRESA POLÍTICA

A distribuição dos parentes do governador pelos cargos públicos do Maranhão não pode ser considerada ilegal porque o nepotismo não é crime tipificado - e a única forma de denunciá-lo está no artigo 37 da Constituição, segundo o qual ¿a administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência¿. Mas é uma surpresa administrativa e política.

Homem público que gosta de vestir roupagem de esquerda - daqueles que mantêm na biblioteca de casa retratos de Che Guevara, Luís Carlos Prestes e fotos ao lados de Darcy Ribeiro e Leonel Brizola -, Lago foi o primeiro governador eleito sem o apoio da oligarquia Sarney em 40 anos. Ao longo da campanha, usou à exaustão frases como ¿O Maranhão não é de uma só família.¿ Impulsionada sobretudo pela aliança com antigos aliados dos Sarney, como o ex-governador José Reinaldo - também preso na Operação Navalha -, Lago foi o maior azarão das últimas eleições e venceu Roseana Sarney (DEM) com 51,82% dos votos válidos.

Em seus primeiros atos depois de ¿libertar o Estado dos Sarney¿, Lago já loteou os cargos entre seus familiares. Cinco deles foram parar no primeiro escalão. O genro Júlio Noronha virou secretário da Indústria e Comércio; a mulher Clay - médica com pós-graduação em ginecologia - foi nomeada secretária particular com salário de secretária estadual ; a cunhada, Maria Cristina Moreira Lima, ocupou um cargo batizado de ¿subsecretária particular adjunta do governador¿; o primo Aderson Lago foi transformado em chefe da Casa Civil e o irmão Antônio Carlos Lago virou diretor financeiro da Empresa Maranhense de Administração Portuária (EMAP).

Outro irmão do governador, Wagner Lago, virou representante do Maranhão no Distrito Federal. A filha de Wagner, Lívia Oliveira Lago, foi escolhida adjunta do pai. Três sobrinhos de Jackson Lago foram distribuídos por secretarias estaduais. Maria da Glória do Lago é assessora da Casa Civil, Valterlan Souza do Lago é assessor de Comunicação e Augusto Gomes do Lago está lotado na Secretaria do Trabalho.

A rede também se expandiu entre parentes dos parentes - e já produziu episódios que entraram para o folclore político maranhense. Um deles: primo do governador, chefe da Casa Civil e ex-deputado estadual acostumado a subir à tribuna para denunciar os efeitos do ¿monopólio da família Sarney¿, Aderson Lago conseguiu nomear seus filhos - Carolina Pires Ferreira Lago e Aderson de Carvalho Lago Neto -, a mulher, Conceição, e até a mãe de 80 anos, Maria Tereza Lago, para cargos na Assembléia Legislativa. Denunciado pela imprensa local, o bonde familiar foi desfeito dias depois, com a exoneração de todos.

No meio político maranhense, a piada agora é que, não tendo mais para onde indicar parentes ou parentes de parentes, o governador encaixou os que sobraram na Operação Navalha.