Título: Uso político fragiliza e sucateia PDVSA
Autor: Costas, Ruth
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/05/2007, Internacional, p. A16

Ao definir os rumos do setor petrolífero por critérios políticos, em lugar dos econômicos, o governo venezuelano pode estar envenenando sua galinha dos ovos de ouro. O alerta é feito por especialistas do setor, que apontam como sintomas de intoxicação o aparente sucateamento da estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA), responsável por 45% do orçamento público venezuelano. Outros sinais seriam a queda na produção e exportação de petróleo e a falta de disposição das petrolíferas estrangeiras de investir pesado no país - conseqüência do ambiente instável criado pelas recente nacionalização dos empreendimentos da Bacia do Rio Orinoco.

'Não é mistério que a base da popularidade do presidente Hugo Chávez são os projetos sociais patrocinados com o lucro do setor petrolífero', disse ao Estado Maxim Ross, consultor econômico em Caracas. 'Muito mais difícil de explicar é por que o governo tem cometido tantos erros elementares na gestão desse segmento da economia e administrado a PDVSA como se fosse um clube para parentes e amigos.'

De acordo com dados do Banco Central da Venezuela, as exportações de petróleo caíram 13,2% em relação ao ano passado, apesar de o preço da cesta básica venezuelana ter subido de US$ 41,89 para US$ 52,66 no período. As vendas para os EUA também diminuíram (15,7%), fazendo com que a Nigéria tomasse o lugar da Venezuela como quarto maior exportador para o mercado americano.

Outra mudança que trouxe riscos para a estatal venezuelana, na opinião dos economistas, foram as exigências de que a empresa reverta parte de sua receita para programas sociais em áreas como saúde e educação. A estatal atualmente destina 10% de seus rendimentos para obras em comunidades nas quais atua e alimenta o chamado Fundo para o Desenvolvimento Econômico e Social do País (Fondespa), além de financiar as 'missões', que levam ensino e atendimento médico a bairros pobres.

'A intenção é boa: fazer o lucro do petróleo chegar à população', diz Ross. 'Mas a estratégia é arriscada: uma empresa petrolífera precisa se modernizar e reinvestir em sua produção - ou seja, seu negócio deve ser produzir petróleo, e não construir escolas, hospitais e casas populares, sob o risco de perder eficiência.'

De acordo com o governo venezuelano, os aportes sociais da PDVSA cresceram cerca de 90% em 2006, chegando a US$ 13,3 bilhões. Isso é mais do que a empresa investiu no mesmo ano na produção de petróleo. Por causa desse aumento, o lucro da estatal caiu 26% em 2006, passando de US$ 6,5 bilhões para US$ 4,8 bilhões - isso num período no qual o preço do petróleo foi recorde.

Acrescente-se a isso o uso pouco criterioso das reservas petrolíferas, na compra de apoio de países da região, e o cenário é ainda mais preocupante. Chávez vende petróleo a preço de banana para a Nicarágua, troca por ajuda médica com os cubanos e doa combustível para o Haiti. 'De Cuba ao Vietnã, praticamente todo representante de governo que vem visitar a Venezuela ou oferece seu apoio ao presidente recebe em troca uma promessa de concessão para explorar um campo de petróleo na Bacia do Orinoco, sem que sejam feitos estudos para analisar a viabilidade econômica desses países atuarem na região', disse ao Estado Diego Gonzáles, que trabalhou 38 anos no setor petrolífero venezuelano, a maior parte deles na PDVSA, e hoje é diretor da empresa de consultoria Paradigmas XXI. O que deveria ser a riqueza mais bem administrada da Venezuela virou moeda de troca na diplomacia do petróleo.

'Executivos com larga experiência foram dispensados da PDVSA por serem considerados inimigos do país e os funcionários que os substituíram não têm know how suficiente para permitir à empresa assumir todas as atividades que passarão para sua responsabilidade com a assinatura dos contratos de nacionalização', prossegue Gonzáles.

O governo venezuelano estabeleceu 26 de junho como data-limite para as seis companhias estrangeiras que atuam no Orinoco (a francesa Total, a norueguesa Statoil, a britânica British Petroleum e as americanas ChevronTexaco, Exxon Mobil e ConocoPhilips) assinarem os contratos cedendo a maioria acionária de seus empreendimentos para a PDVSA.