Título: Queda do dólar muda mapa agrícola do País
Autor: De Chiara, Márcia
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/05/2007, Economia, p. B1
Mudou o mapa da agricultura brasileira de grãos. As regiões tradicionais produtoras do Sul, tendo como coração o Paraná, voltaram a ser mais rentáveis para exportação do que o Centro-Oeste, que durante os últimos 15 anos foi o eldorado do agronegócio em razão das terras baratas. A trajetória de queda do dólar, que na semana passada rompeu a barreira de R$ 2, provocou o rearranjo do agronegócio e já tem reflexos na renda que circula nessas regiões.
'O dólar deixou de encobrir a ineficiência da infra-estrutura', diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados, que detectou as mudanças. Para ele, a moeda americana vai continuar em queda 'até onde a vista alcança', e a alteração na geografia do agronegócio veio para ficar pelos próximos três a quatro anos, até que haja tempo hábil para consertar problemas da infra-estrutura.
Com o dólar abaixo de R$ 2, a margem de ganho do produtor de milho de Londrina, no norte do Paraná, equivale, nesta safra, a 56% do preço de exportação. Se for incluído o gasto com frete, cai para 28%, segundo a consultoria. Trata-se de uma bela margem, diz Mendonça de Barros, se comparada à obtida pelos produtores de Rio Verde, importante pólo de grãos no sul de Goiás. A rentabilidade do produtor da região que exporta milho é 51% do preço nesta safra. Com o frete, cai para 8,5%, menos de um terço do ganho obtido pelo agricultor do Paraná.
'O produtor do Paraná está no céu', diz Mendonça de Barros. Essa também é a avaliação do produtor Carlos Roberto Pupin. O agricultor faz essa afirmação com conhecimento de causa, pois cultiva grãos no Paraná e no Tocantins.
Segundo Mendonça de Barros, os resultados desta safra indicam que a lógica que prevaleceu nos últimos 15 anos de os agricultores irem em busca de terras baratas no Centro-Norte está quebrada por causa da falta de infra-estrutura de transporte, segundo fator apontado por ele como agente da mudança. 'Quem pagar agora o menor 'imposto' de infra-estrutura vai se sair melhor.'
Também as questões ambientais frearam a abertura de áreas na região amazônica, pondera o economista. A saída dos grãos produzidos no centro do País pela Região Norte está aparentemente prejudicada por falta de investimento e restrições ambientais mais severas. Estudo da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) mostra que os portos de Paranaguá (PR), Santos (SP) e Rio Grande (RS) respondem por mais da metade das exportações do complexo soja (óleo, farelo e grão) e carnes.
'A região produtora de grãos mais tradicional, que é o Paraná e o entorno, vai, cada vez mais, se tornar a área de cultivo de grãos para exportação, pois está relativamente próxima dos portos', diz Mendonça de Barros. Ele observa que o risco da gripe aviária também apressou a migração da produção de pequenos animais do Sul para Mato Grosso e Goiás, onde o milho e a soja usados na ração são mais baratos.
O superintendente técnico da CNA, Ricardo Cotta, concorda com Mendonça de Barros: 'Há um travamento na expansão de novas áreas agrícolas para o Centro-Norte do País porque não há rentabilidade suficiente nessas regiões para compensar os investimentos'.
Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mostram indícios da mudança de perfil. A área plantada com grãos no Centro-Oeste caiu 11,5% entre as safras 2004/05 e 2006/07, enquanto a retração do Sul no mesmo período foi de 3,9%. O recuo do Centro-Oeste foi quase o dobro da média nacional, de 6,3% no período.
Também para José Cícero Aderaldo, gerente comercial da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, de Maringá (PR), o Paraná volta a ser o centro da produção de grãos para exportação. Mas ele pondera que todos, tanto os produtores do Sul quanto os do Centro-Oeste, perderam com a queda do dólar. Os mais prejudicados foram os do Centro-Oeste. No caso da soja, ele diz que o custo do frete representa 40% do preço de exportação para o produtor do Centro-Oeste e 15% para o agricultor do Paraná.
Na prática, o impacto da mudança da geografia do agronegócio aparece no desempenho do comércio. Em 12 meses até março, o faturamento do varejo do Sul cresceu 5,2%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No período, a receita do comércio do Centro-Oeste aumentou apenas 2,84%.