Título: Mudança em emendas vai abrir guerra com Executivo
Autor: Manzano Filho, Gabriel e Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/05/2007, Nacional, p. A4

O caráter impositivo das emendas, a ser proposto amanhã no projeto dos 19 líderes da Câmara, é promessa de uma boa guerra com o Executivo - se a iniciativa for mesmo para valer. Ele significa, simplesmente, que se o Congresso aprovar uma despesa no Orçamento, ela será feita, quer o governo goste ou não. Quando muito, a Secretaria do Tesouro Nacional poderá discutir a forma de repassar a verba.

Hoje, as decisões orçamentárias no Congresso são apenas autorizativas. Elas declaram que o governo ¿está autorizado¿ a destinar aquele valor para aquela finalidade. Com essa arma na mão, o governo manobra o dinheiro, e quem dele precisa, a seu bel prazer. Um técnico do Planejamento relata que o governo segura tudo o que não for obrigatório, liberando depois, caso a caso, na medida da conveniência. ¿Tal procedimento corrompe as relações políticas, pois confere ao governo uma verdadeira moeda de troca, empregada para cooptar parlamentares e partidos e administrar crises¿, argumenta, num documento entregue à Comissão de Orçamento-2006, o presidente da Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo.

É por isso que, se alguém abrir hoje o site do Ministério do Planejamento, verá que entre as mais de 360 destinações de recursos do Orçamento de 2006 há algumas com mais de 40% do dinheiro já entregue, outras com 10% ou 5%, e muitas rubricas ainda sem um centavo concedido. Essas diferenças são normais em muitos casos. Não há como discutir ou atrasar os repasses para a Previdência, por exemplo, ou para pagar a dívida pública interna. Mas, no final do ano passado, um balanço mostrava, também, que dos 341 programas com despesas orçamentárias, 102 tinham execução inferior a 30%.

A emenda impositiva representará, se aprovada, uma perda de poder pelo Executivo de que não se tem notícia há muitos anos. Para não perder essa batalha, o governo certamente tentará discutir em separado os planos - a curto e médio prazos - de cada congressista. A história recente dá boas razões ao governo para ser otimista e esperar a adesão de muitos deles para derrubar a medida.

Mas os parlamentares estão esperançosos. ¿Com a emenda impositiva, acaba o uso pelo Executivo das emendas individuais para submeter o deputado à sua vontade¿, defende o líder da Minoria, Júlio Redecker (PSDB-RS). Por lei, o Orçamento destina 1% das receitas de investimentos para emendas individuais, o que tem dado R$ 5 milhões por parlamentar.

As bancadas têm direito a valores bem mais polpudos, que começam ali pelos R$ 25 bilhões, ou R$ 30 bilhões, e nas negociações isso tem de cair para uns R$ 5 bilhões ou pouco mais. No caso das emendas de bancada, o entendimento do grupo é que, por envolverem valores mais altos, elas é que ficam expostas às investidas dos lobistas a serviço das grandes empreiteiras. Nos cálculos do líder do DEM, Onix Lorenzoni (RS), 70% da corrupção está concentrada nas emendas de bancada. ¿Se acabar essas emendas, somem os lobistas do Congresso¿, prevê Lorenzoni.

RETROCESSO

A cientista política Argelina Cheibub Figueiredo propõe que se tenha cautela nas mudanças que agora surgem. ¿Se o Congresso não puder mais emendar o Orçamento, estaremos voltando à época da ditadura¿, diz ela, lembrando que ¿as distorções que existem na elaboração do Orçamento não decorrem do Parlamento¿. ¿Elas são problema do Executivo.¿

Segundo pesquisa feita durante o governo Fernando Henrique Cardoso por ela e outros especialistas, não se pode relacionar a liberação das emendas com o comportamento dos deputados nas votações. ¿O que se pôde observar é que havia uma variação de 40% a 60% das liberações de verbas dos parlamentares, enquanto o apoio aos projetos de governo esteve sempre na faixa dos 90%¿, explica a pesquisadora.