Título: A saída é a reforma política
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/05/2007, Economia, p. B2

Praticamente nenhuma sugestão para melhorar a elaboração, a execução e a fiscalização do Orçamento Geral da União (OGU), feita pela CPI que investigou a compra de ambulâncias superfaturadas, no ano passado, foi acolhida pelo Congresso Nacional. Quem se der ao trabalho de ler o relatório da CPI (disponível no endereço eletrônico) encontrará uma análise profunda sobre as atuais práticas orçamentárias, além de sugestões sobre como aperfeiçoar o OGU, entre as quais, o fim das emendas individuais, que são apresentadas por deputados federais e senadores.

Passado o impacto das denúncias de compras de ambulâncias superfaturadas, no entanto, o assunto caiu no esquecimento e as sugestões da CPMI foram engavetadas. Agora, a opinião pública está chocada com o esquema de corrupção montado pela empresa Guatama, que tem os mesmos vícios e deformações do esquema das ambulâncias. Esse é mais um escândalo, que será seguido por outro e mais outro, numa série infindável até que se faça, segundo o relatório da CPI, a reforma política que torne mais barata as eleições para deputado e senador e garanta melhores condições de governabilidade.

Não são apenas os parlamentares que não quererem mudar nada. Ao governo interessa deixar tudo como está, pois assim pode obter maior controle sobre as votações no Congresso. É bom lembrar que a aprovação da emenda não é o passo final no processo orçamentário. Mesmo depois de aprovada, a liberação do dinheiro para a emenda não está garantida.

Cabe ao governo liberar os recursos. O Executivo pode escolher quais emendas de um político serão executadas ou engavetadas. ¿Isso põe nas mãos do governo um importante instrumento para recompensar ou punir os congressistas de acordo com o grau de apoio ou de oposição que lhe proporcionam durante o ano¿, diz o relatório. A liberação das emendas está associada, portanto, ao processo de construção da base de apoio político do governo.

Tudo isso é feito à revelia da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que, em seu artigo 79, estabelece que a execução orçamentária obedecerá ao princípio da impessoalidade e não poderá ser utilizada para influir na apreciação de proposições legislativas em tramitação no Congresso.

A maioria dos parlamentares vê nas emendas um meio através do qual pode assegurar sua própria sobrevivência política. Para eles, a tramitação do Orçamento se limita ao momento de apresentação e aprovação das emendas, com o manifesto intuito de direcionar para suas bases eleitorais projetos de interesse local.

Tendem a ser reeleitos, diz o relatório da CPI, os candidatos capazes de acumular, nos quatro anos que separam uma e outra eleição, a maior quantidade de meios de campanha, meios financeiros ou a eles equivalentes, como indicações para cargos públicos e outros. ¿A percepção de vantagem financeira em troca de apresentação e liberação de emendas pode, por conseguinte, representar a reeleição do parlamentar¿, observa o relatório.

Atualmente não existem critérios ou parâmetros para a apresentação de emendas e elas são aprovadas sem exame dos custos dos empreendimentos e das metas pretendidas. Às vezes, elas sequer identificam o município beneficiado com as verbas, de forma a permitir manipulação durante o período de execução orçamentária.

O relatório condena as atuais práticas orçamentárias. ¿A falta de critério para apresentação das emendas e o uso indiscriminado da liberação dessas emendas como instrumento de manipulação política não condizem com os princípios republicanos de igualdade no acesso ao serviço público e de impessoalidade na administração¿, diz o texto.

A quantidade de políticos envolvidos na denúncia do esquema das ambulâncias (foram 65 deputados e 3 senadores), mostra que não se trata de um desvio marginal da norma, de decisões individuais minoritárias. Há, observa o relatório da CPI, ¿algo nas regras da política que premia os atores que optam por uma conduta desviante¿.

A conclusão da CPI foi a de que o atual sistema político- eleitoral brasileiro favorece a perpetuação dessas práticas, na medida em que produz eleições extremamente caras. Esse custo deriva de nossa regra eleitoral, que impõe o voto proporcional com listas abertas dos candidatos.

Cada candidato é o centro de uma campanha política e financeira autônoma e a competição entre candidatos do mesmo partido acirra a concorrência por recursos financeiros. O relatório da CPI assegura que a reforma política é o único caminho para superar a atual situação, pois permitirá reduzir o custo das eleições, além de fortalecer os partidos e aumentar as condições de governabilidade.