Título: 'Populismo é uma volta atrás'
Autor: Manzano Filho, Gabriel
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/05/2007, Nacional, p. A11

A América Latina vive um momento de avanço do populismo, mas seu caminho é o da liberdade, e isso quer dizer liberdade política e econômica. É o caminho do mundo ocidental, do qual ela é parte. E nesse cenário o presidente Luiz Inácio Lula da Silva 'demonstrou um pragmatismo muito grande, evidente em suas políticas de governo, e isso motivou uma sensação de estabilidade'.

Quem vem ao Brasil dar esse recado é o ex-primeiro-ministro espanhol José Maria Aznar, que governou por oito anos a Espanha e fará hoje uma palestra, em São Paulo, sobre Democracia versus Populismo na América Latina. Aznar é a primeira grande estrela entre muitas que a Fundação Liberdade e Cidadania, do DEM (ex-PFL), pretende trazer da Europa e dos Estados Unidos para discutir, com o partido e com especialistas brasileiros, questões como violência urbana ou a crise aérea.

Do debate de hoje - a partir de 9 horas, no Hotel Gran Meliá Mofarrej - participarão o presidente da fundação, o ex-senador Jorge Bornhausen, e lideranças liberais, como o ex-vice-presidente Marco Maciel, o prefeito Gilberto Kassab e alguns políticos e especialistas. Ao chegar, ontem à noite, o ex-primeiro-ministro, que preside a Fundación para el Análisis y los Estudos Sociales (Faes), em Madri, falou ao Estado. Os principais trechos da entrevista:

O sr. vem falar de populismo num momento em que ele parece avançar na América Latina, principalmente com o presidente venezuelano, Hugo Chávez. Como o sr. avalia esse fenômeno?

O populismo é uma volta atrás. O que chamam de socialismo do século 21 não é uma aposta para o futuro, mas para o passado. Temos aqui, realmente, regimes quase totalitários e por certo há um risco de contaminação de outros países.

Os populistas fazem sucesso em lugares onde grande parte da população não recebeu os benefícios da democracia. Por que ela falhou?

Não é uma questão de democracia, mas de políticas práticas. Sem dúvida há sérios problemas para essas populações, mas a grande questão é saber quais as respostas adequadas para a situação. Se você olha para trás, há 20 anos a situação da América Latina era mais complicada que a de hoje, com várias ditaduras militares. Desde então, a situação macroeconômica desses países teve um avanço muito grande, a democracia pouco a pouco foi se enraizando.

Mas, pelo visto, não foi suficiente para encantar os eleitores.

Mas o que vemos desde então? Que os países mais prósperos são os que têm instituições mais fortes, regras mais justas, nos quais o mercado funciona e os contratos são respeitados. O desafio é buscar esse caminho e fazer com que tudo isso se estenda em favor dos cidadãos. A volta ao populismo e ao autoritarismo não garantem nada disso. Não são o caminho. O caminho da América Latina é o da liberdade, tanto política quanto econômica, É o caminho do mundo ocidental, ao qual ela pertence.

Como fazer para mudar esse rumo?

O desafio é praticar políticas que dêem oportunidades às pessoas. Isso não se faz distribuindo dinheiro, ou com economias subsidiadas, mas com mercados transparentes, segurança jurídica e física, atraindo investimentos. Basta olhar o mapa do mundo e ver onde estão e como funcionam os países mais prósperos. É só perguntar por quê.

Como o sr. vê o Brasil e o governo Lula nesse cenário?

Creio que Lula demonstrou um pragmatismo muito claro, evidente em suas políticas de governo, e isso motivou uma sensação de estabilidade, de possibilidades renovadas para o País. Minha relação com ele foi sempre boa, e assim a mantemos.

O sr. diz que é um erro generalizar as análises sobre América Latina. O que isso quer dizer?

A América Latina é uma comunidade histórica e moral, mas não é uma comunidade política. Nesse campo as nações divergem muito. Chile ou Venezuela não vivem situações semelhantes, assim como Brasil e Argentina. Temos de ter isso em mente e buscar a integração, em diferentes escalas, como nos acordos de comércio.

A centro-direita tem obtido seguidas vitórias eleitorais na Europa: França, Alemanha, agora Espanha. Isso é uma tendência importante?

Isso é resultado do debate das idéias, que é fundamental, no qual desejamos que prevaleçam as idéias de liberdade. A Europa, é evidente, está caminhando rumo à centro-direita. Os princípios do mercado, da responsabilidade, do mérito, da capacidade, das reformas, tudo isso está renascendo na Europa. Felizmente.