Título: Protesto em Sucre contra intervenção no Judiciário
Autor: Miranda, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/05/2007, Internacional, p. A14
Centenas de pessoas saíram às ruas ontem em Sucre, sede do Poder Judiciário boliviano, para protestar contra a ordem de prisão emitida na terça-feira por um comitê do Congresso contra quatro juízes do Tribunal Constitucional (TC).
Aos gritos de 'Sem Poder Judiciário não há democracia' e carregando cartazes escritos 'Aqui é a Bolívia, não a Venezuela', os manifestantes acusavam o governo de querer controlar o Judiciário e se diziam contra o choque entre os dois poderes.
A ordem de prisão contra os juízes do TC - órgão responsável pela preservação da Constituição do país - foi emitida porque os magistrados não compareceram a um depoimento sobre um processo aberto pelo presidente Evo Morales. Após receberem o pedido de detenção, os juízes foram levados pela polícia até o Congresso.
Os magistrados são acusados por Evo de emitir uma sentença 'mais política do que jurídica' ao ordenarem a suspensão de quatro juízes da Corte Suprema de Justiça (CSJ) nomeados pelo presidente em dezembro. De acordo com o TC, a nomeação foi constitucional, mas por ter sido interina só poderia vigorar por 90 dias e por isso foi suspensa. O TC disse que as nomeações deveriam ser feitas pelo Parlamento, como manda a Constituição do país.
Para Gonzalo Chávez, analista político da Universidade Católica da Bolívia, por trás do pedido de prisão está a disputa de poder. 'Como muitos presidentes da América Latina, Evo Morales quer ter o controle de todos os poderes', afirmou Chávez, por telefone, ao Estado. 'O governo da Bolívia quer se sobrepor ao Judiciário, e o presidente Rafael Correa quer fazer o mesmo no Equador', acrescentou. O analista evitou fazer uma comparação direta entre Evo e seu aliado, o presidente venezuelano Hugo Chávez. 'Embora essa associação seja comum, temos uma sociedade civil muito forte no país.'
Gonzalo Chávez afirma que o sistema judiciário boliviano sempre teve problemas pela forma de nomeação da Corte Suprema. 'Como são os deputados que escolhem os juízes, o Judiciário acaba sendo dividido de acordo com interesses políticos', afirma. 'Se a Justiça não é independente, não temos o equilíbrio de poderes e tanto o Estado de Direito como a democracia ficam comprometidos.'
Ontem o Congresso fracassou mais uma vez em tentar nomear novos juízes para a Corte Suprema, prolongando o conflito entre os dois poderes. Para o analista, a única solução possível para amenizar o choque entre o presidente e a Justiça é o entendimento. 'Um acordo diminuiria a tensão, mas é difícil saber de fato o que pode acontecer daqui para frente porque a luta entre os dois poderes se politizou demais.'