Título: Vaticano dá apoio ao Brasil em política de acesso a medicamentos
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/05/2007, Vida&, p. A16

A Santa Sé anunciou ontem que apoiará o pedido do governo brasileiro para que seja criada uma estratégia internacional para garantir o acesso de remédios para o combate à aids nos países mais pobres. A medida prevê inclusive a quebra de patentes, quando necessário.

O Brasil apresentou a resolução na Organização Mundial da Saúde (OMS) e esperava que um texto de consenso pudesse ser negociado. Mas, no final da noite de ontem, as negociações fracassaram, nenhum acordo foi obtido e o tema será colocado em votação amanhã em Genebra.

O governo brasileiro culpou os EUA, Suíça e outros países europeus de terem tentado barrar um acordo. Na OMS, as resoluções são tradicionalmente negociadas e aprovadas por consenso. Mas, diante do colapso das negociações, o Itamaraty decidiu levar a resolução a uma votação. Pelos cálculos do governo, o Brasil deve ter os votos necessários dos países em desenvolvimento para garantir a aprovação da proposta. Com a votação, o governo prevê que ficará claro quais são os países que são contrários a um maior acesso aos medicamentos.

Empresas farmacêuticas não economizaram recursos para enviar seus principais lobistas até Genebra para barrar a resolução. Para diplomatas e representantes das indústrias, a resolução é ainda um teste para medir o apoio internacional à decisão do Brasil de quebrar a patente do medicamento anti-retroviral Efavirenz, da Merck, há poucas semanas.

Apesar de não poder votar e de ser apenas um observador, o Vaticano decidiu se declarar oficialmente a favor da proposta brasileira. Nos bastidores, ainda está conversando com outros países para deixar clara a importância da aprovação da resolução e pedir um voto pelo Brasil amanhã. Ontem, representante do Vaticano esteve reunido com o governo da Bolívia e deixou claro que espera um apoio do país à resolução brasileira. Segundo fontes da ONU, outros países ouviram o mesmo pedido. ¿Vemos de forma muito positiva a posição do governo brasileiro em relação à propriedade intelectual e por isso apoiamos a proposta feita por Brasília¿, afirmou ao Estado o núncio apostólico da Santa Sé na ONU, Giovani Tomasi. ¿Queremos aproximar nossas posições e unir esforços.¿

RESISTÊNCIA

Apesar do apoio do Vaticano, o Brasil enfrentou ontem dura resistência de países como os Estados Unidos e dos europeus, duas das economias com maior número de empresas farmacêuticas. Os países ricos aceitam a idéia de uma estratégia para o acesso a remédios, mas querem evitar que a possibilidade da quebra de patentes seja algo reconhecido explicitamente como um instrumento.

Para minar a proposta, eles pediram que um subgrupo dentro da OMS fosse formado para avaliar como reunir as diversas propostas em um só texto.

Para diplomatas, a medida já era um sinal de que alguns governos poderiam tentar sabotar a iniciativa do Brasil. Durante o encontro da noite de ontem, o Itamaraty considerou que ficou claro que tanto os americanos como europeus estavam negociando de ¿má-fé¿. A solução foi acabar com a negociação e partir para a votação.