Título: A expansão da fraude
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2007, Notas e Informações, p. A3

Pelo menos 500 dos 2 mil postos de combustíveis da cidade de São Paulo são verdadeiros casos de polícia: adulteração do produto, sonegação de impostos, contrabando, lavagem de dinheiro e outras infrações são o ¿negócio¿ ali praticado e, em boa parte, já não pertencem mais a um ou outro comerciante individual, mas a verdadeiras quadrilhas, sendo usados para ¿lavar¿ o dinheiro resultante de assaltos e tráfico de drogas.

Na semana passada, o Ministério Público Estadual (MPE) de São Paulo pediu à Justiça o confisco de 22 postos de combustíveis administrados por um bando de criminosos, chefiados de dentro da cadeia de segurança máxima de Presidente Venceslau por Wilson Roberto Cuba, o Rabugento, condenado por latrocínio. Em cinco anos, a quadrilha montou postos que, em 2006, movimentaram mais de R$ 6 milhões por mês vendendo gasolina adulterada.

Na quinta-feira, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo cassou a licença e fechou 43 postos de combustível da capital pertencentes ao ex-motorista de caminhão José Francisco Saraiva Filho, o Zé Mistura. Os estabelecimentos estavam registrados em nome de Ortêncio João de Oliveira, um conterrâneo de Pernambuco. Zé Mistura é dono de 88 postos e de uma distribuidora localizada em Paulínia. Já foi flagrado dezenas de vezes vendendo combustível adulterado. Somente um dos seus postos, na zona sul de São Paulo, foi autuado 16 vezes e interditado 4.

As práticas criminosas no comércio de combustíveis causam prejuízos de R$ 2,6 bilhões por ano ao setor de derivados de petróleo. A sonegação de ICMS por postos clandestinos ultrapassa R$ 91 milhões por ano, conforme dados divulgados no seminário Distribuição de combustíveis: pontos cruciais para moralização do setor, realizado em São Paulo. Postos sem bandeira ou que utilizam bandeiras clonadas de grandes redes causam às distribuidoras idôneas perda anual de faturamento de R$ 597 milhões.

A Polícia Civil de São Paulo investiga pelo menos 500 postos em funcionamento e outros 80 em reforma. São estabelecimentos projetados por um mesmo engenheiro - José Carlos Abiad -, apontado como o principal responsável pela instalação de um equipamento que burla a fiscalização. Nesses postos, está instalada uma válvula ligada a dois tanques, um com combustível dentro dos padrões exigidos e outro com produto adulterado. Acionada a distância, a válvula controla a saída de combustível-padrão caso a fiscalização apareça. Para os clientes, libera o produto adulterado.

O engenheiro foi flagrado pela reportagem do Jornal Nacional aconselhando a instalação de tanques clandestinos. Fazendo-se passar por clientes, repórteres da Rede Globo descobriram, ainda, que o responsável pela instalação das válvulas é o ex-presidiário Gilmar Alves Martins. Segundo ele, um posto comporta até quatro válvulas ligadas ao tanque clandestino, que não aparece no projeto do estabelecimento. O ex-presidiário indicou o engenheiro Abiad para projetar o serviço. Para instalar os dispositivos, o custo é de R$ 32 mil - investimento que, segundo Martins, tem retorno em dois dias.

Assim, a fiscalização é burlada; o consumidor, enganado; e o governo, lesado. Na semana passada o prefeito Gilberto Kassab se disse muito preocupado com a situação que pode ¿eventualmente estar chegando perto do caos¿.

Já chegou. Algumas das grandes redes, até hoje classificadas como idôneas, diante da concorrência desleal dos postos clandestinos ou clones, começaram também a vender combustível adulterado, conforme algumas fiscalizações recentes.

O prefeito decidiu formar, juntamente com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), Secretaria Estadual da Fazenda de São Paulo e MPE, uma força-tarefa para combater os esquemas de fraudes nesse setor do comércio. Com o convênio firmado com a ANP, 15 engenheiros do Contru passaram a ter autoridade para fechar os postos onde haja irregularidades, o que era, até então, competência exclusiva da agência.

O caso é de polícia e deve ser tratado com rigor e urgência.