Título: Assessor de Lula sai em defesa de Chávez
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2007, Internacional, p. A8

Diante de mais uma reação destemperada do presidente da Venezuela ao pedido do Senado brasileiro para que reveja a não renovação da concessão para funcionamento da emissora RCTV, o assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, ministro Marco Aurélio Garcia, saiu ontem em defesa de Hugo Chávez.

Na capital indiana, Garcia afirmou que, ao tirar do ar a RCTV, no último minuto do dia 28. 'Chávez não fez nada de ilegal' nem violou os princípios da liberdade de expressão. 'Não julgamos que tenha sido violada nenhuma regra democrática. Andei não poucas vezes pela Venezuela. Em raros países eu vi a imprensa falar com tanta liberdade quanto na Venezuela', disse. 'Constatação: todas as vezes que estive lá, vi a imprensa falar cobras e lagartos (de Chávez)', insistiu, ao relatar que os canais de televisão anunciavam manifestações contra Chávez durante as novelas mais populares, por meio de legendas.

Na quarta-feira, o Senado aprovou uma moção pedindo que o governo venezuelano revisse a decisão, o que levou Chávez, em entrevista a uma emissora de TV, a enviar 'pêsames' ao povo brasileiro por contar com um Congresso que 'repete como um papagaio' as posições dos EUA. Também aconselhou os parlamentares brasileiros a se ocupar 'dos problemas internos'. No dia seguinte, de Londres, Lula revidou: em nota oficial, divulgada pelo Itamaraty, expressou 'repúdio' às declarações de Chávez, qualificadas de 'manifestações que (põem) em questão a independência, a dignidade e os princípios democráticos' das instituições brasileiras. Julio García Montoya, embaixador da Venezuela em Brasília, foi convocado ao Itamaraty para dar explicações sobre as declarações de Chávez.

Chávez voltou à carga no sábado. 'O Congresso do Brasil emitiu um comunicado grosseiro, que me obrigou a respondê-lo. Não aceitamos a ingerência de ninguém em assuntos internos', afirmou, numa manifestação de apoio a seu governo.

Na entrevista concedida em Nova Délhi, onde acompanha Lula em visita à Índia, Garcia teve o cuidado de, ao elogiar o governo Chávez, não confrontar diretamente o discurso e a nota oficial do presidente.

Ao ser abordado sobre a nova reação de Chávez, Lula defendeu que 'o Congresso não foi grosseiro' ao aprovar uma moção de censura contra a fechamento da RCTV. 'A nota do Congresso pede a compreensão, apenas', rebateu Lula, que informou também ter havido uma conversa por telefone entre Chávez e o embaixador do Brasil em Caracas, João Carlos de Souza-Gomes. 'A moção do Senado não foi ofensiva', alinhou-se Garcia, antes de elogiar Chávez.

Garcia admitiu, também, que, nesse episódio, Chávez usou um 'tom inadequado'. Acrescentou que o governo Lula não se interessa em 'esquentar' o episódio. 'Os interesses políticos e econômicos bilaterais e os projetos de integração da América do Sul são importantes demais e justificam a decisão do Brasil de apaziguar a relação com a Venezuela', argumentou.

Mesmo quando confrontado com a versão de que a concessão da RCTV valeria até 2022 e com a situação de domínio absoluto de Chávez sobre as decisões da Justiça venezuelana, o assessor de Lula manteve sua posição.

A nova bateria de declarações de brasileiros e venezuelanos em torno da RCTV foi disparada justamente no dia da abertura da Assembléia-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), na Cidade do Panamá. A assembléia deve esquentar por conta da decisão de Chávez sobre a RCTV, os riscos à democracia venezuelana e de toda a região. Ao ser questionado sobre a posição brasileira nesses possíveis debates, Garcia afirmou que não espera ver nenhum país 'reeditar a OEA das exceções dos anos 60', em clara referência à assembléia de 1962, na qual Cuba foi suspensa da organização por recusar os princípios democráticos - sob clara pressão dos EUA.

FRASE

Marco Aurélio Garcia Assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais

¿Chávez não fez nada de ilegal¿

¿Não julgamos que tenha sido violada nenhuma regra democrática. Andei não poucas vezes pela Venezuela. Em raros países eu vi a imprensa falar com tanta liberdade quanto na Venezuela¿

¿Todas as vezes que estive lá, vi a imprensa falar cobras e lagartos (de Chávez)¿.