Título: Lula descarta terceiro mandato e garante que base terá candidato
Autor: Monteiro, Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/05/2007, Nacional, p. A4

Pressionado a garantir que não aceitará mudanças na legislação eleitoral para se candidatar em 2010 ao Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, em sua primeira entrevista coletiva no segundo mandato, que não brinca com a democracia e acha uma ¿imprudência qualquer mudança permitindo um terceiro mandato¿. ¿Quero fazer meu sucessor¿, afirmou, adiantando que a escolha será feita dentro da ¿base¿ de apoio ao governo. O candidato ¿tirado de um consenso¿ não será necessariamente do PT, esclareceu.

Nas quase duas horas da entrevista, concedida no Planalto, Lula foi enfático ao descartar mais de uma vez a possibilidade de um terceiro mandato. Depois de considerar uma ¿provocação à democracia brasileira¿ a eventual apresentação de projeto para alterar a Constituição, o presidente se disse candidato a terminar o mandato em condições de ser chamado para os palanques por candidatos. ¿Quero estar tão afiado que as pessoas vão pedir: `Vamos lá, Lula, vamos fazer um comiciozinho não sei das quantas. É assim que eu quero terminar meu mandato.¿

À pergunta do Estado sobre a hipótese de voltar a se candidatar em 2014, Lula deu resposta dúbia: ¿Eu não trabalho com a hipótese de voltar à Presidência. Primeiro, eu tenho de cumprir o meu mandato, que está no começo. Então, só cinco minutos de insanidade é que me permitiriam ficar discutindo oito anos para a frente¿.

TUCANOS

O presidente não fechou a porta para negociações políticas com os tucanos. Depois de lembrar que sempre teve ¿uma boa relação com o PSDB¿, afirmou: ¿Vamos ver qual é o comportamento do PSDB nisso tudo. Eu acho que muita coisa vai acontecer no Brasil para melhor. Acho que o PFL (na verdade, o atual DEM) vai deixar de ser tão nervoso, acho que as pessoas vão aprendendo que o povo quer que o País dê certo.¿

Para demonstrar que não afasta a hipótese de conversar com os tucanos, Lula afirmou que mantém ¿relações muito boas com gente do PSDB, como o Serra (governador de São Paulo), o Aécio (governador de Minas) e o (senador) Tasso Jereissati¿. Também lembrou episódio da década passada. ¿Eu não gosto de voltar à história, mas é importante lembrar que, em 1994, se não fosse o Plano Real, o PSDB teria indicado o vice na minha chapa, e não foram poucas as reuniões que nós fizemos para que isso acontecesse. Depois veio o Plano Real, ele foi uma novidade importante para o País, e aí o PSDB teve candidato e ganhou as eleições de mim.¿

CASCA DE BANANA

Depois de reiterar que concluirá o segundo mandato ¿numa condição eminentemente mais favorável¿ do que terminou o primeiro, Lula reconheceu que precisará estar atento. ¿Obviamente, sempre haverá alguém jogando uma casca de banana, jogando uma pedra, mas isso faz parte da política¿, observou. E ironizou: ¿Vou colocar um sapato com travinhas para não escorregar nas cascas de banana que me jogam todo santo dia¿.

O presidente se disse mais ¿calejado¿, porque aprendeu a saber quem é quem na política brasileira. ¿Acho que por isso eu estou mais tranqüilo para fazer as coisas corretas¿, disse, depois de falar de sua disposição de conversar também com os líderes da oposição. ¿Essa é a coisa interessante de quem não está pensando em nova eleição. Estou mais leve, eu posso te dizer que tiraram das minhas costas uns 30 quilos, porque você fica pensando na eleição e as pessoas que estão atrás de você ficam pensando na eleição¿, explicou. ¿Eu quero conversar com todos os partidos.¿

Lula falou da sobrevivência política em meio às investigações dos escândalos, como os casos do mensalão e Waldomiro Diniz. ¿Em nenhum momento eu permiti que qualquer sintoma da crise política adentrasse o Palácio do Planalto ou mexesse particularmente comigo. Quanto mais as coisas aconteciam, mais eu trabalhava.¿

Na entrevista, ele ressaltou que construiu a coalizão com todo o PMDB, e não com metade do partido. Disse que o que está propondo aos partidos é construir uma coalizão, ¿que é diferente de distribuição de cargos¿. E ressaltou: ¿A ocupação dos cargos não pode ser condição sine qua non para que a gente possa montar essa coalizão.¿

O presidente voltou a agradecer ao Congresso pelas votações, e pediu, agora, empenho de seus aliados para a votação da Desvinculação de Receitas da União (DRU) e da CPMF. Para Lula, ¿em sã consciência¿ todo mundo sabe que nenhum governo pode viver sem essas contribuições.

Lula aproveitou ainda para ressaltar a ¿excelente relação¿ que mantém com os governadores, com quem pretende se reunir novamente no mês que vem. E garantiu que considera naturais as reivindicações deles.

Frases:

¿Eu não brinco com democracia. Eu fui contra a reeleição. Sou contra e não serei candidato em 2010. Não é por nada não, é porque a Constituição não permite¿

¿O presidente não governa com as forças que gostaria de governar. Governa com as forças que compõem as organizações políticas e os partidos¿

¿O Estado brasileiro não pode viver sem a CPMF e sem a DRU. Se alguém tirar dinheiro da CPMF, vamos ter de cortar o Orçamento¿

¿Eu posso te dizer que o Brasil não terá apagão e iremos fazer o que temos que fazer neste país para ter energia¿.