Título: Na conversa, contradições e imprecisões ao citar números
Autor: Monteiro, Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/05/2007, Nacional, p. A5

Durante as quase duas horas da entrevista de ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cometeu imprecisões ao citar dados numéricos e, em alguns momentos, fez declarações que contradizem os fatos.

O presidente afirmou, por exemplo, que seu governo faz como as donas de casa, que só gastam o dinheiro de que dispõem. ¿Nós resolvemos tomar a decisão de não fazer experiências acadêmicas, ou seja, nós resolvemos colocar em prática aquilo que uma dona de casa coloca em prática na sua casa¿, afirmou. ¿Ela recebe o seu salário no final do mês, o salário do seu marido e dos filhos, se senta à mesa, contabiliza o que tem que pagar, o que tem que comprar e só gasta exatamente aquilo que for possível gastar, só come exatamente aquilo que for possível comer e assim as pessoas ajustadas conseguem sobreviver dignamente.¿

Ocorre que o País tem registrados seguidos déficits nominais - a conta das receitas menos as despesas, incluindo os gastos com juros. No ano passado, o setor público teve um déficit de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), apesar do superávit primário - como são chamados os recursos que governo federal, Estados, municípios e empresas estatais conseguem economizar após o pagamento de suas despesas, mas sem considerar os gastos com os juros da dívida. Em 2006, esse superávit primário foi de 3,8% do PIB. É como se a dona de casa de Lula conseguisse pagar as contas do mercado, mas ficasse sem fôlego para honrar os juros do cheque especial.

A seguir, o presidente sustentou que o País vive ¿o melhor momento da economia de toda a história da República¿, em sua avaliação até melhor do que no chamado milagre brasileiro, durante o regime militar. ¿De vez em quando eu vejo as pessoas lembrarem do milagre brasileiro, que em 1973 cresceu 14% ao ano, mas a inflação normalmente era acima de 20%¿, afirmou. Na realidade, a inflação daquele ano foi de 15,53%, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Mesmo em anos do milagre com inflação mais alta, como em 1970 e 1971, a elevação geral dos preços não chegou à marca dos 20% citada pelo presidente.

Ao falar sobre juros, o presidente Lula disse que as taxas atuais são as mais baixas dos últimos anos. ¿A cada 45 dias vamos baixando, baixando, sem que haja tensão pré-Copom como existia há algum tempo¿, comemorou. É uma verdade apenas em termos.

No final do ano passado, a taxa Selic estava em 13,25% ao ano - a menor da história em termos nominais. No entanto, ela equivalia na ocasião a 8,7%, se descontada a inflação prevista para 12 meses. Eram os maiores juros do mundo em termos reais, superiores aos de janeiro de 2001, por exemplo.