Título: Nuclearização iraniana pode ter efeito dominó no mundo árabe
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Fonte: O Estado de São Paulo, 24/05/2007, Internacional, p. A16

O interesse de vários países do Oriente Médio em desenvolver programas de energia nuclear vem causando preocupação no Ocidente. Apesar de o interesse pela energia nuclear ter aumentado de forma global, ele é inesperadamente forte no Oriente Médio e está sendo manifestado justamente em meio à pressão da comunidade internacional para que o Irã desmantele seu programa de enriquecimento de urânio.

O Irã - o quarto maior exportador mundial de petróleo - afirma que busca apenas produzir energia para suprir suas necessidades (o país importa 40% de sua gasolina, pois tem poucas refinarias). No entanto, os EUA e outras potências, como Grã-Bretanha, Alemanha e França, suspeitam que Teerã esteja tentando fabricar combustível nuclear para armas atômicas.

Questiona-se por que Estados árabes no Golfo Pérsico, que controlam cerca de 45% das reservas mundiais de petróleo, estariam dispostos a enfrentar os altos custos e os compromissos internacionais requeridos para desenvolver essa forma de energia. Eles alegam que precisam investir em uma energia alternativa para quando o petróleo acabar.

O diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Mohamed ElBaradei, disse recentemente que ¿é um direito natural dos países do Conselho de Cooperação do Golfo - Arábia Saudita, Bahrein, Kuwait, Omã, Catar e Emirados Árabes Unidos - possuir energia nuclear para fins pacíficos¿. Além desses países, Egito, Jordânia, Síria, Iêmen e Turquia também manifestaram interesse em construir reatores nucleares.

Para analistas, provavelmente muitos dos países que estão pedindo orientação da AIEA para iniciar seus programas nucleares realmente querem apenas obter energia, mas alguns Estados árabes desse grupo podem, como temem os EUA, estar em busca de armas atômicas para enfrentar a ameaça de um Irã nuclear.

¿Certamente, o Irã é visto como uma potencial ameaça por alguns dos membros do Conselho de Cooperação do Golfo. Então, a consideração de que alguns países da região poderiam tentar obter armas nucleares é plausível¿, disse ao Estado o especialista em proliferação nuclear Robert L. Gallucci.

O fato de o Irã, um país persa e muçulmano xiita, estar ampliando sua influência na região também é apontado como um dos fatores que estariam levando outros países muçulmanos, em sua maioria sunitas, a buscar a energia nuclear. ¿A divisão entre sunitas e xiitas aumenta a preocupação já existente de uma hegemonia persa¿, disse Gallucci, que já trabalhou em várias agências da ONU e do Departamento de Estado dos EUA e atualmente é reitor da Edmund A. Walsh School of Foreign Service, da Universidade Georgetown.

Nenhum país árabe tem reatores nucleares. Por enquanto, a maior parte desses países apenas pediu orientação da AIEA sobre o que eles precisam para iniciar seus programas nucleares, aparentemente aguardando para saber o resultado da disputa do Irã com o Conselho de Segurança da ONU, que exige o desmantelamento do programa de enriquecimento de urânio iraniano.

¿Há a preocupação de que, se o Irã desenvolver armas nucleares, seja desatado um efeito dominó que faça com que países como Arábia Saudita e Egito também busquem a bomba¿, afirmou ao Estado Steven C. Welsh, especialista em segurança internacional do Centro de Informação para Defesa, de Washington. ¿O interessante é que, apesar das preocupações provocadas pelo arsenal nuclear de Israel, esse fato não parece ter sido tão desestabilizador para os países árabes quanto a questão do Irã. Talvez porque nenhum desses países acreditasse que Israel poderia usar suas armas nucleares ofensivamente ou entregá-las a terroristas¿, acrescentou Welsh.

O presidente americano, George W. Bush, manifestou recentemente o temor de que esses países árabes possam pedir ajuda ao Paquistão (onde a etnia majoritária é a punjabi), o único Estado sunita que tem armas nucleares. No entanto, para Gallucci, ¿isso é improvável, já que foi o Paquistão que forneceu a tecnologia crucial ao Irã¿.

Apesar de a AIEA enviar regularmente inspetores às instalações nucleares do Irã, o governo iraniano conseguiu esconder por cerca de 18 anos seu programa de enriquecimento de urânio. ¿Agora, só podemos esperar que o verdadeiro objetivo dos Estados moderados do Golfo seja preservar o petróleo para exportação e estar na vanguarda da energia da próxima geração¿, disse Welsh. ¿Esperamos que eles se submetam às salvaguardas da AIEA, com a maior transparência possível, e aceitem reatores que são menos sensíveis à proliferação nuclear¿, acrescentou.