Título: Presos de AL ligam Renan e Teotônio
Autor: Tavares, Bruno e Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/06/2007, Nacional, p. A10

O senador Renan Calheiros (PMDB) e o governador Teotônio Vilela Filho (PSDB) firmaram uma parceria política que parecia inabalável. Atingida em cheio pela Operação Navalha, a dobradinha alagoana que começou na eleição ao Senado em 1994 perdeu, pela primeira vez, a força que os unia. Nos últimos dias, viram assessores e indicados sendo presos, suas vidas reviradas do avesso e a revelação de patrimônios escandalosos para o Estado com um dos maiores índices de pobreza do País.

A dobradinha criou um feudo na Secretaria de Infra-Estrutura do Estado. Desde Olavo Calheiros, irmão de Renan e atual deputado federal, até Adeílson Bezerra, indicado pelo clã Calheiros, todos os ocupantes da pasta tinham de ser homens de sua confiança. Cinco dos oito alagoanos presos na Operação Navalha eram ou foram secretários e funcionários da secretaria ou de órgãos ligados a ela. Segundo a Polícia Federal, os acusados se especializaram em ajudar a Construtora Gautama a desviar recursos públicos em Alagoas.

Adeílson foi flagrado pela PF em conversas que revelavam acertos milionários de obras para a empresa de Zuleido Soares Veras. Ele teria recebido R$ 145 mil da Gautama para liberar R$ 3,16 milhões, há dois meses. O dinheiro seria utilizado na Pratagy, um sistema de abastecimento de água para a capital cujas obras se arrastam há décadas.

Pelas escutas da PF, Zuleido chegou a pressionar Teotônio e Renan pela liberação de recursos retidos pela Secretaria de Infra-Estrutura. O contrato para a construção da barragem Duas Bocas/Santa Luzia, no Rio Pratagy, era de R$ 77 milhões e, por meio de medições fraudulentas, a Gautama reclamava R$ 15 milhões. No local, há uma obra de terraplanagem incompleta, máquinas abandonadas, sem vigilância, tubulações largadas e nenhum benefício para a população até hoje. Ou seja, a empreiteira cobrava por uma obra paralisada.

O empresário baiano prosperou em Alagoas a partir da ascensão do clã Calheiros. Zuleido era um homem de visão. Na eleição de 1990, quando o então presidente Fernando Collor e seu tesoureiro, PC Farias, boicotaram a campanha de Renan ao governo estadual, em favor de Geraldo Bulhões, todos os empresários acataram com medo de contrariar o então presidente da República. Só Zuleido não deu as costas a Renan, que amargou um ostracismo político ao romper com Collor. Foi depois de 1994, com a vitória da dobradinha Renan e Teotônio, que o dono da Gautama começou a sorrir à toa. E o patrimônio dos Calheiros ganhou musculatura invejável (leia abaixo).

Primeiro a Gautama se associou a empresas já estabelecidas e com contratos no governo estadual. Depois passou a ganhar novos contratos. E daí virou especialista em se habilitar para obras milionárias, receber o dinheiro com medições fraudulentas e nunca terminá-las ou entregá-las com preços finais superfaturados. Nos últimos oito anos, a empreiteira assinou contratos de quase R$ 500 milhões só em Alagoas.

Duas não-obras saltam aos olhos, a barragem de Pratagy e a macrodrenagem no Tabuleiro dos Martins. Vitais para o abastecimento de água da população alagoana, transformaram-se em obras folclóricas. Por mais de uma ocasião, o Tribunal de Contas da União verificou que a Gautama recebia dinheiro porque dizia ter construído partes dela, mas nada havia sido feito. Em questão de meses, a empresa embolsava milhões com contratos assinados um após o outro, os aditamentos, sempre com a mesma finalidade.