Título: Tempo vira e teles já começam a pedir ajuda
Autor: Cruz, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/06/2007, Economia, p. B16

As telecomunicações não foram incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Até bem pouco tempo, eram vistas como o único setor de infra-estrutura que não atravessava problemas. O diagnóstico hoje, entretanto, é que começam a entrar em crise. A telefonia fixa está estagnada desde 2002 e o crescimento do celular desacelera. Em 2006, o investimento do setor caiu 14,3%, para R$ 12,6 bilhões, mesmo com projetos expressivos, como o R$ 1,1 bilhão que a Vivo destinou à sua rede GSM. A tendência é que, este ano, o montante seja ainda menor.

A banda larga cresce, mas é insuficiente para sustentar o mercado. A saída encontrada pelas empresas foi tentar sensibilizar o governo, que, com seu poder de compra, pode ajudar o setor a retomar a expansão. 'Precisamos que o Estado tenha políticas públicas claras, com serviços universais, de qualidade e com transparência', afirmou na sexta-feira Cesar Rômulo Silveira Neto, superintendente executivo da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil), durante o 51º Painel Telebrasil, na Costa do Sauípe (BA).

Ele sugeriu que o governo federal destine anualmente R$ 6 bilhões do orçamento para universalização da banda larga e do governo eletrônico. 'Não é quase nada perto dos R$ 150 bilhões usados para pagar juros da dívida.' A idéia seria levar eletronicamente saúde, educação e segurança para municípios mais pobres.

FANTASMA ESTATAL

Ao mesmo tempo em que pede ajuda ao governo, o setor teme fortalecer uma visão estatista e centralizadora da atividade. Existem grupos no governo que defendem transformar a Eletronet, empresa de comunicações ópticas que usa as linhas de transmissão da Eletrobrás e que foi à falência, numa nova estatal de telecomunicações.

'O Estado deve funcionar como organizador da demanda', disse Roberto Pinto Martins, secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações. O governo federal tem 16 projetos diferentes de inclusão digital. 'Eles vão da Casa Brasil ao Heliosat', disse o deputado Walter Pinheiro (PT-BA), referindo-se ao Governo Eletrônico Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac), programa de internet via satélite do Ministério das Comunicações.

Há cerca de um mês, Cezar Alvarez, assessor especial do presidente da República, assumiu a coordenação dos Programas de Inclusão Digital do governo. Antes, eles estavam sob a responsabilidade do ministro das Comunicações, Hélio Costa. Alvarez liderou o programa Computador para Todos, a política de tecnologia de maior sucesso do governo Lula.

Um dos pontos-chave do Computador para Todos foi a desoneração fiscal. O governo cortou PIS e Cofins de computadores até R$ 4 mil. As operadoras também querem cortes de impostos, já que a carga tributária chega a 41%. O Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) arrecadou cerca de R$ 5 bilhões, e nunca foi aplicado no setor. Por ano, são mais R$ 600 milhões para os cofres públicos.

O Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel) responde por cerca de R$ 2,1 bilhões ao ano. Ele serviria, entre outras coisas, para financiar a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), mas acaba contribuindo para o superávit primário. 'A agência precisaria de R$ 500 milhões a R$ 600 milhões por ano, para cumprir suas obrigações legais, mas só consegue R$ 200 milhões', disse Silveira Neto, da Telebrasil.

INFRA-ESTRUTURA

Ano passado, havia 5,6 milhões de assinantes de internet rápida no País. Somente um terço dos municípios é coberto pelo serviço. 'Países como o Chile e a Coréia subsidiaram a banda larga', apontou Raul Del Fiol, presidente da Trópico, fabricante brasileira de equipamentos de telecomunicações. 'A banda larga é a infra-estrutura da sociedade do conhecimento, como as estradas e a eletricidade foram a infra-estrutura da sociedade industrial.'

O bom desempenho do setor acabou contribuindo para que ele fosse esquecido no primeiro mandato do governo Lula. Mas o modelo de privatização do Sistema Telebrás, que aconteceu em 1998, se exauriu. As pessoas com renda para ter um telefone já contrataram o serviço.

Na ausência de políticas públicas efetivas, o setor pára de crescer. Para complicar, existe um conflito com radiodifusores que bloqueia a atualização da regulamentação e o lançamento de alguns serviços avançados. 'A aparente briga não beneficia ninguém', disse Silveira Neto, da Telebrasil. 'Os conflitos são muito preocupantes, pois travam investimentos', destacou o deputado Jorge Bittar (PT-RJ). 'Meu sonho é uma frente única entre a Telebrasil e a Abert', afirmou Del Fiol, da Trópico, referindo-se à Associação Brasileira de Rádio e Televisão.