Título: Em meio a protestos, eleito toma posse hoje na Nigéria
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2007, Internacional, p. A14

A Nigéria tenta completar hoje sua primeira transição de poder entre dois governos civis desde sua independência em 1960. O presidente eleito Umaru Yar'Adua toma posse do país mais populoso da África, após oito anos de governo de Olusegun Obasanjo. A transição é um teste para o sexto maior produtor mundial de petróleo diante das acusações de fraude na eleição de marco. Na ONU, o gabinete do secretário-geral Ban Ki-moon acompanha o processo de perto, temendo que uma desestabilização do país abra mais uma crise no já tumultuado Oeste da África.

Na capital Abuja, o clima de aparente calma contrasta com a tensão no sul do país e as ameaças feitas pela grupos de oposição que promete protestar durante a posse. Os grupos opositores queixam-se das irregularidades nas eleições e iniciaram uma série de ações na Justiça contra a posse. Nenhuma foi julgada.

Tanto Yar'Adua como Obasanjo são do Partido Democrático do Povo - que controla não apenas o governo federal como obteve vitórias em vários Estados. Alguns dos ministros de Obasanjo permanecerão no gabinete do novo presidente.

Não por acaso, uma comunicação interna da embaixada americana na Nigéria obtida pelo Estado alerta que esses protestos podem se tornar violentos. O governo britânico também pediu que todos os seus cidadãos evitem ir aos Estados do sul da Nigéria. No fim de semana, trabalhadores estrangeiros foram seqüestrados em plataformas de petróleo no Delta do Rio Níger.

O governo anunciou a mobilização de 200 mil soldados em todo o país para reprimir protestos. Só na capital, 50 mil homens vão trabalhar para garantir a posse do novo presidente.

Embora a comissão eleitoral tenha declarado a vitória de Yar'Adua, observadores internacionais acusaram o processo eleitoral de fraudulento. O Parlamento Europeu chegou a emitir uma resolução pedindo que os governos europeus não reconheçam Yar'Adua e o congelamento da ajuda dada por Bruxelas até que novas eleições sejam marcadas.

Alguns partidos políticos na Europa pediram ao governo alemão que cancelasse o convite feito aos nigerianos para participar da reunião do G-8, em Berlim na próxima semana.

Ontem, a oposição deu início a uma greve. O governo respondeu com a criação de feriados, supostamente para festejar o Dia da Democracia e, assim, minimizar os efeitos do protesto. Para muitos em Abuja, não há por que protestar, uma vez que todos sabem que o resultado não será modificado.

A oposicionista Conferência de Partidos Políticos da Nigéria também pediu a seus membros que participem do protesto. 'As eleições devem ser canceladas', afirmou o grupo num comunicado, no qual pedia a instalação de um governo interino.

Mas na avaliação do empresário nigeriano Bawa Garba, a oposição deve se acalmar quando o novo governo der cargos ou postos em embaixadas no exterior para alguns dos líderes do protesto. 'Yar'Adua já se mostrou um bom administrador quando foi governador de Katsina e até deixou muito dinheiro em caixa', disse o empresário, que montou uma rede de transporte público com ônibus brasileiros. Para o jornal Financial Standard, um governo interino poderia ser um convite a mais um golpe militar.

Apesar das denúncias, alguns analistas estimam que o perfil do novo presidente respeita os critérios que a Nigéria precisa para uma transição sem um novo banho de sangue ou golpe de estado. Depois do governo do cristão iorubá Obasanjo, será a vez de um muçulmano do norte liderar o país. As duas regiões e as duas religiões vivem em constante estado de alerta.