Título: Falta esclarecer pagamentos de 2004 e 2005
Autor: Chrispim, Denise e Samarco, Christiane
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2007, Nacional, p. A4

Ao se dirigir à Nação, anteontem, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) teceu a sua defesa usando 2.388 palavras, bem alinhavadas, pelas quais se deu ao trabalho de ¿rasgar a alma¿, ¿confessar pecados¿ e ¿provar que se trata de uma questão pessoal¿. Foi um discurso duro, que fala em ¿calvário¿, ¿ignomínia¿ e ¿infâmia¿, cita um jurista, um filósofo, um senador romano e Ruy Barbosa. Ao destrinçar o seu pronunciamento no Senado, porém, não é possível esclarecer um ponto central do caso: a origem dos R$ 8 mil mensais pagos à jornalista Mônica Veloso, de janeiro de 2004 a novembro de 2005.

O presidente do Senado relatou que efetuou dois pagamentos em cheque, nos meses de dezembro de 2005 - quando reconheceu a paternidade da filha - e em janeiro de 2006. A partir dessa data, informou, começou a ser descontada uma pensão de R$ 3 mil nos seus subsídios de senador, depois reajustada para R$ 4 mil. É o que ele chamou de ¿prova irrefutável¿ para contestar as acusações. Mas há aí uma brecha a ser esclarecida. Renan admite que, antes disso, pagava R$ 8 mil à mãe da criança, mas não citou de onde provinham esses recursos.

De acordo com a revista Veja, Mônica recebia um envelope com dinheiro, todos os meses, para a pensão da filha e o aluguel de um apartamento. Ela iria pessoalmente ao escritório da empreiteira Mendes Júnior em Brasília, onde o funcionário Cláudio Gontijo, lobista, deixaria o pagamento à sua espera.

Daí se desdobra outro ponto não esclarecido. Renan admitiu que pagava o aluguel, mas não informou quanto, nem de onde vinham os recursos. Apenas assegurou que era dinheiro seu.

Há pontos de ruído nas versões. A jornalista, por meio do advogado, disse que não conhecia Gontijo, refutando a fala de Renan. Além disso, reiterou que os pagamentos eram em dinheiro e que a Veja acertou em tudo, menos no valor: a pensão era de R$ 8 mil e o aluguel, de R$ 4 mil. A revista informou que eram R$ 12 mil e R$ 4,5 mil.

Mônica diz, ainda, que nunca houve um fundo de R$ 100 mil para a educação da filha, como afirmou Renan. Segundo ela, eram pensões atrasadas.

BRECHAS

Mônica se manifestou após saber que Renan decidira ¿abrir a intimidade¿. No discurso, ele citou nove vezes a palavra família. Ainda falou em ¿pecado¿, ¿religião¿, ¿justiça¿. Alertou para o risco de se instaurar no País o clima tenso de um período romano em que senadores eram chamados de ¿adúlteros, assassinos, sedutores, libertinos, ladrões¿. Por fim, acusou um ¿jornaleco¿ e denunciou ¿a mania de julgar antes de ouvir a defesa dos acusados¿. Mas deixou várias brechas ao se explicar.

Na defesa ante os senadores, feita antes de um eventual questionamento no Conselho de Ética do Senado ou até de uma convocação por CPI, Renan não reagiu à informação de que Gontijo deixaria à sua disposição o flat número 2.018 no hotel Blue Tree, em Brasília.

O discurso ignorou as denúncias de doações de campanha de Gontijo para Renan, parentes e um afilhado. Ele ainda manteve a posição de não comentar questões relativas a seu irmão, o deputado Olavo Calheiros, citado em conversas grampeadas na Operação Navalha.