Título: Chávez tira hoje do ar TV opositora
Autor: Costas, Ruth
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/05/2007, Internacional, p. A20
Às 23h59 minutos de hoje o governo venezuelano promete tirar do ar a rede de televisão de maior audiência do país. Com uma história de 54 anos e cerca de 40% da audiência, a Rádio Caracas Televisão (RCTV) é a única emissora aberta de alcance nacional que ainda fazia oposição ao presidente Hugo Chávez, mas em dezembro o líder venezuelano anunciou que não iria renovar a concessão que permite à TV transmitir pelo canal 2. Segundo o governo, a medida faz parte de um projeto para 'socializar o espectro radioelétrico'. Na sexta-feira, a Suprema Corte venezuelana determinou que todo o equipamento e a infra-estrutura da RCTV sejam repassados à emissora estatal que a substituirá.
A decisão de silenciar a RCTV motivou críticas de organizações e países de diversas partes do mundo e, ao longo da semana passada, levou milhares de pessoas às ruas para protestar. Muitos não se conformam também porque não poderão continuar vendo seus programas favoritos - como a popular novela Minha Prima Ciela e o humorístico Rádio Rochela, que ficou 48 anos n ar.
'O fechamento da RCTV não será o fim da liberdade de expressão no país, mas limitará consideravelmente o espaço para o debate', disse ao Estado Teodoro Petkoff, diretor do jornal Tal Cual e uma das figuras mais destacadas da oposição.
As justificativas para fechar a TV foram muitas. Primeiro, Chávez acusou os diretores da RCTV (em especial o executivo Marcel Granier) de ter protagonismo no golpe que lhe afastou do poder por 48 horas em 2002 - fato que, a bem da verdade, é admitido até por setores da oposição. Nesse aspecto, o que provocou críticas da comunidade internacional foi que a alegada participação no golpe deveria ter sido esclarecida na Justiça, não com um canetaço para fechar a TV. O argumento seria a prova de que o motivo da decisão foi basicamente político.
Em seguida, o governo passou a acusar a emissora de evasão fiscal e, por fim, aderiu aos argumentos de cunho moralista - de que sua programação 'deturpa' a mente dos venezuelanos com pornografia, violência e consumismo. Esse problema, diz o ministro de Telecomunicações, Jesse Chacón, será resolvido com a substituição da RCTV pela Televisão Venezuelana Social (Teves), uma emissora de 'serviço público' supostamente moldada 'aos gostos e necessidades verdadeiros' dos venezuelanos, que entrará no ar na primeira hora de segunda-feira.
Chávez diz que o novo veículo será independente, mas 100% do seu capital será aportado pelo Estado e 5 dos 7 integrantes de seu conselho diretor serão apontados pelo governo. Segundo Chacón, a nova emissora terá um leque de programas variados, de notícias a novelas. 'Mas serão novelas históricas, que discutam e ajudem a resolver os problemas da sociedade venezuelana', explicou.
A programação da RCTV é majoritariamente composta por humorísticos de gosto duvidoso, programas de auditórios, desenhos infantis, novelas latinas e séries americanas. Os noticiários e programas de opinião - o que na Venezuela é praticamente a mesma coisa - ficam limitados a dois horários: meio-dia e 23h30, quando de fato carregam nas críticas ao governo.
OUTROS CANAIS
Além dessa emissora, se mantém na oposição o canal Globovisión, especializado em notícias, mas com alcance de sinal limitado à capital e arredores ( na noite de sexta-feira, vândalos pró-governo picharam a fachada da emissora). A rede Venevisión, do magnata Gustavo Cisneros (que também é dono da Directv), no passado também foi acusada de golpista pelo presidente. Mas desde 2005 vem moderando suas críticas juntamente com a Televen, do grupo Camero. O quinto canal da televisão aberta é a Venezuelana de Televisão, a emissora pública que o governo utiliza para atacar a oposição e difundir a propaganda de seus programas sociais.
Chacón nega que a proposta da nova emissora seja parecida e lembra que durante o golpe de 2002, liderado por empresários e militares, os canais da oposição exibiram desenhos animados e filmes enquanto multidões de partidários de Chávez se mobilizavam para o contra-ataque.