Título: Luz verde para empréstimos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/06/2007, Notas e Informações, p. A3

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, deu luz verde para o governo de São Paulo tomar emprestados mais R$ 4 bilhões, dinheiro necessário para investimentos em transporte, principalmente de passageiros. Obtido esse financiamento, o governo paulista poderá aplicar até R$ 7 bilhões na expansão do metrô, na recuperação de estradas vicinais e na modernização dos serviços de trens metropolitanos. Aquele montante será alcançado com a contrapartida obrigatória de até R$ 3 bilhões de recursos próprios. O novo endividamento será submetido ao Senado, mas não deverá haver dificuldades para a aprovação, segundo o ministro. Com essa decisão, São Paulo ganha um bom reforço financeiro para investir em obras e serviços extremamente necessários ao bem-estar da população e à economia do Estado.

Para o governador José Serra, a campanha para ampliar a capacidade de investimento do Estado não terminou. Falta, segundo ele, acrescentar R$ 2,7 bilhões ao limite de endividamento do Tesouro paulista. O governo de São Paulo e o Ministério da Fazenda divergem quanto ao critério do cálculo. O ministro Mantega comentou a divergência.

Segundo ele, o critério correto é baseado na Lei 9.496, de 1997, relativa ao refinanciamento dos débitos de Estados pelo Tesouro Nacional. Essa lei estabeleceu um roteiro de ajuste para as contas estaduais. O governo de São Paulo toma como referência os padrões fixados a partir da Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000. Com esses parâmetros, o Tesouro de São Paulo teria direito a um endividamento maior que o admitido, agora, pelo Ministério da Fazenda.

Seja qual for o padrão, as projeções do governo paulista apontam para uma contínua redução dos índices de endividamento do Estado até o fim do prazo de refinanciamento negociado com o Tesouro Nacional. Os técnicos da Fazenda federal conhecem esses cálculos e o ministro Mantega, ao explicar por que deu luz verde para a contratação de mais R$ 4 bilhões de empréstimos, mencionou o bom desempenho financeiro do Estado de São Paulo.

A discussão pode estender-se e os dois lados terão argumentos consideráveis para sustentar seus pontos de vista. Mas o dado político mais importante é o pano de fundo do próprio debate. Para o ministro da Fazenda, assim como para as autoridades paulistas, não se pode mais falar sobre finanças públicas sem uma referência a padrões de responsabilidade fiscal.

Esse é um dado novo na política brasileira. É quase uma revolução. A mudança começou nos anos 90 e ainda não foi concluída, mas o contraste com as opiniões dominantes no passado recente é notável. Não há muito tempo, a maioria dos governantes agia como se pudesse dispor sem restrição do dinheiro público e tomar empréstimos sem pensar no futuro. Atuavam como se os compromissos do Tesouro - estadual, federal ou municipal - virassem fumaça no final do mandato. Ou como se nenhum governante fosse responsável pela herança deixada ao sucessor. O acúmulo de precatórios - dívidas amontoadas durante décadas - foi uma das conseqüências dessa irresponsabilidade. A quebra da maior parte dos bancos estaduais, nos anos 90, foi outro resultado desse comportamento.

Mas nem todos os políticos mudaram. Para alguns, ainda influentes, o governo pode gastar sem outra consideração além do interesse político de cada momento. É preciso, portanto, continuar batalhando para converter a responsabilidade fiscal numa atitude rotineira e arraigada nos costumes públicos.

Daí a necessária cautela na reavaliação dos limites de endividamento. O ministro da Fazenda promete examinar cada reivindicação separadamente. É um bom princípio. Também é importante deixar clara a responsabilidade de cada um: o Tesouro Nacional não poderá socorrer os endividados, se agirem de forma imprudente.

A revisão dos limites envolverá riscos. O perigo será ainda maior, se o governo federal cair na tentação de trocar bondades fiscais por apoio político de governadores e prefeitos. A responsabilidade financeira, tema complexo e árido, tem pouco espaço no debate eleitoral. Políticos propensos à gastança ainda são capazes de seduzir grandes massas de eleitores. As leis fiscais são portanto um freio indispensável. Afrouxá-las seria desastroso.