Título: Líder diz que arrozeiros ficam na Serra do Sol
Autor: Arruda, Roldão
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/06/2007, Nacional, p. A12
Os impasses em torno da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, vão continuar - apesar da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que derrubou na segunda-feira a liminar que garantia a permanência de um grupo produtores de arroz naquela área. Ontem, enquanto lideranças indígenas comemoravam a decisão do STF como uma vitória, o advogado dos arrozeiros, Luiz Valdemar Albrecht, preparava-se para novo round jurídico. ¿Os ministros da corte julgaram apenas que o caminho para se resolver a questão não é a do mandado de segurança¿, disse ele. ¿O mérito ainda não foi julgado e vamos continuar brigando, pelas vias ordinárias.¿
Por outro lado, o líder dos arrozeiros, Paulo César Quartiero, que ontem visitou parlamentares da bancada ruralista, em Brasília, em busca de apoio para sua causa, deixou claro que os produtores não pretendem deixar a área. Sobre a Fundação Nacional do Índio (Funai), que em abril notificou os fazendeiros para que deixem a Raposa Serra do Sol, Quartiero disse: ¿Sabemos que querem nos botar para fora, mas não podem fazer isso antes de esgotarem todos os trâmites legais.¿
Daqui para a frente, os arrozeiros pretendem brigar em duas frentes, segundo o advogado. Em primeiro lugar vão continuar tentando abater o decreto presidencial que, em abril de 2005, entregou definitivamente a terra aos indígenas. ¿Os laudos nos quais a decisão presidencial se baseou são falsos¿, afirma Albrecht. ¿Podemos provar que não existia ocupação indígena tradicional nas terras onde estão instalados os arrozeiros.¿
A segunda frente, no caso de falhar a primeira, é a da indenização: ¿Os arrozeiros já foram reconhecidos como detentores de posse de boa fé. E nesses casos o Código Civil prevê indenização prévia e justa, em dinheiro. Os produtores podem reter a posse enquanto não forem indenizados.¿
A Funai já disse que pretende indenizar os fazendeiros, em dinheiro ou com terras. Mas essa discussão pode render mais um longo capítulo na história da demarcação.
Os arrozeiros querem ser pagos pelo que chamam de complexo agroindustrial - o que envolve as lavouras, com todas as benfeitorias e equipamentos, as máquinas de beneficiamento de arroz que mantêm em Boa Vista, capital do Estado, e também as marcas com que comercializam o produto na região norte do País.
TENSÃO
Entre as lideranças indígenas, a torcida é para que a Funai comece logo a retirada dos arrozeiros. ¿O governo já ofereceu terras em outros lugares¿, diz Dionito José de Souza, coordenador geral do Conselho Indígena de Roraima. ¿Está na hora de iniciar a retirada, sem violência, de acordo com as leis e as decisões da Justiça, pondo fim a um processo que se arrasta há quase trinta anos.¿
Segundo o coordenador, o nível de tensão na área ainda é alto. Ele disse ontem ao Estado que Quartiero, o líder dos arrozeiros, percorre até hoje as comunidades indígenas, ameaçando suas lideranças ou tentando convencê-las a desistir da idéia da extensão da reserva às áreas com arroz. ¿Já dissemos que ele não pode circular dessa maneira pela terra dos índios, mas ele responde que a terra é da União¿, disse Souza.
Quartiero já foi prefeito de Pacaraima - município situado na fronteira do Brasil com Venezuela. Cassado em fevereiro, por abuso de poder econômico nas eleições, dedica-se agora às suas duas fazendas, onde cria gado e planta arroz, e à campanha contra a demarcação.
Sua principal reivindicação é que o governo deixe fora da reserva uma área de aproximadamente 190 mil hectares, onde ficam as fazendas de arroz: ¿Isso é uma gorjeta diante do total da área para os índios, de 1,7 milhão de hectares.¿
Para Souza, do conselho indígena, não há mais nada a negociar. ¿Aqui vivem 18.751 índios. Quando os não-índios saírem e a terra for liberada, eles vão se transformar, enfim, em cidadãos brasileiros.¿