Título: Universidade sitiada?
Autor: Petta, Gustavo
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/06/2007, Vida&, p. A16
O debate sobre a universidade pública está na ordem do dia. A ocupação da reitoria da Universidade de São Paulo (USP), a maior do País, chamou a atenção de toda a sociedade para a crise dessas instituições. Crise atribuída aos estudantes, mas que é gerada de fato pelo Palácio dos Bandeirantes, quando apostou na passividade de muitos dirigentes, professores e funcionários para realizar a sua política de maneira tão vertical.
Coube ao movimento estudantil, como na maioria das vezes, iniciar a confrontação em defesa da educação pública. O movimento na USP e nas demais instituições não acontece sobre um vazio, por capricho ideológico ou voluntarismo juvenil. O fato é que a educação do Estado e do Brasil vivencia uma crise aguda. E os decretos só vieram a reforçar esse cenário.
É na década passada que a crise se gesta. As políticas neoliberais chegaram à universidade sob a forma de corte de verbas, carência estrutural, reinado dos índices de produtividade, desprezo pela ciência básica e hipervalorização da relação com o ¿mercado¿. Esses fatores deformaram a idéia de universidade e criaram cursos de 1ª, 2ª e 3ª categorias, além de implodir o tripé ensino, pesquisa e extensão. Dessa forma, a busca da autonomia administrativo-financeira e a democratização das instituições, concebidas na transição do regime militar para a nova república, não tiveram ambiente possível para se consolidarem.
E, agora, a antiga conquista do Estado de São Paulo - autonomia financeira para as universidades - sofre um processo de ataques que mina as suas bases e, nesse momento, a coloca em risco. O governador José Serra promove duro golpe nas instituições paulistas. Ao promulgar os decretos de janeiro e intervir no conselho de reitores (Cruesp), com a nomeação de José Pinotti (o novo Secretário de Ensino Superior) para presidente, Serra feriu a autonomia administrava e financeira. Mesmo com recuos, ao devolver a presidência do conselho aos reitores e atenuar os decretos em uma revisão, ficou clara a intenção de enquadrar as universidades.
Em São Paulo, se a situação é essa, nas instituições federais de ensino também encontramos problemas. Durante a gestão Paulo Renato ocorreu um estrangulamento financeiro brutal, resultando em casos lamentáveis como o da UFRJ, que ficou sem dinheiro para pagar até a conta de luz. No governo de Lula, temos acompanhado um aumento nos investimentos, tanto em verba de custeio como na contratação de pessoal. Mas sabemos que os valores ainda são insuficientes para corrigir a distorção gerada nos governos passados. Para se ter uma dimensão do problema: o orçamento da USP, por uma vitória histórica, acabou sendo vinculado à arrecadação do ICMS do Estado, resultando em um orçamento em 2006 de aproximadamente R$ 2 bilhões. Já todas as 55 universidades federais juntas receberam valor aproximado de R$ 7,5 bilhões em 2006. Imaginem a situação das federais com esse diminuto orçamento.
Por isso, a União Nacional dos Estudantes (UNE) abriu nesta semana uma jornada de mobilizações nas Instituições Federais de Ensino Superior do País.
Defendemos: 1) a criação do Plano Nacional de Assistência Estudantil, com rubrica orçamentária específica que contemple a construção e ampliação das condições de permanência dos alunos; 2) a garantia de autonomia administrativa e de gestão financeira para as instituições, além da democratização da universidade em todos os âmbitos; 3) a derrubada dos vetos ao Plano Nacional de Educação, garantindo o investimento de 7% do PIB destinado à educação.
A universidade está sitiada, mas não é pelos estudantes. O que cerca a universidade são os interesses escusos de uma política de desmonte da instituição pública e as pressões do ¿mercado¿. Nós, estudantes, estamos é do lado de dentro, defendendo uma vez mais a universidade pública neste País.