Título: Loteamento do Banco do Brasil
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/06/2007, Notas e Informações, p. A3

Não é justo acusar o presidente Lula de ter inventado o sistema de dividir para governar. Afinal de contas o lema adotado por Maquiavel já havia sido praticado por outros governantes, tais como Luis XI e Catarina de Medicis. A inovação presidencial, se ocorre, consistiria apenas na motivação desse fatiamento dos nichos do Poder. Se na antiguidade serviu para enfraquecer potenciais concorrentes ou adversários, na Era Lula serve para ampliar a base de apoio do governo.

Não resta dúvida de que o aumento substancial de cargos na administração federal, dos ministeriais, das Secretarias com status ministerial aos escalões inferiores de governo, tem sido fundamental para a manutenção do grande sistema multipartidário de alianças montado pelo presidente Lula em seu segundo mandato. Aí há uma diferença em relação ao primeiro, pois nos quatro anos iniciais prevaleceu o chamado aparelhamento, que era o preenchimento dos postos administrativos (fossem técnicos, políticos ou mais dificilmente qualificáveis) com quadros militantes do PT, especialmente os que a esse atributo seletivo agregavam a condição de velhos companheiros das lutas político-sindicais.

Já no segundo mandato presidencial, com a montagem da chamada coalizão - em grande parte resultante da necessidade de superar, pela ampliação do apoio multipartidário, o desgaste causado ao PT por toda uma enxurrada de escândalos -, houve uma mudança, digamos, da fisiologia do poder central, a ponto de em muitos Ministérios passar a vigorar o sistema de preenchimento tipo ¿porteira fechada¿, vale dizer, um partido responsável por todos os escalões de seu lote de governo. É aí que se insere a divisão ¿multiplicativa¿ da administração, por uma espécie de cissiparidade ou esquizogênese, com células setoriais se bipartindo e gerando novos empregos para companheiros de coalizão. É o que ocorre, por exemplo, no Banco do Brasil (BB) e está prestes a ocorrer na Caixa Econômica Federal.

Apesar de ter prometido solenemente, em sua campanha à reeleição, não retalhar o comando do Banco do Brasil para atender a interesses de aliados políticos, o presidente Lula descumpre (solenemente) a promessa, quase dez meses depois de dizer que não aceitava nomear nem um faxineiro para o banco, orientando o Conselho de Administração do BB a propor à Assembléia de Acionistas, ainda este mês, a divisão da vice-presidência de Governo e Agronegócios em duas unidades, tendo em vista ¿acomodar¿ o ex-senador Maguito Vilela, do PMDB, e o ex-ministro da Agricultura Luiz Carlos Guedes Pinto, ligado ao PT.

Como nos critérios da distribuição de cargos há sempre um componente de consolação eleitoral, o candidato derrotado ao governo de Goiás nas eleições de 2006 (apesar de todo o entusiasmo com que abraçou o lulismo) mereceu o justo reconhecimento, expresso na oferta de gerenciamento de R$ 187 bilhões anuais de tributos federais, estaduais e municipais, da conta de oito Estados que não contam com bancos próprios (a saber: Mato Grosso do Sul, Paraná, Tocantins, Rondônia, Roraima, Acre, Amapá e Rio Grande do Norte), além da BB Previdência, subsidiária que cuida de um montante de R$ 1,2 bilhão, de 48 mil funcionários de empresas privadas. É claro que esse cargo significa, para Maguito Vilela, um grande cacife político-eleitoral na negociação com governadores e prefeitos.

Já Guedes Pinto, que ficará na vice-presidência de Agronegócio do BB, vai gerenciar o crédito agrícola, que chega a um total de R$ 50 bilhões por ano. Parece estar importando pouco, para o presidente Lula, o fato de muitos estranharem a indicação para o cargo de alguém com tanta afinidade com o Movimento dos Sem-Terra (MST) e com grande simpatia pela agricultura familiar. Também na cúpula da Caixa Econômica Federal haverá a distribuição de crachás de dirigentes a dois ex-deputados peemedebistas - Moacir Franco e Paes de Andrade - a partir do critério da consolação, para carreiras políticas em fase outonal. E é assim que Lula cumpre a sua promessa de candidato.