Título: Um show de eficiência do MST
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/06/2007, Notas e Informações, p. A3

É verdade que o Movimento dos Sem-Terra (MST) já deu tantas demonstrações de excepcional capacidade de organização logística - nas ações coordenadas de invasões e depredações simultâneas que tem empreendido em todos os cantos do País, especialmente nas operações do ¿Abril Vermelho¿ - que não era de surpreender a eficiência com que montou uma verdadeira cidade de lona nas proximidades do Palácio do Planalto, para realizar seu 5º congresso nacional. Mesmo assim, o grau de organização estrutural e a eficiência dos serviços de intendência desse movimento são de causar inveja a qualquer instituição militar - especialmente em se tratando de uma entidade ilegal, porque não registrada, não prestante nem obediente ao ordenamento jurídico nacional.

Os dados são impressionantes. Duas mil pessoas se incumbiram de montar, em uma semana, barracas transformadas em grandes dormitórios, cozinhas e refeitórios para 18 mil participantes. São 140 cozinhas que vão preparar cerca de 30 toneladas diárias de alimentos, durante cinco dias. Os produtos vieram dos assentamentos - como a carne seca trazida pelas comitivas nordestinas -, mas o movimento também contou, fora a ajuda do governo federal e de ONGs do exterior que recebe rotineiramente, com apoio oficial local.

Além de ceder o Ginásio de Esportes Nilson Nelson para os debates, palestras e atividade internas, o governo do Distrito Federal disponibilizou 50 caminhões-pipa, 20 caixas d¿água de mil litros para abastecer o acampamento e 200 banheiros químicos. E inteiramente disponível para os militantes emessetistas ficaram 31 mil metros quadrados (equivalentes a mais de 5 gramados de futebol) em áreas de estacionamento e no entorno do estádio Mané Garrincha, perto da Esplanada dos Ministérios, onde se instalaram os balcões de lona e as barracas individuais.

Mas tem mais, nessa organização que mostra sua fantástica opulência, de fazer inveja aos partidos políticos brasileiros: além da montagem de dormitórios, cozinhas e refeitórios, foi montada uma escola para as 1.500 crianças com até 11 anos que acompanham os pais militantes. Delas se incumbem nada menos do que 500 professores, todos do MST.

Essa organização está dividida em ¿brigadas¿. A brigada de teatro conta com 35 grupos que apresentarão espetáculos nos intervalos dos debates.

Se já não fosse tão visível pelas dimensões cada vez maiores de todas as suas operações pelas diferentes regiões do País, o crescimento do número de participantes em cada novo congresso nacional do MST dá boa medida de sua força: ao primeiro congresso, realizado em 1985, compareceram 1.500 delegados; ao segundo, em 1990, foram 4 mil; ao terceiro, em 1995, 6 mil; ao quarto, em 2000, 12 mil; e neste, agora, 18 mil. Mas há outra inequívoca demonstração de força desse movimento. Trata-se da frustrada intenção do presidente de comparecer ao conclave. A ¿visita¿ presidencial foi, simplesmente, ¿vetada¿ pelos líderes do MST.

O incidente nos sugere duas reflexões. Primeiro, parece inacreditável que um chefe de Estado e governo se disponha a prestigiar, com sua presença, uma entidade que se recusa a entrar na legalidade, para não assumir responsabilidades diretas - civis, tributárias, ou de qualquer ordem - ou a obrigação de prestar contas, nos Tribunais de Contas e outras instâncias, das verbas públicas que recebe por meio de entidades intermediárias ¿laranjas¿, estas devidamente registradas. Segundo, pode parecer até uma despropositada arrogância os líderes do MST dispensarem a visita de um presidente da República - mesmo que se disponham a trocar tal visita por uma ida em comissão ao Planalto. Seria o caso de indagar o que provoca esse tipo de mágoa dos emessetistas com o ¿companheiro¿, ao qual jamais deixaram de dar apoio político-eleitoral. Seria o fato de o presidente da República não ter aceitado a exigência, do MST, de que modifique inteiramente a política econômica do governo? Ou seria uma objeção à sua política ambientalista - já que as questões atinentes à reforma agrária, propriamente dita, parecem, nesta altura, ser as que menos interessam ao MST?