Título: Brasil só perde para Índia em faculdades de Medicina
Autor: Sant¿Anna, Emilio
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/06/2007, Vida&, p. A15

A quantidade de faculdades de Medicina no Brasil só é menor do que na Índia. Até 2002, elas eram 115. Hoje chegam a 167. Os dados são de levantamento apresentado pela Associação Médica Brasileira (AMB), durante o 11º Encontro Nacional das Entidades Médicas (Enem), em Brasília.

A vice-liderança no ranking dos países com mais escolas médicas - à frente da China e Estados Unidos, por exemplo - não é motivo de comemorações. Especialistas apontam a fraca estrutura de ensino da maioria das faculdades de Medicina abertas no País como um perigo para a saúde pública. O Ministério da Educação (MEC), responsável pelas autorizações de cursos, é inclusive acusado de permissividade.

Durante a década de 1970, 62 faculdades de Medicina funcionavam no Brasil. De 1971 a 1976 e de 1979 a 1987, nenhum novo curso recebeu autorização de funcionamento. A partir dos anos 90, essa situação mudou.

Apenas nessa década foram criadas 17 faculdades, número igual ao acumulado nas décadas de 1970 e 1980. Para José Luiz Gomes do Amaral, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), essa é uma situação insustentável. ¿O problema não é apenas o número de faculdades. É que a maior parte delas não tem condições de funcionar¿, diz.

NEGÓCIO LUCRATIVO

Algumas normas para autorização dos cursos de Medicina mudaram com a Portaria nº 147, do MEC, publicada em fevereiro deste ano. De acordo com o novo texto, as escolas que receberam parecer negativo do Conselho Nacional de Saúde (CNS) terão de apresentar nova documentação para comprovar a existência de hospital-escola, próprio ou conveniado, por período mínimo de dez anos.

Além desse requisito básico, a faculdade deve contar com um corpo docente comprovadamente qualificado e o curso deve estar integrado com a gestão local e regional do Sistema Único de Saúde (SUS). ¿Surpreendentemente, o MEC baixou essa norma; antes muitas escolas de Medicina eram abertas com professores itinerantes, que davam aula em duas ou três faculdades em cidades diferentes¿, diz Amaral. ¿É impossível ensinar Medicina sem hospital.¿

Para o presidente da AMB, a abertura de faculdades de Medicina, com mensalidades de até R$ 4 mil, se transformou em um negócio lucrativo. ¿Ao longo dos anos, temos visto, em sucessivas gestões do MEC, prevalecerem os interesses dos empresários da indústria da educação superior¿, afirma.

Amaral sugere que as entidades médicas sejam ouvidas pelo MEC durante o processo de abertura de faculdades no País. Outra sugestão é o monitoramento do fluxo de alunos em cada curso. ¿Algumas faculdades têm autorização para ter 80 alunos por ano e quando se verifica elas têm 160¿, alerta.

Além da AMB, o Encontro Nacional das Entidades Médicas reuniu representantes do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Federação Nacional dos Médicos (Fenam).

Geraldo Guedes, coordenador do evento e conselheiro do CFM, atribui o aumento de cursos nos últimos anos à falta de critérios claros que pudessem barrá-los. ¿Nesse período lutamos para ter essa definição, mas assistimos a um verdadeiro festival de novas faculdades¿, afirma.

De acordo com o levantamento apresentado pela AMB, os 167 cursos disponibilizam 17.836 vagas todos os anos, 58% em faculdades privadas. Isso significa que milhares de médicos recém-formados chegam ao mercado de trabalho todos os anos. ¿Esses profissionais (das novas faculdades) estão chegando ao mercado agora, o que torna o futuro ainda mais preocupante¿, diz Guedes. ¿Estamos vivendo uma situação caótica em que eles não terão acesso aos cursos de especialização depois de se formarem e isso tende a ser pior.¿

CONGELAMENTO

Antonio Celso Nunes Nassif, ex-presidente da AMB, critica a impossibilidade de veto do Conselho Nacional de Saúde aos novos cursos. ¿O conselho não pode vetar, só opinar¿, diz. ¿Mesmo que o conselho seja contrário à abertura de determinado curso, o MEC é que decide.¿

Nassif propõe que as novas autorizações sejam suspensas por cinco anos. Segundo ele, durante esse período o MEC deveria avaliar todos eles e fechar os que não têm condições de ensino. Ontem, ninguém do ministério foi localizado para comentar o assunto.

Dos 13,4 mil cursos avaliados até hoje pelo MEC no Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade), apenas três cursos de Medicina obtiveram nota máxima na avaliação e no índice que mede o conhecimento agregado ao aluno durante o curso (IDD), conforme revelou o Estado ontem. São duas federais e uma privada: Universidade Federal do Rio de Janeiro,Universidade Federal de Goiás e Faculdade de Medicina do Vale do Aço - Ipatinga (MG).

RANKING

Índia: 222 cursos Brasil: 167 China: 150 Estados Unidos: 125 México: 84 Japão: 80 Colômbia: 58 Rússia: 58 Coréia do Sul: 51 França: 47 Irã: 46 Alemanha: 37 Turquia: 36 Paquistão: 33 Indonésia: 32 Itália: 32 Reino Unido: 31