Título: Remédio fraco
Autor: Ming, Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/06/2007, Economia, p. B2
O pacotinho de socorro a certos segmentos da produção é um paliativo discricionário incapaz de compensar a fragilidade da indústria no enfrentamento da concorrência externa, cuja origem são os altos custos de produção.
Também não vai na direção da criação de demanda por mais dólares, de maneira a tentar reequilibrar o câmbio.
Até agora, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, preferia dizer que a valorização do real não era significativa, especialmente se comparada a uma cesta de moedas e tal. O que ele reconhece agora é que o setor produtivo enfrenta, sim, uma piora das condições de competitividade.
O pacote pode ser elogiado na medida em que não se propõe a resolver o problema com as mágicas recomendadas por tanta gente, como a derrubada dos juros a canetadas, a criação de um confisco sobre exportações ou o controle sobre o afluxo de capitais.
Mas produz distorções, algumas delas graves. Podemos começar pela sua discricionariedade. A valorização do real atinge toda a economia porque altera os preços relativos. Mas o governo elegeu apenas seis setores a serem compensados. Um deles, o de veículos, só está na lista porque buzina mais alto e conta com a cumplicidade da CUT. O setor vem sendo beneficiado com aumento substancial das vendas (24% nos primeiros cinco meses comparado com mesmo período do ano passado). Outros setores, também prejudicados pelo câmbio baixo demais, não foram contemplados. É o caso da siderurgia, segmentos de bens de capital e hotelaria.
Este pacote não vai ao coração do problema. O dólar barato apenas expôs a falta de competitividade previamente existente do setor produtivo, que tem de enfrentar a concorrência crescentemente braba de chineses, indianos, coreanos e sul-africanos. Esses não precisam morrer sob o peso de tantos impostos nem são asfixiados com tantos encargos na folha de pagamentos. A questão de fundo é fiscal e não cambial. Se houvesse redução da carga tributária e se, para isso, o governo derrubasse suas despesas, o efeito seria mais abrangente e mais eficaz. Por outro lado, o ministro Mantega reconheceu que ainda não sabe como desonerar a folha de pagamentos.
O que está sendo chamado de 'equalização dos custos financeiros pelo Tesouro Nacional' tem cor, consistência e cheiro de subsídio. Tem a mesma natureza do Programa de Financiamento às Exportações (Proex), que levou à condenação da Embraer na Organização Mundial do Comércio, a OMC. Em princípio, esse expediente só não trará novos problemas se a concorrência externa fechar os olhos, o que parece improvável. Questionado sobre isso, o ministro não conseguiu explicar por que não há esse risco.
Há mais de dois anos, o governo distribui remedinhos, para os mesmos setores da indústria, que não saram nunca.
Por aí dá para se ter uma idéia das limitações e da vulnerabilidade das decisões anunciadas. De mais a mais, como o saldo comercial (exportações menos importações) tende a crescer em direção aos US$ 50 bilhões por ano e o investimento estrangeiro direto deve disparar, nada parece impedir nova valorização do real para que o governo lance depois mais um cala-boca do gênero.