Título: Compadre de Lula foi alertado de ação, acha PF
Autor: Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2007, Nacional, p. A6

Dario Morelli Filho, o amigo e compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva preso na Operação Xeque-Mate, na semana passada, pode ter sido informado antecipadamente por alguém de Brasília sobre o monitoramento dos envolvidos na máfia dos caça-níqueis feito pela Polícia Federal. Os grampos citados no inquérito revelam que Morelli alertou o suposto chefe da quadrilha, o ex-deputado estadual paranaense Nilton Cézar Servo, para que ele tomasse cuidado com os telefones e acrescentou que havia ocorrido ¿um pepino feio¿.

Entre 11 e 17 de maio, pelo menos sete conversas gravadas indicam o suposto vazamento de informações. Mostram ainda um encontro marcado por Morelli entre Servo e o ex-deputado Sigmaringa Seixas (PT-DF), que foi vice-líder do governo. Segundo as conclusões preliminares da PF, Morelli era sócio de Servo em uma casa de caça-níqueis em Ilhabela, no litoral paulista, e corrompeu policiais para atuar ilicitamente.

Outras gravações de conversas - entre Morelli, Servo e sua mulher, Maria Dalva Martins - mostram outros personagens em busca de informações privilegiadas no governo, além de Genival Inácio da Silva, o Vavá, irmão do presidente Lula.

Os envolvidos mostram-se preocupados com as ações da Polícia Federal contra a máfia das caça-níqueis ao deflagrar a Operação Hurricane. No entanto, estão confiantes de que seus contatos com pessoas ligadas ao governo poderiam livrá-los de problemas. No 11 de maio, por exemplo, quando falam sobre os estragos da Hurricane, Morelli sugere a Servo que registre um telefone em seu nome, pois acredita que, ao verem de quem se tratava, os policiais pensariam ¿duas vezes em fazer qualquer coisa¿.

A partir do dia 16, a situação começa a mudar. Às 12h35, Morelli telefona para Servo e diz que precisa conversar sozinho com ele, porque ¿deu um pepino feio¿. O suposto chefe da máfia pergunta: ¿É comigo?¿. O compadre de Lula responde que não sabe, ¿precisa ver¿.

MULTIPLAY

Duas horas depois, Servo telefona para a mulher - também presa na Operação Xeque-Mate - e diz que marcou marcou um encontro em uma pizzaria, porque Morelli não queria ir à empresa Multiplay, fabricante de máquinas caça-níqueis. De acordo com Servo, ¿é por causa desse negócio de telefone, já teve comentário lá de cima¿. Para a PF, a declaração reforça a suspeita de que a conversa girava em torno do monitoramento.

Mais tarde, às 22h32, conversa entre Servo e a mulher reforça as suspeitas da PF. Nela, o empresário afirma que Morelli ¿é amigo até debaixo de água¿ e ¿não ficou nem preocupado que grampearam o telefone dele também¿. Servo afirma, em seguida: ¿Lá em cima, de Brasília, que grampearam.¿

Na mesma conversa, Servo concluiu informando à mulher que no dia seguinte iria a Brasília para falar com Sigmaringa. ¿Morelli vai (trecho ininteligível) fazer um escândalo¿, adianta.

O encontro de fato foi marcado por Morelli, no dia seguinte. Não há, porém, nenhuma referência específica sobre qual assunto seria tratado entre o ex-líder do governo e o chefe da máfia das caça-níqueis, às vésperas da operação ser deflagrada.

A conversa entre o ex-deputado e Morelli é inconclusiva. Às 17h07 do dia 17, Morelli ligou para Sigmaringa. O amigo do presidente Lula avisa que está em Brasília com um amigo - referência a Servo, conclui a Polícia Federal - para conversarem. O ex-deputado, chamado de ¿Sig¿, diz ter uma reunião no Palácio e sugere marcarem a conversa para mais tarde.

INFLUÊNCIA

Para a PF, Morelli e Servo tinham sociedade numa casa de caça-níqueis em Ilhabela, registrada em nome de um laranja. Várias conversas mostram que os dois corrompiam policiais para evitar apreensões e contavam com ¿as costas quentes¿ de Morelli não só no governo federal, graças à sua amizade com Lula e integrantes do PT.

Em uma conversa entre Morelli e a mulher de Servo, ele reclama de policiais que teriam apreendido máquinas. Dia 18 de maio, às 19h58, Morelli fala de novo com a mulher de Servo e comunica que fecharam a casa de jogos Deck Vídeo Bingo e o responsável era ¿o delegado seccional¿. Confiante, porém, ele garante: ¿Segunda-feira ele vai abrir aquela p...¿. O compadre de Lula conta que iria até a Secretaria de Segurança: ¿Eu tenho um diretor lá.¿

13/04

14h45 - SERVO e MORELLI

Servo diz que ¿deu um rolo no negócio do Rio de Janeiro¿e que foram presos o vice-presidente do Tribunal de Justiça, um procurador da República e três juízes.

Morelli pergunta se tudo isso foi no Rio de Janeiro.

Servo conta que será necessário um avião da Força Aérea para levar todos para Brasília.

Morelli pergunta se é por causa de jogo.

Servo afirma que é por causa de lavagem de dinheiro, jogo, compra de liminares.

Servo alega que isso pode ¿dar uma embaralhada¿.

Morelli responde: ¿Com certeza.¿

Servo diz que foram 24 pessoas.

Morelli comenta que não viu.

Servo explica que foi um escândalo e, por causa disso, vai ficar fora do ar por um tempo.

Comentário:

Para a PF, eles conversam sobre a Operação Hurricane, que prendeu diversas autoridades e integrantes da ¿máfia dos caça-níqueis¿.

16/05

12h35 - SERVO e MORELLI

Morelli diz a Servo que precisa conversar sozinho com ele, porque 'deu um pepino feio'.

Servo pergunta: ¿É comigo?¿

Morelli responde que isso eles precisam ver.

Comentário:

Os dois estão em São Paulo para falar com Raimondo Romano, dono da Multiplay Comércio e Empreendimentos Ltda., fornecedora de máquinas caça-níqueis.

14h42 - MARIA DALVA e SERVO

Maria Dalva pergunta se Servo já conversou com a pessoa (refere-se a Raimondo Romano).

Servo diz que não, explica que marcou o encontro em uma pizzaria, às 19 horas, porque o amigo deles (Morelli) não quer ir lá na empresa (Multiplay).

Servo explica que é por causa desse negócio de telefone e diz que ¿já teve comentário lá de cima¿.

Comentário:

Servo informa a Maria Dalva que ficou marcado um encontro numa pizzaria, porque Morelli suspeitava de monitoramento da Multiplay.

16/05 e 17/05

22h32 - SERVO e MARIA DALVA

Maria Dalva pergunta o resultado da conversa de Servo com Raimondo Romano (dono da empresa Multiplay).

Servo responde que Romano prometeu fechar o negócio deles (refere-se a João Catan, Andrei Cunha e Reginaldo) até segunda-feira.

Servo comenta que Morelli é firme, é amigo até debaixo d¿água. Acrescenta que Morelli ¿não ficou nem preocupado que grampearam o telefone dele também¿.

Servo informa: ¿Lá em cima, de Brasília, que grampearam.¿ Na seqüência, reitera que Morelli não deixa os companheiros e eles iriam no dia seguinte para Brasília, falar com o ex-deputado Sigmaringa Seixas (PT-DF). Segundo ele, Morelli faria um escândalo.

Comentário:

Novamente, Servo comenta com a interlocutora que sabia do monitoramento feito pela Polícia Federal em telefones de integrantes da quadrilha dos caça-níqueis. No dia seguinte, outra escuta indica que Morelli e Servo realmente seguiram para Brasília. Na conversa, entre Morelli e Sigmaringa, o compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva agenda uma reunião com o ex-parlamentar.