Título: 'Onda Sarkozy' deve varrer oposição
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2007, Internacional, p. A20

Um mês e quatro dias depois de sua eleição como presidente da França, Nicolas Sarkozy agora é nome de fenômeno político na Europa. A 'vague Sarkozy' - onda Sarkozy, em português -, com dimensões de tsunami, deve varrer o país hoje, no primeiro turno das eleições legislativas que renovarão as 577 cadeiras da Assembléia Nacional.

A perspectiva, apontam cientistas políticos e institutos de pesquisas, é de vitória arrasadora da direita e forte tendência ao bipartidarismo. Enquanto os conservadores comemoram, os socialistas, divididos, tentam apenas não encolher.

A votação legislativa envolve os 44,5 milhões de franceses em situação eleitoral regular. Eles escolherão entre 7,6 mil candidatos, divididos em 577 distritos, cada qual representado por um membro no Parlamento, em Paris. Amparados pela popularidade do presidente recém-eleito, os candidatos da União por um Movimento Popular (UMP) devem receber a preferência de 42% dos eleitores - 12% a mais do que a votação obtida no primeiro turno da eleição presidencial, em 21 de abril, pelo então candidato Sarkozy.

Segundo pesquisas realizadas pelos institutos BVA, Ifop e Ipsos, a expectativa é a de que os conservadores obtenham entre 366 e 419 cadeiras no Legislativo. Na atual legislatura, eles têm 359 parlamentares.

Se o dado mínimo se confirmar, a UMP quebrará seu próprio recorde, superando os 63,3% das vagas da assembléia conquistadas em 2002. Por sua força, o fenômeno recebeu dos analistas políticos a denominação de 'onda Sarkozy'.

'Existe um magnetismo forte da população pelo novo presidente. Identificação mais forte do que estamos verificando entre o francês e seu presidente só ocorreu com François Mitterrand, em 1981', disse ao Estado Jérôme Saint-Marie, diretor do instituto de pesquisas BVA. 'Sarkozy superou a desconfiança dos eleitores que consideravam a UMP um partido de direita dura.'

O fenômeno tem explicação na estratégia adotada por Sarkozy logo depois de eleito. Vitorioso com um discurso próximo da extrema direita, nacionalista e contrário à imigração, Sarkozy assumiu formando um gabinete aberto às personalidades de esquerda, como o ministro das Relações Exteriores, Bernard Kouchner.

Fundador da ONG Médicos sem Fronteira, ex-ministro da Saúde e personalidade histórica do Partido Socialista, Kouchner apoiara a deputada Ségolène Royal, derrotada no segundo turno da eleição presidencial.

SOCIALISTAS NA DEFENSIVA

Enquanto nas últimas cinco semanas Sarkozy acenou com a abertura, o Partido Socialista naufragou no vácuo de liderança. Comprometida com seu discurso de campanha, no qual se posicionara contra o acúmulo de cargos públicos, Ségolène, presidente do Conselho Regional de Poitou-Charentes, decidiu não concorrer nas legislativas.

Seu marido, François Hollande, primeiro-secretário do PS, é criticado a ponto de cogitar abandonar o cargo mais de um ano antes do previsto, em novembro de 2008. As divergências internas são tão graves que saltam aos olhos da opinião pública. Há 10 dias, Hollande não hesitou ao ser exortado por jornalistas a explicar a ausências do ex-ministro da Economia Dominique Strauss-Kahn e do ex-primeiro-ministro Laurent Fabius nas reuniões do PS: 'Eles não vieram porque não foram convidados', declarou ao jornal Le Monde.

O impacto da disputa pelo poder será conhecido na noite de domingo. Dono de 149 cadeiras da Assembléia, o PS pode tanto encolher para 120 lugares, quanto crescer para 173. Mesmo que seu desempenho seja positivo - hipótese mais remota -, isso não ameaçará a hegemonia da UMP. 'A força do PS deverá ser semelhante à atual, talvez um pouco menor', adianta Saint-Marie.

Especialista em eleições parlamentares, Olivier Rozenberg, doutor em Ciências Políticas do Centro de Pesquisas Políticas (Cevipof) de Paris, definiu o novo cenário político francês ao Estado: 'Estamos diante de um futuro Parlamento com tendência ao bipartidarismo.'