Título: Carro popular perde a preferência
Autor: Silva, Cleide
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2007, Economia, p. B9

O carro popular perde espaço na garagem do brasileiro. Com crédito barato e prazos longos de financiamento, o consumidor está migrando para modelos mais sofisticados, diluindo o pagamento em maior número de parcelas. Entre 2000 e 2003, versões mais baratas, com motor 1.0, representavam cerca de 60% das vendas de automóveis no País. Hoje, a fatia caiu para 46%. Já os carros compactos com motores mais potentes e sedãs pequenos ampliaram a participação de 7% para 26%.

'O consumidor está melhorando o carro porque há maior capacidade de financiamento', confirma o presidente da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), Sérgio Reze. Além disso, diz ele, há um fator psicológico de maior segurança na economia do País que induz às compras de longo prazo. O mercado oferece financiamentos em até seis anos.

Até o ano passado, 66% das vendas do modelo Classic da General Motors eram de versões básicas, que custam cerca de R$ 26 mil. O mais equipado, com ar-condicionado, direção hidráulica e trio elétrico - R$ 7,5 mil mais caro -, ficava com 34% da fatia. Hoje, a posição se inverteu, com 40% da preferência para o básico e 60% para o mais sofisticado, informa a GM.

A Fiat constatou uma alta significativa na venda de modelos Palio com kits de ar-condicionado e direção hidráulica, que encarecem o carro em média em R$ 2,5 mil.

A vendedora Andréia Pereira de Paula, da concessionária GM Viamar, conta que na semana passada vendeu um Corsa com ar-condicionado, trio elétrico e CD Player em 36 parcelas de R$ 675, fora a entrada. Sem os equipamentos, o carro era oferecido em 24 vezes de R$ 654. 'A cliente procurava seu primeiro carro e preferiu esticar o prazo em um ano, pagar um pouco mais e sair com um carro completo.'

No ramo há 11 anos, Andréia também contabiliza benefícios próprios. Como ganha comissão por modelo vendido, quanto mais alto o valor, melhor é o seu rendimento.

Os chamados carros populares ainda são os mais vendidos no País, mas já não acompanham o crescimento do mercado. De janeiro a maio, as vendas totais de veículos aumentaram 24%. Os negócios com populares cresceram 22%, para 390 mil unidades, contabiliza o departamento técnico da Citroen do Brasil, que acompanha mensalmente o desempenho de cada segmento da indústria.

Modelos pequenos, mas não populares, como Siena, Corsa, Prisma e Polo, com preços entre R$ 30 mil e R$ 40 mil, dobraram as vendas e somam 60,8 mil unidades. Sedãs médios como Corolla, Civic e Vectra, na faixa de R$ 60 mil, venderam 63,6 mil unidades, 33,8% a mais na comparação com os primeiros cinco meses de 2006. Mesmo os utilitários esportivos, vendidos acima de R$ 100 mil, tiveram aumento de 67% nos negócios, para 19,3 mil unidades.

EFEITO CASCATA

Para o presidente da Citroen, Sérgio Habib, há um efeito cascata. 'Quem comprava carro usado está comprando um popular e quem comprava o popular compra agora um modelo na faixa de R$ 40 mil. E quem comprava o carro de R$ 40 mil hoje compra um de R$ 60 mil.'

O efeito não é exclusivo do mercado de veículos. Ocorre também no setor de imóveis, eletroeletrônicos e higiene pessoal, diz o consultor Marcelo Cioffi, da PricewaterhouseCoopers. No caso dos automóveis, ainda há uma demanda reprimida muito grande no País.

No segmento de motocicletas, também é verificada uma migração. Modelos de 150 cc ocuparam boa parte da faixa das motos de 125 cc e são os mais vendidos hoje. 'Há uma perspectiva de substituição, principalmente por conta dos prazos de pagamento mais longos e dos juros menores', diz Marcos Fermanian, diretor de Vendas da Honda.

As montadoras projetam para o ano um mercado de 2,2 milhões de veículos, o melhor resultado da história e 14,5% maior que o de 2006. O recorde atual é de 1997, com vendas de 1,9 milhão de veículos. Naquele ano, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), 64% dos carros vendidos no País eram populares.