Título: 'Sou apenas um advogado de porta de cadeia', afirma Chokr
Autor: Tavares, Bruno e Godoy, Marcelo
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/06/2007, Metrópole, p. C1

O advogado Jamil Chokr deixou a Corregedoria da Polícia Civil sorrindo. O pivô do escândalo que pôs sob suspeita de recebimento de propina 84 dos 93 distritos policiais de São Paulo depôs ontem pela terceira vez sobre o caso e disse que é ¿apenas um advogado de porta de cadeia¿. Mas estava acompanhado por um dos melhores criminalistas do País, o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, contratado para defendê-lo.

Durante as duas horas e meia de depoimento, Chokr negou pagar propinas a policiais e afirmou que os bilhetes com pedidos em envelopes endereçados a DPs eram brincadeira do contador de seu cliente, a empresa de caça-níqueis Reel Token. Um dos bilhetes dizia: ¿Parem de bater, que a gente sobe.¿ Estava no envelope endereçado à 6ª Delegacia Seccional, responsável pelos DPs da região de Santo Amaro.

O advogado tinha explicação até para a presença de tantos nomes de chefes de investigadores em sua agenda. Eram contatos profissionais. Para José Carlos Dias, seu cliente foi ¿muito convincente¿. ¿Não há contra ele indícios que justifiquem a instauração de ação penal.¿

Chokr chegou à corregedoria às 14 horas, no carro do advogado. Vestia boné e óculos escuros. No depoimento, permaneceu em uma cadeira de rodas com o pé direito erguido - seqüela do acidente de carro sofrido no dia 25, quando bateu seu Vectra ao fugir de um suposta tentativa de assalto. Foi justamente sobre documentos achados naquele dia pelos policiais militares que o socorreram que se concentraram as perguntas dos corregedores.

Chokr faliu sobre sua carreira no ramo dos caça-níqueis. Disse que se tornou sócio-fundador da Reel Token em 1997, atendendo a um pedido do verdadeiro proprietário, que precisava de alguém que figurasse como dono, enquanto não resolvia problemas com a Receita Federal. ¿A proposta era interessante porque eu ganhava R$ 600 e passei a ganhar R$ 2 mil.¿

Em seguida, o advogado foi questionado sobre os 31 envelopes com dinheiro achados em seu carro. Em cada um deles havia uma quantia e, no espaço reservado ao destinatário, números de DPs. Chokr fez questão de contar que o dinheiro estava em sete envelopes, sugerindo que os quatro PMs que acharam o material podiam ter distribuído o dinheiro pelos demais envelopes. Mas, em depoimento à promotoria, os PMs confirmaram que o dinheiro estava em todos os envelopes.

Chokr teve ainda de dar explicações sobre a contabilidade achada no carro. Nela aparecem mapas que relacionam os DPs ao número de máquinas existentes na área de cada um e a valores que chegavam a R$ 4,4 mil por semana. A suspeita da promotoria é de que esse material seja um mapa da propina.

Chokr negou. Contou que recebia R$ 10 mil de honorários fixos por mês e uma quantia variável ¿por tarefa¿. Ele afirmou que queria que esse valor chegasse a R$ 80 por máquina e, por isso, fez simulações de pagamento com base no número de caça-níqueis existentes na área de cada DP. Por fim, Chokr disse que não é o autor da tabela na qual aparecem pagamentos a departamentos da Polícia Civil. ¿O depoimento deve ser analisado com outros elementos de prova¿, ressaltou o promotor Luiz Antônio Nusdeo.

HISTÓRICO

25/5 - No carro do advogado de donos de caça-níqueis Jamil Chokr, PMs encontram envelopes com dinheiro e marcação de DPs. Chokr fugia de um assalto em seu Vectra. A Corregedoria da Polícia Civil abre investigação sobre o caso 28/5 - Os números nos envelopes com dinheiro coincidem com os de 29 delegacias de São Paulo 29/5 - Vazamento da suposta relação de propinas pagas a distritos policiais faz as cúpulas das Polícias Civil e Militar trocarem acusações 1/6 - Um dia depois de ser citado em uma lista de supostos beneficiados com propina, o Departamento de Polícia Judiciária (Decap) faz operação que apreende 2.204 máquinas caça-níqueis e fecha sete bingos em São Paulo 13/6 - Grampos da Polícia Federal confirmam que Chokr subornava a polícia de São Paulo. Empresário flagrado na Operação Xeque-Mate diz em gravação que ¿terá de achar desculpa plausível¿ para lista encontrada com advogado 14/6 - Anotações mostram que Chokr arrecadou em abril R$ 205 mil com donos de máquinas de caça-níquel. Na contabilidade do advogado, parte do dinheiro aparece destinado à Polícia Federal, ao Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic) e ao Departamento de Polícia Judiciária da Capital (Decap)

16/06 - Após a publicação pelo Estado de que 84 dos 93 distritos policiais de São Paulo estavam na contabilidade de Chokr, o governo decidiu afastar 20 investigadores-chefes citados nos documentos apreendidos com o advogado. Outros sete policiais civis foram identificados pela corregedoria - um deles aposentado.