Título: Proposta de corte de tarifas ameaça indústria do País
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/06/2007, Economia, p. B3
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, entra hoje na sala de reuniões dos quatro protagonistas da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Potsdam, na Alemanha, com a 'carta 25' escondida no punho.
Meio termo entre a pressão da União Européia e dos Estados Unidos pela abertura industrial brasileira e a gritaria do empresariado nacional contra a valorização cambial e a carga tributária, a carta será baixada somente se as ofertas de acesso ao mercado agrícola europeu e de corte dos subsídios internos americanos forem consideradas satisfatórias.
Para a indústria nacional, a carta será um vendaval. Trata-se do Coeficiente 25 da Fórmula Suíça, usada para balizar os cortes das tarifas de importação na negociação na OMC.
Sua aplicação forçaria o Brasil a reduzir de 35% para 14,58% a tarifa máxima que pode aplicar sobre itens do setor industrial - um tombo de 58% no atual teto de proteção da indústria. A tarifa média consolidada pelo País na OMC poderia subir de 10,77% para 13,34%. Mas, na prática, 3.437 itens, que correspondem a 39,05% do universo do setor, sofrerão cortes nas suas tarifas de importação.
Além do Brasil, União Européia e Estados Unidos, o grupo dos protagonistas inclui a Índia. Prudente, Amorim entrará na sala de reuniões acenando com uma proposta antecipadamente vista como insuficiente por europeus e americanos: o Coeficiente 30, que atingiria mil itens menos que a carta 25. Significaria redução da tarifa máxima de 35% para 16,15% (queda de 54%) e reduziria o grau de proteção de 2.474 itens.
Seja o Coeficiente 30 ou o 25, a abertura industrial brasileira ficará distante das exigências dos Estados Unidos e da União Européia, que pressionaram para o Brasil baixar outra carta, a 15. Essa fórmula derrubaria a tarifa máxima de 35% para apenas 10,50% e atingiria 5.480 itens industriais. Em uma palavra, para Amorim, traria a desindustrialização do País.
'Se o Brasil fechar com o Coeficiente 25, a indústria vai cortar a carne. Mas, ainda assim, vai sair no lucro, porque há muita pressão por uma abertura ainda maior do setor industrial brasileiro', explicou Soraya Rosar, coordenadora da Unidade de Negociações Internacionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Recentemente, Amorim explicou que há pouca chance de o Brasil e seus sócios do G-20 (grupo de economias em desenvolvimento que negocia em conjunto na área agrícola) obterem os resultados que ambicionam na Rodada. Ou seja, que os Estados Unidos concordem com a redução dos subsídios a seus agricultores para US$ 12,4 bilhões por ano e que a União Européia aceite um corte de 75% na sua tarifa agrícola. Acredita-se que, no máximo, os Estados Unidos cortarão as subvenções para US$ 15 bilhões e que os europeus bateriam no martelo em um corte de 54% nas tarifas agrícolas.
ARGENTINA
O Coeficiente 25, ou mesmo o de número 30, provocará uma reação da Argentina, que se mobiliza por uma abertura mais modesta de seu mercado industrial. E também será preciso adequar os compromissos que forem assumidos à Tarifa Externa Comum (TEC), aplicada pelos quatro sócios originais do bloco às importações de fora do Mercosul.
Negociadores brasileiros deixaram claro que o Brasil não apresentará uma posição comum com a Argentina nem com o Nama 11 (grupo de países que se articulam nas negociações sobre a abertura das áreas industrial e de serviços). 'No momento que tivermos o número (do coeficiente), vamos avisar a Argentina e o restante do Mercosul. Não podemos ir para as negociações de mãos amarradas', afirmou um negociador brasileiro.
Segundo Soraya, um acerto interno no Mercosul seria possibilitado pela decisão já tomada na OMC de manter uma margem de flexibilidade para 10% do universo tarifário do setor industrial. Para esse conjunto de itens - 880, no Brasil - será permitida a aplicação de tarifas mais altas que o teto que vier a ser registrado pelo País na OMC. O dilema maior para os sócios do Mercosul, segundo Soraya, será chegar a um acordo sobre uma lista única de exceção ou implodir a TEC.