Título: As condenações do TCU
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Fonte: O Estado de São Paulo, 20/06/2007, Notas e Informações, p. A3

O último balanço dos julgamentos do Tribunal de Contas da União (TCU) revela que a incidência de mau uso de recursos públicos continua muito alta, envolvendo todas as instâncias governamentais que recebem recursos do governo federal. Somente entre janeiro e março deste ano foram enviados 182 processos à Procuradoria-Geral da República para ajuizamento das ações cíveis e penais cabíveis.

Ao todo, foram condenados a sanções pecuniárias 367 gestores públicos - de prefeitos a funcionários de segundo escalão do governo federal e dirigentes de autarquias e fundações na área social. Eles terão de pagar um total de R$ 89,3 milhões em multas e devolução de recursos que desviaram ou utilizaram de maneira irregular. Além disso, foram punidos com sanções administrativas 38 agentes públicos, dos quais 31 foram considerados inabilitados para o exercício de cargos em comissão ou funções de confiança.

Segundo o balanço do TCU, 28% das condenações no primeiro trimestre de 2007 foram provocadas por prejuízos aos cofres públicos decorrentes de graves falhas de administração e de tomada de decisões antieconômicas, 28% foram causadas por desrespeito à legislação administrativa e 25% foram determinadas por fraudes em licitações, pagamento de propinas, desfalques e desvio de equipamentos e bens públicos. As condenações restantes referem-se a casos de omissão e apresentação de notas frias e recibos falsos em relatórios de prestação de contas.

O caso mais grave de mau uso de dinheiro público, julgado recentemente pelo TCU, refere-se a um convênio firmado em 2004 pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e pela Fundação Universidade de Brasília (FUB) para a prestação de assistência médica a uma tribo ianomâmi. O processo administrativo foi instruído por uma auditoria pedida pela Procuradoria-Geral da República. Segundo o TCU, o valor original do convênio era de R$ 10,9 milhões, mas, depois de receber 12 aditivos, passou a valer R$ 25,9 milhões. Além disso, não houve licitação pública para a contratação do órgão responsável pela assistência médica aos ianomâmis e parte dos recursos repassados pela Funasa à FUB acabou sendo utilizada para o pagamento de funcionários terceirizados. Entre as irregularidades detectadas pelos auditores do TCU estão autorizações de despesas sem correlação com as metas previstas pelo convênio, pagamento de pessoas sem especificação das funções que desempenharam e até despesas com serviços de taxi aéreo. Por fim, como o Estado mostrou em reportagem, os benefícios propiciados aos ianomâmis foram classificados como duvidosos, uma vez que o número de casos de malária aumentou significativamente durante a vigência do convênio.

A grande quantidade de punições aplicadas pelo TCU tem permitido ao Ministério Público Federal abrir ações cíveis e criminais contra os agentes públicos condenados no plano administrativo. Mas, valendo-se da morosidade do Poder Judiciário e do anacronismo da legislação processual, eles conseguem interpor recursos judiciais com objetivos protelatórios, o que lhes permite travar a tramitação dos processos até a prescrição das irregularidades e dos crimes de que são acusados. É por isso que as punições judiciais efetivas de ocupantes de cargos públicos envolvidos em corrupção têm sido raras.

Isto é uma amostra do que poderá acontecer com relação aos desdobramentos das recentes operações realizadas pela Polícia Federal. No caso da Operação Navalha, por exemplo, o TCU informa que já julgou 60 processos nos quais houve algum tipo de participação da Construtora Gautama, em matéria de superfaturamento e fraudes em licitações, e proferiu 93 decisões, responsabilizando administrativamente as pessoas envolvidas. Mas as ações judiciais que estão sendo abertas contra os acusados levarão anos para ser julgadas, isso se não prescreverem.

Infelizmente, o rigor demonstrado pelo TCU no plano administrativo não encontra correspondência no âmbito da Justiça, com a punição efetiva de agentes públicos corruptos.