Título: Efeito contrário
Autor: Ming, Celso
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/06/2007, Economia, p. B2

Quando compra dólares, o Banco Central atua para desvalorizar o real (aumento das cotações do dólar). Certo ou errado?

No mínimo, discutível. Para o caso, não basta aplicar cegamente a lei da oferta e da procura como o senso comum parece recomendar. Há razões para acreditar no oposto: ao comprar dólares e reforçar as reservas, o Banco Central ajuda na queda das cotações. Vale examinar algumas dessas razões:

(1) Criação de estabilidade - As reservas externas saltaram de US$ 52 bilhões no fim de 2004 para cerca de US$ 145 bilhões agora. Esse reforço aumentou a margem de atuação do Banco Central no câmbio. Se sobrevier um choque externo, que poderia gerar maior procura de moeda estrangeira, o Banco Central estará em condições de vender dólares para evitar a volatilidade. Isso torna a economia mais previsível e mais favorável a investimentos externos. Ou seja, mais dólares tendem a entrar no País.

(2) Queda do risco - Em dezembro de 2004, o prêmio de risco Brasil era de 377 pontos. Hoje, é de 140 pontos. A compra de dólares melhorou a percepção sobre a capacidade do Brasil de honrar seus compromissos. Além de reduzir os juros da dívida, isso atrai investimentos e mais dólares.

(3) Antecipação do grau de investimento - Quando as reservas externas ultrapassam a dívida externa, como está para acontecer, o país se torna credor externo líquido. Como já foi mencionado em outros dias nesta coluna, esta qualidade tende a antecipar a obtenção do grau de investimento, o que tende a atrair ainda mais dólares.

(4) Derrubada dos juros - A Ata da última reunião do Copom deixou claro que a queda das cotações do dólar foi determinante para que o corte dos juros fosse maior. Juros mais baixos puxam pelo crescimento econômico, pelos investimentos e, portanto, pela maior entrada de dólares.

O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, queixou-se segunda-feira de que a valorização do real afugenta investimentos. Por outro ângulo, pode-se dizer o contrário. Os investimentos estão crescendo. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, prevê para este ano a entrada bruta de Investimentos Estrangeiros Diretos de US$ 40 bilhões.

O ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central e economista-chefe do Banco Real ABN Amro para a América Latina, Alexandre Schwartsman, explica que a chave para entender por que as compras de dólares estão produzindo efeito contrário ao previsto é a esterilização da moeda emitida quando da compra dos dólares. 'Não houvesse essa esterilização (retirada de moeda do mercado), como na Argentina, o resultado seria mais inflação, mais instabilidade...'

Os que defendem a necessidade de desvalorização do real e para isso pregam a compra agressiva de dólares pelo Banco Central devem se perguntar se o tiro não está saindo pela culatra.

E, se estiver, será preciso criar demanda de dólares por outros meios. Um é estimular a compra de empresas ou investimentos no exterior. Dois exemplos: a Vale do Rio Doce pagou US$ 18 bilhões pela Inco e a Friboi, US$ 1,4 bilhão pela Swift.